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2005-09-06
Por Guilherme Kolling
Os movimentos de bairro estão retomando a mobilização para revisar o Plano Diretor de Porto Alegre. Desta vez, o assunto é a preservação do patrimônio histórico. A Secretaria do Planejamento Municipal está para enviar à Câmara o projeto das áreas especiais de interesse cultural.

De novo, Moinhos de Vento e Petrópolis lideram comunidades para tratar do assunto. As associações convocaram reuniões com os moradores e convidaram a arquiteta Ana Lúcia Meira, superintendente regional do IPHAN (Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional) para palestrar sobre o tema.

Em 23 de agosto, a reunião foi no clube Leopoldina Juvenil. —O objetivo do encontro foi mostrar a importância do projeto das áreas culturais para a preservação das características do bairro e também preparar o grupo para o debate que vem pela frente-, explica Alda Velloso, vice-presidente do Moinhos Vive.

O presidente Raul Agostini destaca o grande número de moradores presentes e o interesse crescente sobre o tema. Ele teme as alterações que estão sendo feitas no texto original, entregue no final do passado. —O novo estudo é uma caixa preta, não sabemos o que esperar das modificações-, conta.

O título da palestra Das igrejas barrocas à Casa da Estrela faz menção ao imóvel símbolo da defesa de preservação no Petrópolis – o movimento do bairro já fez duas manifestações ao redor da casa. Além de mostrar a história da preservação do patrimônio histórico-cultural na cidade, no Brasil e no mundo, a arquiteta explicou conceitos na área.

—Houve uma ampliação na definição do que é patrimônio. Não se trata mais só do que histórico ou artístico. Agora é incluída também a questão do patrimônio cultural, o que a sociedade dá valor. E não é algo necessariamente monumental, mas uma referência importante. Sob esse aspecto, a Casa da Estrela, no Petrópolis, e o casario da Luciana de Abreu, no Moinhos de Vento, são patrimônio-, explicou.

Ana Meira também falou de tombamento, esclarecendo que a medida não é sinônimo de congelamento, nem perda da propriedade. — Só não é permitido demolir e descaracterizar-, observa. Ela diz ainda que, nos debates, o Sinduscon costuma confundir tombamento de determinados bens com áreas de interesse cultural.

—Não é verdade que esses locais são tombados ou congelados. O que ocorre é a criação de um disciplinamento urbano que preserva as características desses locais. Como se fossem uma pequena zona do Plano Diretor, com seu regime urbanístico e índices construtivos específicos-.

A arquiteta elogia o texto original, feito pela Equipe do Patrimônio Histórico Cultural (Ephac) da Prefeitura em parceria com professores da Ritter dos Reis. —É um trabalho reconhecido, criterioso, que faz simulações sobre o possível futuro dessas áreas, estabelecendo medidas compatíveis. Se ocorrer uma revisão nesses parâmetros sem critérios, pode haver uma distorção, podendo resultar na perda das qualidades que tornaram aquela área especial, isto é, podem se tornar áreas comuns-, projeta Ana Meira.

A nova administração do Município retirou o projeto de lei encaminhado à Câmara no final de 2004, na gestão de João Verle, com a proposta de revisar o texto e fazer eventuais modificações. Cinco arquitetos da Secretaria do Planejamento trabalharam nas mudanças e as discutiram com funcionários da Secretaria da Cultura nesta semana. A proposta deve seguir ao prefeito e depois ser apresentada ao Conselho do Plano Diretor, para depois seguir á Câmara Municipal.

Novo capítulo na história da preservação
A arquiteta Ana Meira estuda a preservação do patrimônio histórico desde 1975, quando decidiu dirigir sua carreira para esse campo, então pouco desenvolvido no Brasil. Hoje a especialista é superintendente regional do IPHAN.

Em 2004, lançou pela Editora da Universidade o livro O passado no futuro da cidade: políticas públicas e participação popular na preservação do patrimônio cultural de Porto Alegre . O estudo abrande o período entre as décadas de 1970 e 90.

Para ela, o surgimento dos movimentos de bairro – Moinhos Vive, Petrópolis Vive, Porto Alegre Vive – no início dos anos 2000 representa um novo capítulo na história da preservação do patrimônio da cidade. — É uma surpresa maravilhosa ver tantas pessoas se preocuparem com o tema. E são preparadas, é só dar espaço para que elas se manifestem-, aponta.

Ela identifica o surgimento desses grupos a partir dos primeiros efeitos do Plano Diretor de 2000, quando muitos passaram a sentir a pressão imobiliária no quintal de casa e começaram a se organizar.
A arquiteta destaca ainda que as pessoas já são conscientes sobre a importância de preservar o patrimônio cultural, lembrando que o movimento surgiu de forma espontânea e com muita clareza nos objetivos que buscam.

—Esse novo momento traz vitalidade para a discussão da preservação, pois o assunto deixa de ser uma coisa vista só por especialistas. Interessa a todos-, observa.

Ana Meira lembra que o início da participação popular ocorreu ainda nos anos 60, quando intelectuais da cidade como Alberto André, Leandro Telles, Riopardense de Macedo escreviam artigos sobre o tema. Depois foi se ampliando, englobando outros profissionais. Anos depois, Paulo SantAnna escreveu uma coluna protestando contra a possível demolição do Mercado Público para a construção de um estacionamento.

Seguem-se abaixo-assinados para evitar a destruição de casas em diversos pontos da cidade. Até que em 1989, num momento emblemático, proprietários do casario na rua Félix da Cunha, bairro Moinhos de Vento, pediram o tombamento dos próprios bens.

O período do final dos anos 80 e os anos 90 retrata a popularização do tema em toda cidade. Conforme apurou Ana Meira, demandas do Orçamento Participativo pedem o tombamento de imóveis em diversos bairros da cidade: no Partenon, na Vila Nova, em Belém Novo.

A superintendente do IPHAN conta ainda que — Porto Alegre é uma das cidades que mais tem leis que se referem à preservação do patrimônio. Ao lado de Florianópolis, é uma das duas primeiras capitais do Brasil a ter lei municipal do tombamento e mecanismos de preservação no Plano Diretor – falta implementar as áreas especiais de interesse cultural.

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