O novo papel do sul da Bahia
2005-10-25
As plantações são milimetricamente dispostas. As árvores parecem todas iguais – e são mesmo, pois foram extraídas de uma mesma matriz. De sete em sete anos, às vezes menos, vai tudo abaixo e os eucaliptos se transformam num amontoado de toras, que mais tarde são carregadas pelos treminhões – como são chamadas as carretas com duas caçambas – para as fábricas de papel e celulose.
A vida no sul da Bahia é assim desde que a Suzano, uma das principais empresas do setor de papel e celulose do País, inaugurou, em 1992, uma linha de produção em Mucuri, cidadezinha na divisa com o Espírito Santo. Agora, a produção da antiga Bahia Sul vai crescer. Ao custo de US$ 1,3 bilhão, a companhia controlada pela família Feffer, de São Paulo, vai montar uma outra fábrica contígua à existente. A nova planta terá capacidade de produzir 1 milhão de toneladas por ano de celulose – matéria-prima fundamental para a fabricação do papel, extraída do eucalipto.
Cerca de 300 quilômetros ao norte, entre as cidades de Eunápolis e Belmonte, está a recém-inaugurada fábrica da Veracel, um investimento de US$ 1,2 bilhão dividido entre a Aracruz e a sueco-finlandesa Stora Enso. Na área compreendida entre uma fábrica e outra, a mudança não é apenas na paisagem – os pastos estão dando lugar às plantações de eucaliptos, que já ocupam cerca de 5% da região –, mas também na economia. As duas empresas, juntas, empregam mais de 7 mil pessoas nas operações de florestamento e nas fábricas. A região, que já foi uma potência da produção de cacau e já serviu de pasto para milhares de cabeças de gado, voltou a emitir sinais de vitalidade.
Quem garante é o garçom Romildo Souza, de 26 anos, escalado para servir na inauguração da Veracel, no fim de setembro – que contou com a presença do presidente Lula. Morador de Eunápolis, ele já havia trabalhado durante a construção da fábrica, no serviço de manutenção. —A cidade melhorou bastante-, diz Souza. —As casas que custavam R$ 3 mil hoje custam R$ 12 mil.
CRESCIMENTO ACELERADO
O clima generoso da Bahia é o responsável pela concentração da produção de papel e celulose na região. Trazido há 100 anos da Austrália, o eucalipto se adaptou tão bem às condições brasileiras que hoje o País bate recordes de produtividade. —As florestas do sul da Bahia são as mais eficientes do planeta-, diz Renato Guerón, presidente da Veracel. Enquanto em países europeus o corte do pinus – outra fonte de celulose – leva até 40 anos para acontecer, o clima da região deixa o eucalipto no ponto com menos de 7 anos.
Quem não gosta do avanço do eucalipto são os ambientalistas, que condenam a monocultura da árvore, tida como nociva para o solo da região. —Essa crítica é descabida. Os eucaliptos estão tomando lugar dos pastos, diz João Carlos Augusti, diretor de Recursos Naturais da Suzano.
Além disso, segundo o executivo, as empresas preservam o que restou da mata atlântica (cerca de 7% da região) e fazem o replantio de árvores nativas. —Não dá nem para imaginar que investimentos desse porte se baseariam numa matéria-prima que exaure o solo-, diz o diretor florestal da Veracel, Antônio Sergio Alipio. (Estadão, 23/10)