Baía dos Golfinhos está perdendo mamíferos
2005-09-12
A baía dos Golfinhos, porção de mar próxima à ilha de Anhatomirim, na entrada da baía Norte, perdeu seu principal atrativo: os golfinhos. Quem afirma é o biólogo e doutor em biociências Paulo Flores, que há 15 anos estuda um grupo desses animais que vive entre Florianópolis, Governador Celso Ramos e Biguaçu.
Normalmente encontrados em águas rasas, calmas e costeiras, os golfinhos-cinza mudaram-se da entrada para o interior da baía Norte. Além de fazer com que eles sejam menos vistos pelos turistas, a saída dos animais de seu hábitat tradicional pode afetar o equilíbrio da cadeia alimentar - com prejuízos à pesca - e pôr em risco os próprios golfinhos.
— Eles estão indo para a região ao longo da Caieira (Governador Celso Ramos) e a foz do rio Biguaçu, onde a poluição do mar é mais crítica - explica Flores.
Há duas espécies principais de golfinhos encontrados na baía Norte. A mais comum (Sotalia fluviatilis) é chamada pela população local simplesmente de golfinho, mas também conhecida como golfinho-cinza ou boto-cinza. Acompanhando o mesmo grupo há mais de uma década (um golfinho dessa espécie vive em média 30 anos), Flores é capaz de reconhecer individualmente os animais.
Menos numerosos são os botos-preto (Tursiops truncatus), também chamados de golfinhos-nariz-de-garrafa. São encontrados em grupos de cinco ou seis. Por serem menos tímidos, no entanto, acabam sendo mais vistos perto da costa, nas praias de Governador Celso Ramos e Florianópolis.
Flores diz que os estudos realizados até agora não permitem afirmar com segurança por que os golfinhos-cinza deixaram a área onde tradicionalmente viviam, fenômeno que começou a ser verificado entre 2000 e 2001. Mas é possível apontar três fatores prováveis.
Um deles é o aumento do tráfego de embarcações, já que os animais dessa espécie procuram afastar-se dos barcos. Outro é a expansão das áreas de maricultura, tomando zonas costeiras onde esses animais nadavam e se alimentavam. A terceira é a pesca na região, alterando a oferta de alimento. Ainda não foi detectada redução no número de golfinhos que vivem na baía.
— É possível, no entanto, que este seja um grupo isolado, já que o mais próximo está a 170 quilômetros, em São Francisco do Sul, o que os torna mais vulneráveis - diz o biólogo.
ONG busca apoio para viabilizar pesquisas
O biólogo Paulo Flores fundou em junho uma organização não-governamental (ONG) voltada especificamente para o estudo dos golfinhos, com o objetivo de colaborar com a conservação dos animais. O Instituto de Pesquisa e Conservação de Golfinhos (IPCG) está buscando parcerias para viabilizar as pesquisas e nas próximas semanas deve obter um espaço próprio, em São José, e colocar no ar sua página de Internet. Além do trabalho de Flores, o instituto conta com a colaboração da pesquisadora argentina Mariel Bazzalo, que prepara um estudo de doutorado na Universidade de Buenos Aires sobre os golfinhos da baía Norte.
Flores luta para conseguir parcerias que sustentem o sonho de criar uma instituição inteiramente voltada ao estudo dos golfinhos. Algumas dessas parcerias começam a aparecer, mas ainda faltam verbas que garantam a continuidade da pesquisa. Flores conseguiu, por exemplo, financiamento junto à Chicago Zoological Society, dos Estados Unidos, para analisar no laboratório da instituição material genético retirado de amostras de dentes de 36 golfinhos da baía Norte. É um estudo inédito, que permitirá conhecer melhor os animais e suas relações com outros grupos. Mas falta dinheiro para a viagem do pesquisador até os Estados Unidos (cerca de US$ 1,3 mil para a passagem).
— Temos em Santa Catarina dois projetos voltados para as baleias franca, que contam com apoio e verbas, mas os golfinhos ainda não têm o mesmo apelo - diz o biólogo. Em 1992, um decreto federal criou no litoral de Governador Celso Ramos a Área de Proteção Ambiental (APA) de Anhatomirim. Destinada justamente a preservar os golfinhos, a APA tem até uma área demarcada exclusivamente para os animais, onde teoricamente nenhuma embarcação poderia entrar. Mas a falta de fiscalização do Ibama - sem recursos e pessoal para as unidades de conservação - e de um plano de manejo fazem com que a reserva só exista no papel. (A Notícia, 11/09)