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2005-10-07
Visto sob a ótica do investimento, a adesão de produtores rurais gaúchos à atividade de florestamento pode ser encarada como uma poupança de médio e longo prazos. Com tempo de maturação bem mais extenso do que a safra de arroz ou do exigido pela pecuária, a silvicultura exige um tempo mínimo de sete anos até que leve ao bolso do produtor os primeiros retornos. Aos mais pacientes, ou com capital para aguardar os ganhos, o ciclo entre o plantio e o corte pode chegar a 20 anos ou mais.

Estimulada por investimentos de empresas nacionais, leia-se Votorantin e Aracruz, e mesmo internacionais, como da sueco-finlandesa Stora Enso, o florestamento que se enraíza no Estado apresenta uma novidade considerável aos agricultores e pecuaristas gaúchos, sobretudo da Metade Sul. É na região que, em alguns anos, chamará a atenção entre a paisagem tradicional do pampa a presença de árvores exóticas ao país. Exóticas, mas já adaptadas à região, como o eucalipto e a acácia australianos e o pinus norte-americano. Enquanto o eucalipto conta com cem anos de introdução no Brasil, a acácia foi trazida em 1930, e o pinus, há meio século.

- Pelas condições do solo, como de fertilidade, qualidade e profundidade, essas espécies acabaram se adaptando tão bem no Estado que rendem até mais do que em seus países de origem. O pinus, por exemplo, tem um rendimento, em metros cúbicos por hectare três vezes maior aqui do que nos Estados Unidos. Não é por acaso que estamos atraindo esses investimentos - explica o engenheiro florestal e professor Doadi Brena, integrante do programa Floresta-Indústria RS.

Vantajoso para a indústria, o florestamento também beneficia o produtor porque é uma cultura menos afetada pela seca ou pelo excesso de chuvas. Condições que costumam atingir em cheio cultivos tradicionais de grãos. Outra vantagem da silvicultura é que ela não exige o abandono de outras culturas, como a criação de gado, para que seja implantada, podendo servir como fonte de renda extra.

- A atividade de florestamento convive bem com a pecuária existente na região, como já vemos acontecer - avalia o pecuarista Paulo Ricardo de Souza Dias, integrante da comissão de pecuária da Federação da Agricultura do Estado.

De uma área total de cerca de 15 milhões de hectares que compõe a Metade Sul, o governo do Estado estima que até 5% possa ser ocupada com atividades de florestamento. Ao se unir para explorar a silvicultura no extremo sul do Estado, os gaúchos estão se unindo, também, a uma grande base florestal já existente na Argentina e no Uruguai. No futuro, além do design, o mobiliário que sair do Rio Grande poderá ter, também, madeira 100% gaúcha.

Empresa nacional investe em pesquisas, com o apoio de universidades De agora em diante, grãos e animais precisarão se acostumar cada vez mais com a companhia crescente do eucalipto na Zona Sul do Estado. Impulsionado pela Votorantim Celulose e Papel (VCP), o agrossilvipastoreio é um sistema que proporciona às pequenas e médias propriedades rurais mais opções.

O plantio de mudas lançado pela VCP entrou em evidência no último dia 22, quando a empresa realizou um dia de campo na fazenda Aroeira, pertencente ao ex-complexo Ana Paula, em Candiota. Mais do que demonstrar a técnica sobre a produção de eucaliptos, a VCP lançou oficialmente uma pesquisa com duração prevista de sete anos.

O estudo, do qual fazem parte a Universidade Federal de Santa Maria (UFSM) e a Universidade de Freiburbg (Alemanha), analisará o desenvolvimento do eucalipto semeado em associação com grãos e pastagens, e as reações das outras plantas à competição pela busca de água, nutrientes e iluminação.

Ao todo, mais de 3,2 mil hectares distribuídos em pequenas propriedades de 27 municípios estão comprometidos com o plantio de eucalipto, que já iniciou em alguns lugares, e deve se estender até dezembro. Em parceria com a Emater e com instituições financeiras, a VCP lançou o programa Poupança Florestal, onde os participantes encontram duas opções: reflorestamento e agrossilvipastoreio.

- O consórcio com a agricultura e com a pecuária quebra o paradigma de que o eucalipto é prejudicial às outras plantas - diz o gerente operacional da unidade Extremo Sul da VCP. No agrossilvipastoreio, as mudas são distribuídas com espaçamentos maiores, permitindo entre as linhas de semeadura o cultivo de grãos ou o plantio de pastagens, para gado ou ovinocultura. Em setembro, a empresa lançou em Candiota uma área experimental de 3,6 hectares onde vai estudar a reação das plantas ao sistema, em diversas combinações, durante sete anos.

Tanto no reflorestamento quanto no agrossilvipastoreio os agricultores vão produzir eucaliptos para comercialização garantida com a VCP. A madeira será destinada à produção de celulose, matéria-prima do papel. A empresa já estuda a instalação de uma fábrica na região para completar a cadeia produtiva na Zona Sul do Estado.

No ano passado, em mil hectares de Candiota foram testados os cultivos de grãos e frutas na combinação com as árvores. A seca prejudicou o resultado da experiência, mas não interrompeu o trabalho.

- A soja produziu 18 sacas por hectare, o sorgo 40, e a melancia alcançou 10 toneladas por hectare - conta o técnico Arnaldo Cardozo.

O plantio continuou no inverno, com a semeadura de trigo, cevada e girassol, enquanto as mudas de eucalipto se desenvolvem. No local, 12 produtores do distrito de Colônia Nova estão consorciados com a empresa. No sistema de arrendamento, os agricultores passam 5% da produção à empresa, dona da terra, e comercializam o restante.

A atividade
O EUCALIPTO EM UM HECTARE
1 hectare recebe 1.666 mudas
De onde se extraem 280 metros cúbicos de madeira
Que produzem 70 toneladas de celulose
Transformados em aproximadamente 50 toneladas de papel
O AGROSSILVIPASTOREIO
No sistema, o espaçamento normal entre as linhas de cultivo das mudas aumenta de três para dez metros. É nesse espaço que podem ser plantados grãos ou pastagem, para a pecuária ou a ovinocultura
Frutas e grãos são as plantas mais recomendadas para a associação, explorando potenciais climáticos e de solo de cada região

POUPANÇA FLORESTAL
Os moradores dos 27 municípios atendidos pelo programa devem procurar a Emater local para receber a orientação sobre a viabilidade da adesão.
A produção florestal primária do Brasil somou R$ 7,869 bilhões em 2003, segundo dados do IBGE, ante os R$ 5,8 bilhões registrados no ano anterior.
O segmento da silvicultura (florestas plantadas) aumentou sua participação no total, representando 52% do valor total da produção florestal em 2002, e passou a representar 65%, em 2003.
Projeto de pesquisa em Candiota terá US$ 200 mi até 2.012

Sem impacto ao ambiente

Não é por ser exótico ao Brasil que o cultivo de eucalipto, pinus e acácias tenha de ser uma atividade prejudicial ao ambiente. Manejado de forma correta, e respeitando algumas proporções, o florestamento promovido com estas espécies pode conviver pacificamente com o restante da flora e da fauna gaúcha.

Respeitando uma escala de produção que não exceda 6% da região onde está sendo praticada, a silvicultura não representa uma ameaça ambiental, analisa a ecologista Lara Lutzenberger, presidente da Fundação Gaia.

- Dentro de alguns limites e não sendo cultivado de forma continua, mas sim em mosaicos (com áreas limpas intercaladas às cultivadas), não vejo problemas nos projetos de florestamento - opina Lara.

O elevado consumo de água por parte das novas florestas tampouco devem afetar a biodiversidade local, já que a região tem entre suas características a abundância hídrica, explica o secretário estadual do Meio Ambiente, Mauro Sparta. Em muitos casos, avalia, a nova atividade não está nem mesmo ocupando espaços de outros cultura, mas sim sendo implantada em áreas ociosas.

O temor de alguns ambientalistas, porém, é de que o segundo passo neste setor seja a implantação de fábricas de celulose na região.

- Hoje, porém, o setor adota filtros mais potentes e tecnologias limpas que praticamente anulam os problemas do passado - pondera. (ZH, Campo e Lavoura, 7/10)

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