Projeto de hidrelétrica ameaça fauna e flora do Rio Tibagi/PR
2005-08-18
A Hidrelétrica de Mauá, prevista para ser construída no Rio Tibagi, entre os
municípios de Telêmaco Borba e Ortigueira, ameaça alagar 5,5% de uma área
com altíssima biodiversidade no Paraná. Cientistas e ambientalistas
paranaenses denunciam que o EIA-Rima - Estudo e o Relatório de Impacto
Ambiental do projeto, elaborado pela empresa CNEC, de São Paulo, contêm
falhas técnicas e omissões a respeito da importância biológica da área a ser
alagada. O EIA-Rima é um documento exigido pelas autoridades - no caso, o
Instituto Ambiental do Paraná - para que a viabilidade ambiental do
empreendimento possa ser avaliada e a obra, autorizada.
A Hidrelétrica de Mauá está entre as elencadas como prioritárias pelo
governo federal para garantir que o abastecimento de energia continue
normal. O estudo de impacto ambiental da obra foi feito pela CNEC, que terá
seus custos ressarcidos pela empresa que vencer o leilão para a construção
da usina, caso ele seja realizado.
— Sem dúvida alguma é a área mais rica em biodiversidade do
Paraná-, diz o biólogo e coordenador institucional da Liga Ambiental, Tom
Grando. A Liga Ambiental encomendou um estudo que mostra que naquela região
da Bacia do Rio Tibagi há 747 espécies de animais. É quase a mesma
quantidade de espécies existentes na floresta atlântica, na Serra do Mar, um ecossistema que ocupa uma área seis vezes maior do que a região do Tibagi.
Grando afirma que aquele trecho da bacia do Tibagi é marcado pelo encontro
de diversos ecossistemas paranaenses, como os campos, o cerrado, a floresta
com araucárias e a mata com perobas. Por isso, em uma área relativamente
pequena, ocorre o que os cientistas chamam de megabiodiversidade. — A gente
tem nesse pequeno trecho um estoque dos ecossistemas que sumiram no Paraná.Na área vivem espécies ameaçadas de extinção no estado, como o
tamanduá-bandeira e o lobo-guará, por exemplo, e outras que só existem
naquela região, como a perereca Hyla anceps-, diz Grando.
Segundo o ambientalista, um dos problemas do EIA-Rima é justamente a omissão
em detalhar que a obra poderia causar a extinção de espécies como a Hyla anceps. Grando afirma que o estudo apenas traz uma lista dos animais
existentes na região a ser alagada, sem tecer comentários mais aprofundados
sobre eles.
— Ficamos indignados (com o EIA-Rima)-, diz a zoóloga Sirlei Bennemann,
pesquisadora de fauna aquática da UEL - Universidade Estadual de Londrina.
Ela faz parte de uma equipe da UEL que analisou o estudo de impacto
ambiental da CNEC. Segundo Sirlei, o EIA-Rima, na descrição dos impactos da
hidrelétrica sobre os peixes do Tibagi, utilizou pesquisas da UEL de forma
parcial e com erros de interpretação.
A zoóloga ainda vê outra falha grave no documento no que diz respeito aos
impactos que a barragem pode trazer para os peixes da bacia. O estudo foi
feito usando dados dos afluentes da margem esquerda do Tibagi - mais
degradados do que os da direita. Desse modo, o relatório indica que poucas
espécies seriam impactadas. Mas, na verdade, afirma Sirlei, a construção da
barragem ameaça a reprodução de diversas espécies de cascudo, de pintados,
dourados e surubins. Segundo ela, essas espécies são de correnteza. Com o
represamento do rio, ficarão impedidas de fazer a piracema. — Eles (os
peixes) vão desaparecer-, afirma. Algumas dessas espécies, como o pintado e o
surubim, podem desaparecer do estado, pois o Tibagi é o último refúgio deles
no Paraná.
— O EIA-Rima é muito fraco. Já avaliei vários estudos de impacto ambiental. Esse é o pior-, diz o botânico José Marcelo Torezan, da UEL. Segundo ele, o EIA-Rima
não traz sequer uma relação completa de quais espécies vegetais existem na
área a ser alagada. Ele também condena a escolha do Tibagi para a construção
da usina. — Se alguém me perguntasse qual é a pior área do Paraná para
construir uma hidrelétrica, eu diria que é aquela. (Gazeta do Povo/PR, 16/08/2005)