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2005-10-19
Por Ruth Helena Bellinghini *
Os maias construíram uma das mais complexas civilizações pré-colombianas. São templos monumentais, avanços na matemática, objetos de arte incomparáveis e ruínas, que atestam em meio à floresta, um passado glorioso. Por volta do século VIII, a população cresceu e para alimentá-la o ritmo de derrubada da floresta se acelerou, para abrir espaço para o cultivo de milho. O solo exauriu-se rapidamente e, para complicar a situação, alguns ciclos de seca reduziram a produção de alimentos na região. Governantes e sacerdotes, porém, mantiveram seus estilos de vida, a construção de templos e palácios. O resultado foi o esgotamento dos recursos naturais e a extinção da civilização maia.

Além dos maias, os anasazis do Novo México, os vikings em suas colônias da Groenlândia, os moradores da Ilha de Páscoa e, mais recentemente, Haiti e Ruanda são os principais personagens de Colapso, como as sociedades escolhem o fracasso ou o sucesso. O mais novo livro do biogeógrafo americano Jared Diamond, autor de Armas, Germes e Aço e ganhador do Prêmio Pulitzer, constrói, brilhantemente, a tese de que o descuido com as questões ambientais foi a causa do colapso de algumas civilizações. Assim, traça um paralelo entre as crises que esses povos enfrentaram e a crise ambiental que o planeta enfrenta hoje.

Diamond é dono de uma prosa envolvente, de um texto fluente e saboroso, recheado de dados, fatos e notas pessoais. Esses são alguns dos ingredientes fundamentais que o autor utiliza para prender a atenção de quem se dispõe a viajar pelas mais de 600 páginas de seu novo trabalho. Ambientalista de carteirinha, cientista de fama, Diamond não poderá jamais ser acusado de ser um catastrofista pessimista; sua sensatez é cristalina e cativante. Além de narrar os desastres, Diamond arrola em seu livro as sociedades que souberam mudar de rumo e evitar a tragédia, caso dos shoguns da era Tokugawa, que implementaram um ambicioso e bem-sucedido processo de reflorestamento no Japão.

Sua receita para evitar o desastre é simples e se resume em duas palavras: vontade política. De acordo com ele, o planeta, hoje, convive com 12 graves problemas ambientais e o agravamento de qualquer um deles potencializa os demais. A lista é nossa velha conhecida: destruição de habitats naturais (florestas, pântanos, recifes de coral); redução das fontes de alimento selvagem (peixes, por exemplo, que respondem por 40% da proteína consumida no mundo); perda da biodiversidade, erosão e salinização dos solos; dependência dos combustíveis fósseis; esgotamento dos recursos hídricos; o fato de a maior parte da energia solar ser usada para propósitos humanos (plantações); o despejo de produtos químicos (agrotóxicos, hormônios, componentes de plásticos, rejeitos de mineradoras, poluição do ar); transferência de espécies exóticas para novos habitats; acúmulo dos gases do efeito estufa; o aumento da população e, claro, seu impacto sobre os recursos naturais.

O pesquisador não hesita em dizer que os Estados Unidos são hoje como a Roma antiga às vésperas do colapso: até capaz de perceber os sinais de alerta, mas incapaz de fazer os sacrifícios (como redução do padrão de vida) para reverter esse quadro. Alguns de seus pontos de vista irritam – e bastante – alguns grupos ambientalistas. Ele sustenta, por exemplo, que o movimento em defesa do ambiente precisa, urgentemente, aprender a trabalhar com as grandes indústrias e não contra. Casos de sucesso não faltam. Diamond descreve – sem poupar elogios – o campo de exploração de petróleo da Chevron na Papua-Nova Guiné, local onde se encontram até mesmo aves-do-paraíso.

O bom exemplo é resultado do bom senso da empresa – que sabe que é mais vantajoso investir centenas de milhões de dólares para evitar desastres ambientais do que gastar bilhões de dólares para tentar consertar as conseqüências de um desastre. Na lista das empresas responsáveis estão ainda a Home Depot, IKEA, a sofisticadíssima Tiffany`s – que só usa ouro extraído por processos ambientalmente corretos – DuPont, Unilever e as redes de supermercados Shaw’s, Sainsbury’s e Marks and Spencer. Essas histórias de sucesso se devem à união de forças do mercado com o trabalho de cientistas e ambientalistas.

A responsabilidade pela mudança de curso, segundo Diamond, não é das empresas, nem do governo, mas da sociedade como um todo. Seu alerta é para nossa incapacidade de pensar no longo prazo e, principalmente, de nossa curtíssima memória. Mesmo quem viveu a crise do petróleo de 1972 e acompanhou os debates acalorados sobre o esgotamento dos combustíveis fósseis parece hoje ter uma crise de amnésia e desfila pelas ruas com potentes SUVs, que queimam combustível, alucinadamente, aqui e nos EUA, como se nada tivesse acontecido e o petróleo fosse jorrar barato para sempre. É sua resposta para o aluno que lhe perguntou o que deve ter sentido o morador da Ilha de Páscoa que cortou a última árvore da ilha. Ele sequer se lembrava que um dia sua terra foi uma vasta floresta e nem percebeu que assinava a sentença de morte de seu povo.

Ruth Bellinghini é jornalista especializada em ciências e conselheira da Pró-Terra – Associação Brasileira de Tecnologia, Meio Ambiente e Agronegócios (www.proterra.org.br) .e-mail: r.helena@proterra.org.br

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