Golfinho misterioso a perigo
2005-08-09
A espécie de golfinho mais ameaçada do Atlântico Sul não é muito conhecida pelos freqüentadores do litoral. Chamada de toninha, ela dificilmente vem à superfície ou se aproxima de embarcações. Os próprios pesquisadores em geral só encontram espécimes quando eles morrem por acidente nas redes dos pescadores. A toninha (Pontoporia blainvillei) não passa de 1,70 metro de comprimento e quase nunca se exibe saltando ondas ou nadando atrás de barcos a motor como o golfinho-flíper (Tursiops truncatus) e o rotador de Fernando de Noronha (Stenella longirostris).
As únicas populações mundiais de toninha vivem nas águas litorâneas entre o Espírito Santo e o sul da Argentina. Há poucas pesquisas sobre esse mamífero marinho. O oceanógrafo Eduardo Secchi, da Fundação Universidade Federal do Rio Grande (Furg), acredita que existam cerca de 100 mil toninhas. Mas as estimativas ainda são imprecisas por causa da falta de dados. As toninhas são presas de tubarões e orcas, mas a maior ameaça contra elas vem das redes de espera de pesca. Algumas são fixas no fundo do mar, outras ficam presas entre barcos e bóias. Estendem-se por quilômetros, na rota dos cardumes e dos golfinhos que perseguem os peixes. - Cada vez há mais barcos e redes maiores -, diz Daniel Danilewicz, pesquisador do Grupo de Estudos Aquáticos do Rio Grande do Sul (Gemars). Estima-se que 2.300 toninhas morram todo ano, enroscadas nas redes. Impedidas de vir à tona para respirar, acabam se afogando. De hábitos costeiros, a toninha se alimenta de peixes pequenos, como manjubas e sardinhas. Assim, acaba circulando onde se concentram as redes dos pescadores.
Por causa disso, há grandes chances de a população entre São Paulo e Santa Catarina cair em 80% nos próximos 25 anos, afirma Secchi. No Espírito Santo, Rio de Janeiro e Rio Grande do Sul, a redução poderá chegar a 30%. Uma das soluções seria evitar a pesca em determinadas épocas do ano ou mudar os métodos de captura dos peixes. A rede de espera poderia ser substituída por uma grande linha com anzóis, o espinhel. - A toninha é seletiva. Só come peixes vivos. Não cairia nas iscas do espinhel -, explica o biólogo Salvatore Siciliano, da Fiocruz.
Siciliano é coordenador de um projeto do Ministério do Meio Ambiente para salvar a espécie. Oplano, elaborado por sete centros científicos do país, indica as prioridades de pesquisa para conhecer melhor a toninha e fornecer mais dados para preservar o animal.
-Não existe um trabalho de longo prazo para monitorar as toninhas que aparecem mortas nas praias do Espírito Santo - , afirma. Em dois anos, foram encontradas apenas seis toninhas encalhadas lá. - É pouco quando se considera que foram 150 só em um monitoramento no Rio Grande do Sul, apesar de a pesca e de a população neste Estado também serem maiores - , compara o biólogo. Por enquanto, um dos grandes inimigos da espécie é a falta de informação científica. (Época, 08/08)