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2005-09-19
O Brasil gera, diariamente, mais de 162 mil toneladas de lixo urbano, de acordo com dados da Associação Brasileira de Empresas de Limpeza Pública e Resíduos Especiais (Abrelpe). Desse total, apenas 40% recebem tratamento adequado, em aterros sanitários. Mas, o destino final de 60% da coleta dos resíduos sólidos (domiciliares e comerciais) produzidos em todo o país ainda é o lixão.

Diferentemente dos aterros, esses depósitos de lixo são impróprios para o recebimento e tratamento de resíduos e acabam promovendo a contaminação do solo, da atmosfera e do lençol freático das regiões a que pertencem, além de propiciarem permanentes riscos de geração de epidemias, incêndios e desmoronamentos.

Pesquisa recente, encomendada pelo Unicef à ONG Água e Vida, revelou que esse tipo de depósito irregular existe em 73% dos municípios brasileiros com mais de 50 mil habitantes e em 70% daqueles com menos de 50 mil habitantes, além de estarem presentes em 26% das capitais. A alternativa para os lixões seria a implantação de aterros sanitários, que não poluem nem exalam maus odores e ainda podem, após o encerramento de suas operações, ser aproveitados para receber campos ou parques públicos. Mas os custos dos projetos esbarram na capacidade financeira das prefeituras.

O cenário piora quando leva-se em conta que, no Brasil, de acordo com o IBGE, 28% dos domicílios nem ao menos têm coleta oficial de lixo. Na região Nordeste, 49,8% dos domicílios não são atendidos por programas de coleta e no Maranhão, esse índice chega a quase 80%. Sem o serviço, a população acaba jogando o lixo em rios e terrenos baldios.

A Abrelpe informa que, hoje, para universalizar os serviços de limpeza urbana, seriam necessários investimentos (pré-operacionais) da ordem de R$ 800 milhões. Somando-se a isso os R$ 500 milhões de recursos necessários para repor os atuais aterros sanitários em final de vida útil, chega-se a uma estimativa de R$ 1,3 bilhão para solucionar o problema da destinação de resíduos sólidos no país na fase pré-operacional.

Uma minuta de anteprojeto de lei criando a Política Nacional de Resíduos Sólidos acaba de ser enviada pelo Ministério do Meio Ambiente à Casa Civil da Presidência da República, e será um dos destaques do 23º Congresso Brasileiro de Engenharia Sanitária e Ambiental, que começa no próximo domingo (18/09) e se estende até o dia 23. Com o tema principal Saneamento Ambiental: Realidade ou Utopia, o evento, consagrado como o maior do setor no país, será realizado pela Associação Brasileira de Engenharia Sanitária e Ambiental (ABES), em Campo Grande, no Mato Grosso do Sul.

Durante cinco dias especialistas, autoridades e empresas públicas e privadas que atuam na área vão discutir, entre outros pontos, a elaboração de mecanismos de estímulo à redução da geração de lixo e a definição de responsabilidades para os geradores de resíduos industriais, fabricantes, importadores e comerciantes.

Outro aspecto da matéria a ser debatido é a reciclagem. No Brasil, conforme mostra a mesma pesquisa do Unicef, apenas 100 dos mais de 5,5 mil municípios do território nacional têm sistema oficial de coleta seletiva de lixo. Mas, a amostragem também identifica que, em 1.900 municípios, catadores de lixo fazem coleta seletiva informalmente. A contribuição destes trabalhadores, geralmente organizados em cooperativas, chega a ser responsável por 90% de todo material operado por indústrias de reciclagem no Brasil. Por meio de ajudas como esta, o país conseguiu atingir o posto de terceiro lugar em reciclagem de alumínio do mundo.

Certificados de Emissão Reduzida (CER) podem financiar aterros
Uma saída que começa a ser explorada para tentar solucionar o problema dos resíduos sólidos vem do próprio lixo. Trata-se do emprego do biogás, formado naturalmente no processo de decomposição anaeróbia do lixo, em aterros sanitários. Esse composto pode ser usado em caldeiras, fornos, motores à explosão para veículos e na produção de energia elétrica.

Mas o grande potencial do biogás está em uma vantagem adicional de sua utilização. Como é formado por 50% de gás metano, um dos gases geradores do efeito estufa na atmosfera terrestre, seu uso gera os chamados CER – Certificados de Emissões Reduzidas, popularmente conhecidos como créditos de carbono, definidos pelo Protocolo de Quioto, em vigor desde fevereiro deste ano.

O acordo, assinado em 1997, estabelece que os países desenvolvidos signatários (relacionados em seu Anexo 1) devem reduzir em 7%, até o ano de 2012, a emissão de gases de efeito estufa (GEE), tendo como referência os níveis de emissão verificados em 1995. Cada tonelada de metano equivale a 21 de gás carbônico (CO2), em termos de efeito estufa. Sendo assim, cada vez que ocorre a combustão do metano, as emissões equivalentes em CO2 diminuem e são contabilizadas para os CERs.

Países em desenvolvimento como o Brasil, que não têm metas de redução, podem comercializar no mercado mundial os créditos correspondentes à redução de emissões, por meio dos seus Certificados, decorrentes de empreendimentos estabelecidos em acordo com os chamados projetos de Mecanismo de Desenvolvimento Limpo (MDL).

O interesse na compra de CERs reside na diferença de custos de redução de emissões que existem nos diversos países. Segundo Luiz Edmundo Costa Leite, consultor na área de resíduos sólidos, que estará presente no 23º Congresso de Engenharia Sanitária e Ambiental, certos processos realizados em países desenvolvidos podem alcançar valores superiores a US$ 500,00 por tonelada de carbono, enquanto os custos de redução de emissões em países não relacionados no Anexo 1 do Protocolo podem variar de US$ 1 a 30 por tonelada de CO2. Com base nesta diferença de preços, criou-se o Mercado de Redução de Emissões, no qual o valor atual está em torno de US$ 5,00 por tonelada de CO2 equivalente não emitido ou seqüestrado.

O consultor lembra ainda que, no contexto do MDL, o Brasil despontou na frente e lançou o primeiro projeto do mundo, aprovado pelo seu Conselho Executivo do Protocolo de Quioto. A empresa Nova Gerar, de Nova Iguaçu (RJ), foi a pioneira a implantar uma unidade de geração de eletricidade utilizando o metano do biogás de lixo como combustível. O projeto está dimensionado para capturar o equivalente a 2,5 milhões de toneladas de gás carbônico (US$ 4,5 a tonelada) e tem no Governo da Holanda seu primeiro cliente.

A nova oportunidade tem apoio do Banco Mundial e de outras agências de fomento e desenvolvimento internacionais, que vêm disponibilizando recursos e informações para a implantação de aterros sanitários com sistemas de recuperação e exploração de biogás do lixo. O potencial é ainda maior quando se leva em consideração que o biogás continua sendo produzido por um período de mais de 15 anos após o encerramento do aterro como repositório de resíduos.

— A receita oriunda dos CERs, ainda que não ocorra imediatamente após a transformação de um lixão num aterro sanitário, poderá servir, a médio prazo, de real ajuda financeira às Prefeituras, para garantir a correta operação de instalações para destinação final do lixo urbano, resolvendo, definitivamente e a baixo custo, o problema da destinação correta dos resíduos produzidos nas cidades que administram - conclui Costa Leite. (Jornal do Meio Ambiente, 17/09)

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