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2005-10-13
O mineiro Fernando Castanheira Neto é engenheiro florestal formado pela UnB, instituição onde obteve ainda os títulos de especialista em Gestão Ambiental e Ordenamento Territorial e mestre em Ciências Florestais.

Com apenas 36 anos de idade, ele já atuou como consultor das Nações Unidas (Programa PNUD) no Ministério do Meio Ambiente, de 1996 a 2000, e atualmente ocupa o cargo de superintendente executivo do Fórum Nacional das Atividades de Base Florestal, em Brasília.

Conselheiro suplente do Conselho Nacional do Meio Ambiente (CONAMA), representando o Setor Florestal, Castanheira representa ainda o setor de madeira sólida na Comissão Coordenadora do Programa Nacional de Florestas (CONAFLOR), do Ministério do Meio Ambiente e no Fórum de Competitividade da Cadeia Produtiva de Madeira e Móveis do Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior (MDIC).

Esse aparente acesso à cúpula federal não o desestimula, porém, a criticar o Governo pela falta de políticas de fomento à atividade florestal que se exerça com base na legalidade e em planos de manejo que garantam o respeito ao meio ambiente. Entrevista concedida à Mônica Pinto - AmbienteBrasil


Qual a situação do setor madeireiro hoje?
Fernando Castanheira Neto - Vou falar especificamente do segmento de madeira sólida, ligado às madeiras nativas, já que é nesse segmento que a Operação Curupira, e a ação (ou omissão) do Ministério do Meio Ambiente/Ibama vêm acarretando maiores efeitos negativos. A situação é gravíssima, tanto em termos sociais quanto econômicos. Segundo informações do Sindicato da Indústria de Madeira no Norte do Mato Grosso (Sindusmad/MT), um terço dos trabalhadores das empresas florestais naquele estado estão desempregados - são cerca de 20 mil pessoas. Essa situação não é muito diferente no estado do Pará. O crescimento estimado para o setor 2005, quando comparado a 2004, está entre 10% e 15%, muito abaixo do desempenho quando comparamos os 60% ocorridos entre 2003/2004.

Como reverter esse quadro?
Fernando - O que mais nos preocupa é que as soluções para estes problemas estão longe de ser encontradas. O Ibama não têm condição de cumprir com sua missão institucional. A estrutura atual do órgão - recursos financeiros, físicos e humanos -, principalmente nos Estados, não atende a demanda do setor, e por conseguinte da sociedade, bem como também não consegue coibir a corrupção crônica e histórica que atormenta o órgão.

De que forma isso afeta a indústria de base florestal?
Fernando - O Ibama não aprova os planos de manejo e, quando isso acontece, não emite as autorizações para transporte de produtos florestais, o que impossibilita a exploração florestal e a comercialização da safra, gerando falta de matéria-prima e comprometendo o abastecimento do parque. Aliados a estes pontos ainda existem fatores externos que estão castigando ainda mais este segmento, como a competição com produtos chineses e o câmbio desfavorável às exportações. Não existe uma determinação política por parte do governo em resolver a situação, apenas os problemas são levantados, mas as soluções apresentadas são paliativas e não atacam as causas e, sim, as conseqüências. A realidade é que não há uma boa vontade em construir caminhos para elas.
Isso é fácil de se perceber quando observamos o esforço do governo em discutir, buscar consenso, em temas de seu interesse como gestão de florestas públicas (PL em tramitação no Congresso Nacional), fórum sócio-ambiental de florestas plantadas e a criação de unidades de conservação na Mata Atlântica em áreas privadas, só para citar alguns exemplos. É essa determinação que não conseguimos observar quando um assunto tão importante quanto a produção florestal nos estados do norte do país está em pauta. Há muito discurso e pouca ação. Estamos no final do ano, próximo à estação das chuvas e ainda não conseguimos viabilizar a produção, por falta de autorizações de transporte florestal, o que certamente irá refletir no volume de madeira nos pátios das empresas e no aumento do desemprego na região.
Vale lembrar que o setor florestal está entre as três principais atividades geradoras de emprego e renda em todos os principais estados da região norte, tais como o próprio Mato Grosso, o Acre, o Pará e Rondônia. A Operação Curupira gerou que ganhos e que perdas para os que atuam dentro da legalidade?
Fernando - O ponto positivo é que a Operação Curupira ajudou a combater as ações ilegais que tanto fazem mal ao setor florestal, denegrindo sua imagem. Temos que entender que essa situação não acontece exclusivamente dentro do setor florestal. A nossa sociedade vive tempos difíceis, mas importantes, de ter suas piores mazelas expostas de maneira tão crua na tela da TV. Estamos vivenciando nos últimos meses o quanto o país necessita de Operações Curupiras em diversos setores, inclusive dentro do próprio governo. A operação quebrou um pouco a certeza da impunidade.

E o ponto negativo?
Fernando - O ponto negativo é que, em ações deste tipo, acaba-se por punir a todos. Na dúvida, todos passam a ser culpados até que provem o contrário. Vivenciamos essa situação no caso da proibição da extração do mogno, da araucária. E agora, com a Operação Curupira, os técnicos do Ibama, principalmente das suas gerências regionais, estão com medo de aprovar qualquer novo plano de manejo com receio de haver alguma irregularidade, mesmo que técnica, e serem indiciados e colocados ao julgamento público como foi feito pela Operação Curupira.

Qual o saldo para as empresas que atuam dentro da legalidade?
Fernando - Neste primeiro momento, aquelas empresas que operam na legalidade foram muito prejudicadas, pois foram colocadas no mesmo balaio que as demais. Contudo, ações como estas - que não devem parar agora e nem estarem restritas ao estado do Mato Grosso - tendem a coibir a prática de crimes. O importante é entender que essas ações não são suficientes para estabelecer um padrão de normalidade na atividade florestal. São necessárias diversas outras atitudes focadas no fomento e no incentivo às boas práticas produtivas. A política de comando e controle deve ser parte do plano de ação do governo e não ser, como estamos presenciando, o plano.

Quem desmata mais – a indústria madeireira, a atividade agrícola ou a pecuária?
Fernando - Creio que não devemos buscar vilões para o desmatamento. Isso não ajuda na busca de soluções de longo prazo. Ninguém desmata por maldade, a conversão geralmente está associada ao desenvolvimento de alguma atividade produtiva, seja ela pecuária ou agricultura, expansão urbana, assentamentos humanos, estradas, etc. Os estados da região norte possuem poucas opções para seu desenvolvimento, geralmente estão focadas, pela falta de estrutura básica (estradas, energia, mercado consumidor, instituições de pesquisa, etc.), na produção de bens primários. Daí atividades como a agropecuária, de mineração e madeireira serem os principais responsáveis pelo desenvolvimento regional.
Ao poder público não basta apenas monitorar ou até mesmo buscar coibir o desmatamento. Temos que dar alternativas para que essas regiões sejam efetivamente inseridas no mapa do desenvolvimento nacional, com possibilidades reais de que a população ali residente tenha também acesso aos direitos básicos para a obtenção de sua cidadania. Aí reside a real causa do desmatamento: na falta de alternativas ao atual modelo de desenvolvimento.
Mesmo assim, em favor da nossa indústria ressalto que a atividade madeireira trabalha com espécies comerciais que chegam a no máximo 10% do total de espécies existentes nas florestas tropicais, portanto não interessa especificamente ao setor florestal o corte raso, já que é anti-econômico, tendo em vista o custo do desmatamento frente ao número de árvores comerciais utilizáveis.

O senhor já disse que o Incra é o grande incentivador do desmatamento. Por que?
Fernando - Não especificamente o grande, mas certamente o Incra foi um dos grandes agentes de conversão de florestas tropicais. Como prova da minha afirmação basta sobrepor os assentamentos humanos realizados pelo órgão nas duas últimas décadas sobre a área do famoso arco do desmatamento. Não será surpresa se coincidir significativa parte dos grandes assentamentos com as áreas de desmatamento. Outro ponto importante é a falta de pessoal qualificado dentro do Incra para tratar sobre a questão florestal, o foco dos assentamentos ainda é sobre a atividade agropecuária. Nos últimos anos houve um esforço no sentido de não abrir novos assentamentos em áreas de florestas nativas e fomentar o chamado assentamento florestal.
Gostaria de deixar claro que não estou criticando o órgão especificamente. Acho que a política até então era de ocupar a Amazônia e para isso a floresta era tida como um empecilho aos assentamentos. Não cabe achar culpados. Vale a lembrança que são políticas governamentais que ordenam a ocupação do território, não é o empresário, um assentamento ou um setor produtivo que, sozinho, altera o meio ambiental. O que é importante notar é que o governo é um agente importante tanto para coibir quanto para fomentar o desmatamento na Amazônia. A sociedade não tem subsídios para analisar este lado da história, a despeito dos fatos assim o determinar. Foram políticas públicas que incentivaram a conversão de florestas nativas para a ocupação da Amazônia (integrar para não entregar): a política recente de expansão da base agrícola (política agrícola), política de assentamentos humanos, associado à carência ao acesso a infra-estrutura para implantação de outras opções de desenvolvimento como já disse anteriormente.

Como situar as atividades de base florestal dentro de uma perspectiva de desenvolvimento sustentável?
Fernando - A atividade florestal é a que mais tem condições de desenvolver os princípios propalados no conceito de desenvolvimento sustentável. Só o setor produtivo consegue aliar a sustentabilidade econômica, as vertentes sociais e ambientais, pois além de gerarmos lucro (objetivo principal da atividade econômica), produzimos renda (impostos) e empregos, aliado ao respeito ao meio ambiente, pois o manejo florestal já incorpora todos os principais conceitos da conservação ambiental, garantindo sua sustentabilidade ao longo do tempo. Agora é fundamental que o governo eleja o manejo florestal uma prioridade para valorizar a floresta em pé.
O manejo florestal trabalha com base na estrutura da floresta em pé, respeita condicionantes ambientais como a reserva legal e as áreas de preservação permanente e necessita de acompanhamento de profissional legalmente habilitado em todas as suas fases. Novamente, o que falta é vontade política de valorizar este instrumento.

A certificação pelo FSC (Forest Stewardship Council), que assegura o manejo correto das florestas, seria o caminho ideal?
Fernando - O sistema de produção florestal como é proposto pelo FSC e também pelo Cerflor, que é o sistema brasileiro de certificação florestal, certamente valoriza a produção florestal e fortalece o planejamento da atividade em todas suas esferas (social, econômica e ambiental), além de melhorar o acesso a mercados. Seria, sim, uma meta a ser atingida. Contudo, ainda estamos longe de poder alcançar como setor tal pretensão, pois os custos e requisitos envolvidos na certificação ainda são impeditivos para a grande maioria das empresas florestais, ressaltando que, segundo informação da Associação Brasileira da Indústria de Madeira Processada Mecanicamente (Abimci), mais de 99% das empresas florestais são pequenas e médias. Atualmente, não estamos conseguindo atingir nem o primeiro requisito das normas de certificação florestal, que seria cumprir a legislação, pois esta é de tal maneira dissociada da realizada setorial, variada, impeditiva e muda com tanta rapidez que inviabiliza seu pleno cumprimento.

A região Sul cumpre a lei que obriga a reserva legal de 20% da propriedade em espécies nativas?
Fernando - Não se trata se está cumprindo ou não. A questão da reserva legal deve ser discutida dentro de um novo patamar. Hoje temos informações e tecnologia suficiente para aperfeiçoarmos nosso Código Florestal Brasileiro, que data de 1965, que foi um marco, mas traz consigo uma série de aspectos que estão em desacordo com a realidade atual, garantindo que seus princípios de sustentabilidade sejam preservados. A questão da reserva legal é uma delas, não existe uma razão cientifica ou técnica para a determinação de seus limites, porque na Amazônia é 80% da propriedade privada e no resto do país é 20%? Excetua-se o cerrado inserido na região da Amazônia Legal, que é de 35%. Existe uma situação posta e que deve ser encarada pelo governo e pela sociedade. Há um grande passivo se compararmos com a legislação atual, mas também é fundamental que não polarizemos a discussão apenas no âmbito ambiental. Existe uma realidade sócio-econômica instalada nas diversas regiões do país que deve ser considerada e a legislação deve buscar compatibilizar o uso da propriedade privada com os princípios da conservação ambiental.

Qual a sua avaliação sobre a Medida Provisória que alterou o Código Florestal Brasileiro e diminuiu de 50% para 20% a autorização para corte de árvores nativas nas propriedades privadas?
Fernando - Infelizmente, perdemos uma grande oportunidade de aperfeiçoarmos o Código Florestal. Os discursos polarizaram em índices sem embasamento técnico - ficou o bom (preservar 80% da Amazônia, os ambientalistas) contra o mau (cortar 50% da Amazônia, os ruralistas), e é lógico que o Congresso estabeleceu essa Medida Provisória que parece que será permanente, considerando a vontade do governo em mexer nesse tema.
Lógico que não defendo o desmatamento desenfreado da Amazônia. O que acho correto é que, à luz dos conhecimentos atuais, possamos sacar de instrumentos de planejamento mais inteligentes e adequados à realidade social do país, como o Zoneamento Ecológico e Econômico por exemplo. Favorecer a ocupação ordenada da Amazônia é uma obrigação de todos, mas o que fazemos hoje é dar as costas a essas pessoas, é achar que proibindo o corte vamos estar fazendo um bem a elas, o que não necessariamente é verdadeiro. Não dar opção para elas melhorarem e condições de cidadania e acesso aos direitos básicos, isso sim é degradação ambiental.

É notória a força da bancada ruralista no Congresso. Existe uma bancada madeireira? Pelo que ela lutaria?
Fernando - O que existe é uma frente parlamentar da silvicultura, focada exclusivamente na defesa dos interesses das empresas que plantam florestas, ou seja, exclui o segmento de florestas nativas, portanto não existe uma bancada madeireira propriamente dita. Esse é uma demanda antiga do setor e que por sua importância é difícil de entender como não conseguiu ainda mobilizar recursos para ter seus interesses defendidos no âmbito do poder legislativo. A luta do setor é para que possamos trabalhar com base em regras claras e estáveis, sermos regidos por um órgão que entenda da atividade produtiva e que veja o setor como uma solução e não como um problema. A desburocratização criativa e fortalecimento de instrumentos de gestão focados no fomento à atividade sustentável deve ser a base da ação pública, logicamente respaldada pelas ações de comando e controle.

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