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2005-09-26
A falta de um marco regulatório com regras claras está espantando o capital privado do setor de saneamento, principalmente o estrangeiro. Os mais propensos a sair do país são justamente os pioneiros, aqueles que entraram no país ainda na década passada: os espanhóis, que têm negócios no Mato Grosso do Sul, e os portugueses, no Rio de Janeiro.

O grupo Águas de Barcelona já negocia a venda do controle (51%) da Águas de Guariroba - concessionária de água e esgoto de Campo Grande, no Mato Grosso do Sul - com o frigorífico Bertin, um dos maiores exportadores de carne bovina do país.

A assessoria de imprensa do Bertin diz que não há informações oficiais, mas também não nega a negociação. A Águas de Guariroba também não comenta o assunto. Mas um executivo da empresa chegou a declarar, em uma reunião na Câmara de Vereadores, que contratara o banco BBVA para uma avaliação das ações da empresa.

Segundo uma fonte da prefeitura de Campo Grande, o problema na Águas de Guariroba não tem relação com regulação, mas com conflito entre os sócios Águas de Barcelona e a construtora local Cobel. Pelo contrato inicial, os espanhóis teriam direito de comprar a participação de 41% da Cobel e, agora, não chegam a um acordo quanto ao valor. Isso estaria levando ao descumprimento das metas de investimento e de expansão.

As negociações entre Bertin e Águas de Barcelona estariam complicadas porque o prefeito de Campo Grande, Nelson Trad Filho (PMDB), encaminhou à Câmara de Vereadores um projeto criando uma nova empresa municipal de saneamento. Seria uma forma de pressionar os sócios a uma definição rápida de quem vai realmente controlar a empresa e retomar o programa de investimentos e de expansão dos serviços. A prefeitura espera um desfecho societário até outubro; se não ocorrer, poderá realmente tentar retomar os serviços de saneamento.

Já no Rio de Janeiro os portugueses enfrentam problema diferente. O grupo Águas de Portugal controla a Prolagos, que desde 1998 atende a um consórcio de cinco municípios da Região dos Lagos (Armação de Búzios, Arraial do Cabo, Cabo Frio, Iguaba Grande e São Pedro da Aldeia).

— Não posso afirmar com toda certeza que não faremos isso [sair do país]; o que temos que fazer é buscar o retorno do que já foi investido - desconversa o gerente institucional da Prolagos, Maurício Ramos.

Segundo ele, a Prolagos antecipou os investimentos de R$ 250 milhões previstos para os 25 anos de concessão e está em dificuldades. Contratou a assessoria da Fundação Getúlio Vargas (FGV) para avaliar a situação de desequilíbrio econômico-financeiro, de modo a pedir uma compensação do poder público.

O vice-presidente da Abdib, Newton de Lima Azevedo, não faz rodeios:

— Os investidores estrangeiros estão de malas prontas para sair do país - diz. Mas nem todos, a julgar pelo que diz o diretor-presidente da Águas de Limeira, Fernando Mangabeira Albernaz. Segundo ele, o grupo Suez não estaria pensando em sair do país, como já fez na Argentina há pouco mais de uma semana.

— Aqui não existe essa discussão - rechaçou.

A Águas de Limeira é dividida em partes iguais pelos franceses da Suez Ambiental e pelo grupo Odebrecht, os pioneiros que, em 1995, se uniram para formar a primeira concessionária privada de água e esgoto do Brasil, no interior de São Paulo. Os franceses também controlam a Águas do Amazonas, concessionária de saneamento de Manaus.

Até 2001, a Águas de Limeira não teve aumento de tarifa, o que teria causado sérios problemas financeiros. No início de 2004, a prefeitura e a empresa acertaram um aditamento ao contrato, revendo o cronograma de investimentos e aumentando o valor das tarifas. Mas a nova administração anulou a alteração do contrato em janeiro deste ano. A empresa, então, foi à Justiça.

Resultado: prevista para começar este ano, a geração de caixa positiva vai atrasar bastante e a distribuição de dividendos entre os acionistas vai ficar para 2013.

— A Águas de Limeira pagou o preço pelo pioneirismo - reclama Albernaz. Recentemente, a empresa e a prefeitura acertaram os ponteiros e o executivo espera um acordo para breve.

— O acordo será bom para todos.

Os grupos privados que se aventuraram nas primeiras concessões, na década passada, hoje reclamam da instabilidade regulatória. O presidente da Associação Brasileira de Concessionárias Privadas de Serviços Públicos de Água e Esgoto (Abcon), Mario Amaro da Silveira, conta que, em alguns municípios, a cada troca de prefeito as concessionárias são assombradas com ameaças até de encampamento dos serviços. O Brasil tem hoje 63 concessões privadas de saneamento, que atendem a sete milhões de pessoas.

Mas os riscos foram mal avaliados pelos primeiros investidores. A economista da PUC-RJ Marina Figueira de Mello concluiu que, na ausência de regras, as primeiras concessões foram verdadeiras aventuras, nas quais os concessionários correm elevados riscos e procuram cobrar por isso.

— A definição do marco regulatório certamente reduzirá o custo dos serviços para o público e aumentará o nível de concorrência pelas concessões ou parcerias.

A falta de uma legislação específica praticamente estancou novos investimentos privados no setor de saneamento básico no Brasil. Segundo a Abcon, há cinco anos o capital privado não disputa nenhuma concessão em municípios de médio e grande porte. Ramos, da Prolagos, diz que o grupo português poderia ter investido em outras concessões se o tal marco regulatório estivesse claramente definido.

— A indefinição na aprovação do marco regulatório do setor estancou a expansão do capital privado - confirma Ronaldo Seroa da Motta, economista do Instituto de Pesquisas Aplicadas (Ipea), em um estudo sobre o setor de saneamento, de 2004.

Por outro lado, os recursos públicos em saneamento também vêm minguando a cada ano. Segundo o vice-presidente da Abdib, o governo Lula destinou cerca de R$ 5 bilhões para o setor em dois anos e meio - bem aquém dos R$ 10 bilhões anuais que seriam necessários para universalizar o atendimento de água e esgoto até 2020.

Segundo o presidente da Companhia Riograndense de Saneamento (Corsan) e da Associação das Empresas de Saneamento Básico Estaduais (Aesbe), Vitor Bertini, na década de 70, o governo investia 0,34% do Produto Interno Bruto (PIB). O percentual caiu para 0,28%, na década seguinte; para 0,19%, nos anos 90 e para 0,18% entre 2001 e 2003.

As razões para a escassez de investimentos são muitas. O presidente da Sabesp, Dalmo Nogueira, reclama que a companhia paulista tem mais facilidade de acesso a recursos privados no mercado financeiro do que aos públicos, ainda que os primeiros sejam significativamente mais caros. Mas sustenta que a Sabesp tem mantido o programa de investimentos.

O problema, segundo ele, são os entraves burocráticos. Para a Sabesp obter um financiamento dos fundos públicos (o principal é o FGTS), a União precisa dar garantias e o Estado, contra-garantias à garantia da União. Em alguns casos é necessária também a liberação por parte do Ministério da Fazenda e do Senado sobre a capacidade de endividamento do Estado de São Paulo, o controlador da Sabesp.

Conforme cálculo do Ministério das Cidades, o país precisa investir R$ 178 bilhões nos próximos 20 anos para alcançar níveis adequados de universalização dos serviços de água e esgoto. O economista do Ipea nota que isso está cada vez mais distante, pois os investimentos caíram 30% desde 1998.

A área de saneamento já vinha perdendo capacidade de investimento desde a década de 80 porque as empresas estaduais não conseguiram adaptar suas formas de gestão ante a deterioração de sua capacidade financeira por conta dos processos inflacionários. Das 25 companhias estaduais, apenas nove têm tarifas que cobrem suas despesas.

Investimento caiu 30% em quatro anos
O economista Ronaldo Seroa da Motta, do Instituto de Pesquisas Econômicas Aplicadas (Ipea), estudou o setor de saneamento e identificou uma tendência de queda dos investimentos mais acentuada no fim da década de 1990 - tanto em relação ao Produto Interno Bruto (PIB) quanto à população.

Entre 1996 e 1998, os investimentos em saneamento em relação ao PIB caíram 30% - de 0,35% para 0,25%. O único alento é que a queda parece ser menor nas camadas da população com menos renda, devido aos projetos de saneamento de cunho social.

Em relação à população, os investimentos em saneamento caíram pela metade em apenas quatro anos - de 1998 a 2001. Nas empresas estaduais, essa queda foi ainda maior, de 60%. Já as empresas privadas com atuação municipal investiram cinco vezes mais do que as públicas, quando comparado com a população. O economista credita o maior dinamismo das empresas privadas às metas contratuais de expansão - investiram por obrigação contratual.

— Dessa forma, esses indicadores parecem sugerir que essa ainda incipiente participação do capital privado gera mais universalização dos investimentos que no caso da gestão pública.

A economista Marina Figueira de Mello, da PUC-Rio, analisou a situação de quatro concessões passadas à iniciativa privada, na década passada: Águas de Limeira, Águas do Imperador, Prolagos e Águas do Juturnaíba - todas concessões plenas, ou seja, de água e de esgoto.

Nos municípios litorâneos do Rio de Janeiro atendidos pela Águas de Juturnaíba, a pesquisadora identificou uma política de tarifas cujo objetivo seria apenas o de aumentar as receitas da empresa - a empresa criou várias faixas novas de consumo residencial.

— Essa política tarifária maximizadora dos ganhos de monopólio não tem naturalmente qualquer relação com um modelo eficiente de tarifação - diz ela. A Águas de Juturnaíba foi procurada, mas não respondeu aos pedidos de entrevista.

Já a Prolagos ganhou elogios. A economista da PUC ressaltou que a empresa tomou o cuidado de não sobrecarregar os moradores dos municípios da Região dos Lagos, dividindo com os turistas os custos do sistema - a renda da população flutuante era muito mais elevada do que a da população residente.

A pesquisadora concluiu também que o critério de menor tarifa para a seleção das empresas é melhor para os usuários do que o de maior valor de outorga (pagamento pelo direito de explorar o serviço).

— A cobrança da outorga onera o concessionário privado e o consumidor, dificultando a transferência dos ganhos da privatização à população mediante tarifas mais baixas.

Mas os problemas não param na questão dos preços. Segundo a economista, os contratos de concessão não prevêem a cobertura total dos serviços durante o longo prazo de concessão, principalmente para a coleta e o tratamento de esgoto. Tampouco determinam as prioridades no atendimento, deixando a certeza de que ficarão sem atendimento justamente os mais carentes, menos capazes de pagar pelo serviço.

Regulação está longe do consenso
A tentativa do governo presidente Luís Inácio Lula da Silva de aprovar uma regulação para o setor de saneamento e viabilizar os investimentos necessários até agora não teve apoio político suficiente. O número de emendas apresentadas ao projeto de lei 5296/05, que define a política nacional de saneamento, ilustra o grau de consenso que o governo diz haver em torno dele: 862.

Como está hoje, a proposta do governo divide as associações que representam os principais segmentos do setor. De um lado está a Assemae (associação das concessionárias municipais), francamente favorável ao projeto como ele está. De outro, a Aesbe (associação das empresas estaduais). E há ainda um terceiro grupo de interesses formado pela Abcon e Abdib, que representam o capital privado.

O vice-presidente da Abdib, Newton Azevedo, classifica a proposta do governo como municipalista e estatizante. Para ele, sobra ideologia e falta pragmatismo. A entidade defende um choque de gestão vinculando a liberação de recursos públicos ao desempenho das companhias, principalmente a redução do desperdício. Azevedo avalia que o projeto é tímido em relação à cobrança por desempenho.

Do que Azevedo propõe, o presidente da Aesbe reclama. Vitor Bertini classificou de requinte de perversidade o dispositivo que obriga os municípios a apresentar ao Ministério das Cidades um plano diretor. Para Bertini, o maior pecado do projeto do governo é não respeitar as diferenças regionais. A política do setor deveria, na visão dele, dar apenas as diretrizes de expansão dos serviços, deixando aos estados o detalhamento da política.

O ex-ministro Olívio Dutra atribui a oposição de Bertini à uma disputa política regional - são adversários no Rio Grande do Sul, onde Bertini preside a companhia estadual de saneamento.

Os grupos privados propõem um punhado de alterações. A primeira seria incluir um artigo definindo os municípios como titulares dos serviços de saneamento, mas concedendo aos estados o direito de legislar sobre as regiões metropolitanas.

Abcon e Abdib também não aceitam que as decisões sobre tarifas sejam submetidas aos Conselhos das Cidades, que seriam formados por moradores. Mas Olívio Dutra rebate que os conselhos têm apenas papel consultivo. A Abcon também quer benefícios tributários concedidos a outros setores (como a redução da tributação de PIS e Cofins).

A aplicação ao setor de saneamento de mecanismos previstos na Lei das Parcerias Público-Privadas (PPP) também é uma reivindicação do setor privado. O presidente da Abcon, Mario Amaro da Silveira, citou, por exemplo, a possibilidade de o agente financiador dos projetos assumi-los em caso de falência da empresa titular; a aplicação do modelo de project finance (no qual as receitas futuras serviriam como garantias do negócio); a inversão das fases da licitação (primeiro a abertura das propostas e avaliação da vencedora e só depois a checagem da qualificação da empresa); e a arbitragem dos conflitos.

Além da proposta do governo, tramita também um substitutivo mais sucinto, que tem o apoio das empresas estaduais. (Valor Online, 23/09)

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