Efetividade das redes de Educação Ambiental depende de gestão e recursos
2005-09-29
Desenvolver e difundir a cultura de rede é um desafio a ser enfrentado também pela educação ambiental, afinal, virtuais ou presenciais, as redes podem ser um espaço para a troca de experiências, discussão e mobilização em torno de ações e proposições de políticas públicas, inclusive sobre temáticas ambientais. Esse foi o tom de um dos debates apresentados durante o I Encontro de Educação Ambiental, que ocorreu entre os dias 23 e 25 de setembro, na Unesp (campus de Botucatu).
O papel das redes na concretização de novas conquistas e na ampliação das já alcançadas pelos educadores ambientais é algo que vem sendo sinalizado e incorporado no Brasil, principalmente a partir da criação da Rede Brasileira de Educação Ambiental (Rebea), ocorrida durante os Fóruns de Educação Ambiental do início dos anos 90, em São Paulo, numa articulação de ONGs, universidades e órgãos governamentais. A expansão dessa idéia concretizou-se nas atuais redes estaduais espalhadas pelo país e articuladas pela Rebea. Organizada a partir desta estrutura, a educação ambiental encontra atualmente como principais metas a promoção da inclusão de novos membros e instituições e a obtenção de recursos para gestão.
Segundo Patrícia Otero, representante da Rede Paulista de Educação Ambiental (Repea), as características típicas das redes - como horizontalidade, descentralização, flexibilidade e estímulo à autonomia - servem de contraponto à estrutura hierárquica que marca as instituições tradicionais (como as governamentais).
— Estes princípios da estrutura das redes sociais permitem acreditar que elas são capazes de nos ajudar a tornar o mundo mais justo, mais equilibrado e mais saudável de se viver - declarou Otero.
A representante da rede brasileira (Rebea), Vivianne Amaral, salientou, no entanto, que é preciso superar a visão romântica de que os princípios que regem as redes se concretizam espontaneamente.
— Quando se opera uma rede [papel assumido por ela na Rede Brasileira entre 1999 e 2004], esta visão é insustentável. É preciso entender como o padrão organizacional da rede funciona, caso contrário, não vai acontecer nada em relação à autonomia, as multi-lideranças não vão aparecer, a comunicação não vai se dar, não vai haver trocas entre as pessoas - destacou.
Já para Haydée Oliveira, representante da Rede Universitária de Programa de Educação Ambiental (Rupea), a descentralidade das redes é, de certa forma ilusória.
— São necessárias pessoas à frente deste processo de organização - defende ela.
Para que isso ocorra, Vivianne Amaral argumentou que é fundamental que se obtenham recursos financeiros, garantindo a gestão e sustentação das redes.
— Se não houver recursos para fazer encontros, profissionalizar a comunicação, fazer publicações e ter pessoas pagas para fazer a manutenção da rede, as redes vivem, mas vivem na sobrevida. Viram listas de discussão e ficam reduzidas no seu potencial de desenvolvimento da cidadania e no apoio à implantação da Política Nacional de Educação Ambiental - disse Amaral.
As três debatedoras do tema concordam que a organização em rede é fundamental para garantir um processo democrático de participação visando mudanças na sociedade, e como exemplo da importância dos recursos para as redes, Amaral citou o projeto Tecendo cidadania. Desenvolvido entre 2002 a 2004, com recursos provenientes do Fundo Nacional do Meio Ambiente (FNMA), o projeto permitiu a ampliação da equipe gestora e a profissionalização da rede e teve como resultados a expansão do número de redes integrantes da rede brasileira e realização de oficinas de formação e encontros presenciais.
A rede paulista também contou com recursos provenientes do mesmo edital do FNMA para desenvolver o projeto Fortalecendo a Repea e, segundo Patrícia Otero, oficinas de capacitação sobre cultura de rede e uso de ferramentas de comunicação estiveram entre as principais ações realizadas. Assim, os recursos para estes dois projetos auxiliaram também a enfrentar outros dois grandes desafios das redes: o desenvolvimento e difusão da cultura de rede e de seus valores, e a inclusão (inclusive digital) de novos membros e grupos.
Discussão teórica
O debate ocorrido em Botucatu ecoa em parte as discussões teóricas acerca do papel e da configuração das redes. O otimismo sobre essa forma de organização é uma visão compartilhada pelo filósofo Pierre Lévy que a relaciona com o desenvolvimento da cidadania. Já o sociólogo Manuel Castells, por sua vez, alerta em sua obra A Era da Informação que a promoção da mudança social na sociedade em rede é um processo complexo, devido a grande capacidade das redes de absorver novos insumos, acrescentando-os à própria rede e neutralizando-os. (Publicado originalmente na ComCiência, 28/09)