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2005-10-20
Por Francis França
A tão exaltada bioenergia, que transformou o Brasil em referência mundial pela tecnologia em fontes renováveis, tem saldo energético negativo, afirmaram nesta quarta-feira (19/10) os pesquisadores Luiz Carlos Machado e Pedro Ivan Christofoli, palestrantes do 3º Congresso Nacional de Agroecologia. Para produzir biodiesel, disseram os pesquisadores, gasta-se mais energia do que se obtém no final da cadeia produtiva, o que tornaria inútil a iniciativa, embora considerada ecologicamente correta.

— Além de inútil, o programa de biocombustível é safado, porque o governo sabe disso tudo – disparou Luiz Carlos Machado, da Universidade Federal de Santa Catarina, engenheiro agrônomo, professor e pesquisador há 53 anos.

Durante a palestra Energia e manejo dos recursos naturais na unidade agroecológica de produção: a necessidade da integração do cultivo e criação agroecológica, os pesquisadores defenderam que o sistema convencional de produção agrícola está sujeito a um forte revés por causa do iminente colapso energético que pode assolar o planeta nos próximos anos, com a redução de reservas energéticas estratégicas, como o petróleo. Segundo eles, mais do que uma possibilidade ecologicamente correta, por ter saldo energético positivo, a agroecologia é a única alternativa viável e sustentável para a produção de alimentos.

— O agronegócio não é capaz de competir com a agroecologia porque nossos resultados são muito superiores – diz Machado.

De acordo com Pedro Ivan Christofoli, secretário-geral da Associação Nacional de Cooperação Agrícola (Anca), o sistema convencional de produção consome quatro vezes mais energia do que a agricultura ecológica, e as fontes alternativas de energia não seriam capazes de suprir a demanda. O biodiesel, segundo o pesquisador, tem balanço energético negativo, mas, mesmo assim, recebe investimentos por ter custo reduzido em relação ao petróleo, por exemplo. Christofoli acredita que, sem o subsídio do governo, a produção de biocombustíveis seria insustentável.

— Se houver uma crise energética, a bioenergia não será capaz de suprir a demanda da agricultura tradicional – afirma.

Em termos de produtividade, os pesquisadores afirmam que, comparando os dois modelos de cultivo, os valores são praticamente os mesmos.

— A capacidade de produção da agricultura tradicional é em média apenas 5% maior do que a agroecologia – disse Christofoli.

A diferença varia de acordo com o setor. No caso do leite, a produção tradicional é até 40% maior do que a agroecológica. Nas lavouras pesadamente mecanizadas, esse valor pode ser ainda maior, mas, segundo os pesquisadores, se comparada ao padrão normal da agricultura familiar, a produtividade orgânica sai na frente em quantidade e qualidade.

— No sistema convencional temos uma grande produtividade, mas sem qualidade nos alimentos, com contaminação do solo, agressão a ecossistemas e gasto enorme de energia – diz Christofoli.

O pesquisador Luiz Carlos Machado defende que a agroecologia saia do fundo dos quintais, das pequenas lavouras, para atender à demanda mundial. Para isso, ele indica a necessidade de produzir insumos em larga escala para a agroecologia.

— É mentira quando dizem que a agroecologia produz muito com pouco insumo. Isso contraria as leis da química. Precisamos de uma grande quantidade de insumos, com a diferença de que são naturais e não agressivos, ao contrário dos sintéticos utilizados na agricultura tradicional. Temos 6,5 bilhões de pessoas para alimentar, precisamos desenvolver técnicas que atendam a demanda - explica.

A necessidade de pesquisas sobre os sistemas complexos da agroecologia e de tecnologias que possibilitem a produção em larga escala, segundo os pesquisadores, deve ser prioridade para a ciência.

— O modelo dominante está chegando a um limite. Estão surgindo alternativas como os transgênicos e a nanotecnologia. Precisamos acelerar o processo agroecológico para combater essas iniciativas – diz Christofoli.

Mas, segundo o pesquisador, a agricultura ecológica ainda caminha em terreno marginal e deve demorar até ser encarada com seriedade e pensada em escala global.

— É preciso desenvolver muito em tecnologia, ainda – reconhece.

O período de transição necessário para implantar a agricultura orgânica também é um fator que atrasa o processo.

— O solo brasileiro está intoxicado e a desintoxicação pode levar de dois a cinco anos. Os tempos da natureza são os tempos da natureza – explica Machado, que acredita que não revolver o solo e apostar na energia solar da fotossíntese são suficientes para aumentar continuamente a produtividade nos sistemas agroecológicos.

Distribuição e custo
Pedro Ivan Christofoli afirma que a crença de que produtos orgânicos são até 30% mais caros do que os convencionais é um mito. Segundo ele, o problema está na distribuição destes alimentos.

— Precisamos melhorar o sistema de distribuição e comercialização dos alimentos orgânicos, além de incentivar a produção local. Muitas vezes você paga mais caro por um produto orgânico em um supermercado de Santa Catarina porque ele veio de São Paulo, mas o revendedor de São Paulo comprou a mercadoria em Urubici – explica.

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