Em Diamantina, os diamantes já não são eternos
2005-09-27
Passados quase três séculos desde sua descoberta no antigo Arraial do Tejuco, o ciclo histórico de exploração dos depósitos de aluvião de diamante no Rio Jequitinhonha, em Diamantina (MG), entrou em sua fase derradeira. O sinal mais evidente da iminente derrocada do garimpo de diamantes de aluvião no Alto Jequitinhonha foi a recente decisão da Mineração Rio Novo (MRN), subsidiária do grupo Andrade Gutierrez, de até o final de janeiro de 2006 encerrar suas operações de extração na região.
A constatação de que a imensa jazida diamantífera está perto da exaustão deixa em suspense uma legião de garimpeiros pobres, que não encontram outra opção a não ser tentar tirar seu sustento da natureza.
A MRN é a última grande mineradora a manter concessão de exploração na área de Diamantina. Na primeira metade da década de 90, a Mineração Tejucana - empresa símbolo da exploração industrializada de diamantes na região - encerrou suas atividades depois de mais de 40 anos de extração no Jequitinhonha. Como que anunciando o estágio atual, a empresa abandonou nas margens do rio o que restou de enormes dragas de alcatruzes - que hoje compõem uma paisagem desoladora.
Na decisão da subsidiária do Grupo Andrade Gutierrez pesou basicamente o fato de o teor diamantífero do cascalho atualmente retirado do rio ser muito baixo.
— Realmente, os depósitos minerais, para a tecnologia atual e para as condições de preço de diamante, estão praticamente exauridos - comenta o gerente de manutenção da empresa, Marcelo Belém.
A concessão de lavra de 27 quilômetros está sendo operada com metade do efetivo de maquinário e pessoal utilizado em épocas mais abundantes.
Na área de extração localizada a 70 quilômetros ao norte de Diamantina, a MRN utiliza hoje duas dragas - Maria Bonita (de alcatruzes) e Dona Júlia (de corte-sucção) - para retirar uma média de 90 mil metros cúbicos por mês de cascalho. Outras duas dragas foram paralisadas há cerca dois anos.
— Já se chegou aqui por mês, na época de pico (com quatro dragas operando), à casa dos 450 mil metros cúbicos por mês - observa Belém. A MRN possui atualmente 143 empregados, mas seu quadro funcional direto já foi formado por aproximadamente 350 trabalhadores.
— Na verdade, o que está ocorrendo é exaustão da jazida - reitera o diretor-gerente da mineradora, Leonardo de Andrade. — São os últimos suspiros do garimpo por aqui - sentencia.
De imediato, o processo de esgotamento do diamante de aluvião não impede a continuidade da pequena mineração ao longo do rio, seja ela legal ou clandestina. Mas os dados mostram que o garimpo executado com o auxílio de bombas de sucção também já sofre as conseqüências da escassez.
Atualmente, estão em vigor cerca de 130 licenças para a exploração de pequeno porte no Rio Jequitinhonha. O município, por meio de um convênio com o Conselho de Política Ambiental (Copam) do Estado, é o responsável pela concessão das licenças de operação. Algo, porém, cada vez mais raro.
Num processo decrescente, em 2001, por exemplo, foram expedidas quase 80 licenças. No ano passado, esse número caiu para cerca de 20 licenças, de acordo com a secretária de Meio Ambiente da prefeitura de Diamantina, Débora Rama Pires.
— Este ano nós não expedimos nenhuma licença de operação - ressalta.
Opinião comum entre autoridades do município é que a tradição garimpeira de quase 300 anos na região não vai acabar do dia para a noite. A estimativa é que no máximo 2 mil pessoas ainda exerçam a atividade ao longo do Rio Jequitinhonha.
Os alvos de exploração, porém, passaram a ser as áreas consideradas lavradas pelas grandes empresas.
Há 15 anos, calculava-se que pelo menos 5 mil pessoas estavam diretamente envolvidas com o garimpo de diamantes na região.
As pequenas mineradoras são, na verdade, sociedades entre os garimpeiros, na qual o investidor - pessoa que financia o equipamento (uma bomba, com combustível, que custa em torno de R$ 20 mil a R$ 30 mil) - tem direito a 50% da produção do garimpo.
Os garimpeiros, que efetivamente executam a extração, ficam com 25%. Os 25% restante é a parte que cabe à pessoa que banca a cozinha e a manutenção do acampamento, quase sempre o próprio investidor.
— É uma atividade associativa. Praticamente, não existem empresas na região que contratam os garimpeiros - ressalta o presidente da Cooperativa Regional de Garimpeiros de Diamantina (Copergadi), Alberto Pinho.
— Todos eles participam de lucros e prejuízos. Eu diria que a média de remuneração é superior a um salário mínimo. Mas é claro que há quem ganhe menos. Existe garimpo que não produz - admite. (O Estado de S. Paulo, 25/09)