Amazonas enfrenta a pior seca em 40 anos
2005-10-24
Diante da igreja, contidos e em silêncio, moradores de Aracaí esperam um helicóptero. Trata-se de uma das comunidades que está silada na floresta amazônica por causa da seca que baixou em níveis severos os níveis de rios e lagos da região. A tremenda seca que deixou canoas e casas flutuantes enterradas no barro começou há cinco meses, mas recém essas comunidades começaram a ser atendidas por aeronaves do Exército brasileiro, que desceram nas ilhas para distribuir sacas de alimentos. Quase meio milhão de pessoas esperam os alimentos ansiosas.
Assim como em Acaraí, há centenas de comunidades do Estado do Amazonas sofrendo de fome. É culpa da pior seca de que se recordam os ribeirinhos. Pessoas de mais idade não se lembram de nada igual há 40 anos. Os grandes rios da região, o Solimões e o Negro, que formam a bacia do Amazonas na altura de Manaus, perderam largura e profundidade: hoje estão entre 10 e 12 metros abaixo de seu nível médio. Ao navegar no Solimões, que em boas épocas atinge 10 quilômetros entre suas margens, assiste-se a um espetáculo não usual: uma interminável vértebra de dunas corta o rio pela metade, coroada por árvores secas, povoadas por urubus.
A bacia amazônica normalmente está banhada por lagos muito ricos. Entre esses está o de Manaquiri, que costuma fornecer peixes a um município homônimo. Em seu lugar, agora há uma bacia transformada em uma lixeira de peixes podres. O prefeito, Jair Souto, afirma que –90% dos peixes já morreu–. –Isto afeta os 2 mil ribeirinhos da região, que vivem exclusivamente da pesca–, acrescenta. Fany Ervani, secretária de Turismo do município, conta: –Durante dias tivemos um odor nauseante, insuportável. Tivemos que fechar 40 escolas, cancelar o ano letivo, pois não há alimentos, não há transporte, nem água potável–, assinala.
Paulo Moutinho, cientista do Instituto de Investigações Amazônicas, adverte que esta é uma seca – atípica–, diferente da ocorrida em 1997. Nesse ano também houve seca, mas não castigou a extensão da atual, nem durou cinco meses. O aquecimento das águas do Atlântico é uma das explicações dos cientistas para a seca e explicaria também a formação de furacões no sul do Brasil, como o que, no ano passado, atingiu o Estado de Santa Catarina. (Clarín, 23/10)