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2005-10-24
O centeio do inverno ainda está verde nos campos ondulados das cooperativas estatais da Bielorrúsia. As lavouras de verão - centeio, colza e outros cereais – chegaram a 1,4 mil toneladas. Melhor ainda, segundo um diretor de cooperativa, Vladimir I. Pryzhenkov, é que nenhuma delas deu resultado positivo para a radioatividade.

Das mil milhas quadradas de terras contaminadas, apenas 54 milhas quadradas retornaram ao uso ativo na agricultura, incluindo as de Viduitsy. Esta fazenda, de 4 mil acres, está localizada entre uma das mais contaminadas zonas da terra, a do legado envenenado pelo pior acidente nuclear da história da humanidade: a explosão do reator número 4 de Chernobyl, em 26 de abril de 1986.

Cerca de 25% da Bielorrússia, incluindo algumas das primeiras áreas cultiváveis, permanecem radioativas de alguma forma. A área de Pryzhenkov representa parte dos esforços do governo para transformar as áreas contaminadas em utilizáveis novamente.

A área, anteriormente conhecida como fazenda Karl Marx, coletiva, mas ainda de posse do Estado, reabriu há dois anos com colheitadeiras, tratores e outros equipamentos bancados pelo governo do presidente Aleksandr G. Lukashenko. Um ano antes, as áreas de acesso tinham pontos de checagem restritos nesta região, localizada a 150 milhas de Chernobyl. Tais pontos agora desapareceram. As famílias começam a retornar. Algumas, porém, nunca saíram do local. Mas todas precisam de trabalho.

Segundo Pryzhenkov, algumas cooperativas começaram a criar cavalos e gado para corte, mas não para atividade leiteira. O leite produzido na região seria considerado perigoso para o consumo humano. – Isto nos deixou desolados–, afirma ele, dirigindo um jeep nas estradas enlameadas. – Não havia nada que fazer aqui–, acrescentou.

Lukashenko, um ex-chefe de fazendas coletivas, disse, no ano passado, que era tempo de rever as regiões contaminadas, delinear uma visão para novos lares e cidades, novas indústrias, enfim, de rejuvenescer as propriedades. – A terra deveria trabalhar para o país–, assinalou.

Muitos pensaram ser ridícula a idéia, chegando mesmo a temê-la, mas um estudo científico lançado em setembro por sete agências das Nações Unidas e pelo Banco Mundial mais ou menos concordam com ela. Tais estudos concluíram que os efeitos de longa duração de Chernobyl sobre a saúde e o meio ambiente não mostraram ser tão horríveis quanto previstos. O estudo recomenda às autoridades da Rússia, da Ucrânia e da Bielorússia que tomem providências para reverter o trauma psicológico causado por Chernobyl, encorajando investimentos e o desenvolvimento.

As terras onde a agricultura foi banida ou severamente restringida podem ser seguras para o cultivo de sementes outra vez, afirma o relatório, desde que sejam utilizadas técnicas para a absorção de partículas radioativas na produção. – É desejável identificar formas sustentáveis de fazer uso das áreas mais afetadas que refletem os perigos da radiação, mas também rever o potencial econômico em benefício da comunidade–, diz o estudo.

Tais conclusões levantaram controvérsias. O grupo ecológico Greenpeace denunciou o relatório como sendo uma espécie de lavagem cerebral. Mesmo um membro do governo de Lukashenko, Valery L. Gurachevsky, o diretor científico do comitê de Chernobyl, considerou –muito otimistas– partes do relatório.

Mas neste lado do país, onde cidades inteiras foram deixadas numa rota invisível, os principais pontos do relatório são bem-vindos. Gennadi V. Kruzhayev, agora com 38 anos, recém havia começado a trabalhar na Karl Marx qundo o acidente ocorreu. Desde então, ele pula de trabalho em trabalho. –A principal coisa é ter trabalho–, afirma.

O desastre de Chernobyl espalhou material radioativo por toda a Europa, mas naturalmente as áreas mais próximas – Rússia, Ucrânia e Bielarrússia, então repúblicas soviéticas – sofreram o pior. Autoridades soviéticas declararam uma zona emergencial de exclusão em um raio de 19 milhas do reator, um círculo que incluiu zonas entre a Ucrânia e a Bielorrússia. A zona permanece fechada, exceto para os trabalhadores supervisionarem a descontaminação do reator.

A contaminação – particularmente de Césio 137 – bem como pelo mortal Estrôncio 90 e por plutônio, foi confinada àquele círculo. Ms áreas tão radioativas quanto as da zona de exclusão ainda aprecem no mapa da Bielossússia como faixas irregulares na parte leste do país. Tais áreas permanecem fora dos limites, pelo menos teoricamente. Ao redor delas, com menores níveis, foi criada uma espécie de colcha de retalhos de zonas permitidas e proibidas que, aparentemente, estão ignoradas. Mais de 130 mil moradores da Bielorrússia foram realocados nos anos seguintes a Chernobyl, mas na maior parte das áreas com menores níveis de contaminação, freqüentemente a poucas milhas de distância. Em torno de 1,3 milhão de pessoas – 14% da população – vivem em áreas contaminadas, embora oficiais do governo afirmem que, com certas precauções, podem enfrentar pequenos riscos de saúde.

Nessas áreas, o cultivo nunca parou totalmente, embora a economia tenha entrado em colapso. Ao invés disto, as propriedades do Estado adotaram medidas para minimizar a contaminação das lavouras, incluindo o uso de certos fertilizantes. Algumas lavouras absorvem menos radiação, não sendo utilizadas para alimentação.

Desde que Lukashenko tomou o poder, em 1994, o governo tenta expandir a agricultura na região, removendo restrições nas áreas menos contaminadas. Gennadi V. Antsipov, que supervisiona o comitê nacional de reclamações sobre Chernobyl, disse que o processo foi complicado. Das mil milhas quadradas de terras contaminadas, apenas 54 milhas quadradas retornaram ao uso ativo na agricultura, incluindo as de Viduitsy. Um levantamento periódico concluído no mês passado detectou que mais áreas poderiam ser reclamadas para plantio.

–Por que correr com esta questão?– indaga ele, da capital, Minsk. –É como enviar alguém à Lua apenas para provar que se pode colonizá-la–, acrescenta. O governo de Lukashenko, a despeito de seu isolamento diplomático, trabalhou com agências internacionais, incluindo o Fundo de Desenvolvimento das Nações Unidas, para aumentar o rendimento das lavouras e limitar a contaminação dos produtos altimentícios. –Estamos novamente tentando prover às pessoas uma forma de pescar, e não o peixe, como fazíamos antes–, metaforizou Valery Y. Shevchuk, secretário do comitê de Chernobyl.

Materiais radioativos, especialmente o Césio 137, com meia-vida de 30 anos, decaem com o tempo, mas a vida nas partes contaminadas da Bielorrússia não voltarão ao normal tão rapidamente. Em Viduitsy, Pryzhenkov apontou que os campos permanecem ainda muito quentes para a produção mesmo de alimentos para animais. O governo exige que toda produção seja checada. Sem certificado, os produtores rurais não podem vender o que cultivam. (Fonte: The New York Times, 23/10)

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