Operação Curupira: MP tem prova de crime ambiental e corrupção contra Pires e Justus
2005-09-14
Silenciosamente, o Ministério Público de Mato Grosso tem feito uma verdadeira devassa nos processos administrativos relativos a licenças ambientais expedidas pela extinta Fundação Estadual do Meio Ambiente (Fema). Em entrevista exclusiva para A Gazeta, o promotor Domingos Sávio admite que já tem provas de que o ex-secretário de Meio Ambiente, Moacir Pires, e mais oito diretores e funcionários do órgão cometeram vários crimes ambientais e atos de corrupção.
Nas últimas semanas, o Grupo de Ação e Combate ao Crime Organizado (Gaeco) tem apreendido documentos e computadores em empresas e órgãos públicos que estão sendo encaminhados ao MPE para análise. Já foram ouvidas 40 pessoas e até mesmo o secretário da Casa Civil, Luís Antônio Pagot , foi convocado a dar explicações. Ao todo 15 inquéritos estão sendo investigados e deverão gerar denúncias e processos criminais.
A Gazeta: O que tem sido investigado quanto às denúncias de irregularidades na extinta Fema surgidas na Operação Curupira?
Promotor Domingos Sávio: Antes mesmo da Operação Curupira, o Ministério Público Estadual já vinha investigando a conduta do órgão ambiental, pois havia denúncias de que estavam sendo cometidas irregularidades. As informações que tivemos passamos cópias para o Ministério Público Federal e de lá para cá as investigações nunca pararam. Foram instaurados novos inquéritos e hoje são 15 procedimentos investigatórios que já detectaram irregularidades na Fema. Estamos na fase de apurar as causas, ou seja, se elas foram provenientes de propinas, atos de corrupção. Tudo dá ensejo a proposituras de ações, seja no âmbito civil e penal. Estamos avançando muito para saber porque essas irregularidades foram cometidas. Temos fortes indícios de enriquecimento ilícito, por isso não há só crime ambiental, mas também corrupção.
A Gazeta: Quem são as pessoas investigadas pelo MP?
Promotor: As investigações concentram-se na direção superior da extinta Fema, notadamente nas diretorias e especialmente na presidência e na sua assessoria. Até porque os atos administrativos foram cometidos e chancelados por diretores e o presidente, que era Moacir Pires. Em torno de oito a dez pessoas estão sendo investigadas.
A Gazeta: Que tipo de irregularidades foram cometidas?
Promotor: Muitas têm relação com o licenciamento ambiental irregular. As licenças para empreendimentos rurais continham a tipologia vegetal errada. Onde era floresta a Fema registrava na licença como área de transição ou cerrado. Tudo para beneficiar o empreendedor. Foram autorizados desmatamentos e licenças em áreas de conservação, reserva permanente e terras indígenas. Foram autorizados projetos de piscicultura em áreas de preservação permanente (margens dos rios). Muitas multas foram reduzidas de forma ilegal pois o infrator não cumpriu compromissos feitos com o órgão ambiental. O Código Ambiental é claro quando só permite a redução da multa se houver reparo dos danos. Reduziram multa em 90%. E não havia seqüência do licenciamento ambiental.
A Gazeta: O que vai acontecer com empresários que foram beneficiados com as irregularidades?
Promotor: Todos os licenciamentos irregulares serão cancelados. Se ficar provado que de alguma forma o empresário agiu com dolo, criminosamente, vai ser punido criminalmente junto com o agente público.
A Gazeta: Qual é a situação do ex-presidente da Fema, Moacir Pires, e o do ex-diretor de Recursos Florestais, Rodrigo Justus?
Promotor: As Licenças Ambientais Únicas (Laus) para empreendimentos rurais eram assinadas pelos dois. Eles figuram como alvo das investigações porque chancelaram os atos irregulares. Serão processados por crime ambiental e improbidade administrativa, mas temos avançado nas investigações que levam a atos de corrupção.
A Gazeta: Quantas pessoas já foram ouvidas nos inquéritos e que tipo de procedimentos estão sendo feitos nas investigações?
Promotor: Já ouvimos 40 pessoas. Estou fazendo esse trabalho juntamente com a promotora Ana Luíza Peterline de Souza. Estamos analisando milhares de documentos que foram apreendidos pelo Gaeco e tudo isso tem contribuído para as investigações. Estamos muito bem focados nas nossas investigações e os resultados estão sendo muito positivos.
A Gazeta: Na sua avaliação, a Operação Curupira promoveu mudanças em Mato Grosso?
Promotor: Acho que, por hora, a operação fez com que a questão ambiental fosse colocada em pauta tanto para o governo do estado como para o setor produtivo. O governo de Mato Grosso foi acordado de um sono profundo e isso não se discute. Agora o governo tem que dar uma resposta diante do caos que se instalou nos últimos dois anos. Para os empresários, foi um aviso. A lei tem que ser respeitada e ponto. Enfim, acho que a operação foi pedagógica.
A Gazeta: O governo do Estado, através da Secretaria Estadual de Meio Ambiente (Sema) está recebendo novas atribuições na politica ambiental e passará a expedir licenças para desmatamento e autorizações para transporte de produtos florestais (ATPFs) que eram atribuições do Ibama. Como o senhor está vendo isso?
Promotor: Eu tenho ouvido muito o governo do estado reclamar a competência de alguns atos com relação a ATPFs e agora passará a fazer esse trabalho. Antes de mais nada o governo tem que arrumar a casa. Hoje não se tem estrutura para isso. Precisa de funcionários e equipe técnica suficiente para atender essas atividades. (Gazeta de Cuiabá, 13/09)