MPF apura fraude dos Maiorana no Amazonas
2005-08-08
Já se passaram mais de cinco anos e apesar da gravidade das irregularidades, já comprovadas, o Ministério Público Federal e a Receita Federal ainda não chegaram a uma conclusão sobre o processo que apura a fraude na obtenção de mais de R$ 6 milhões de recursos públicos da extinta Sudam, recebidos pela empresa Tropical Indústria Alimentícia S/A, pertencentes aos irmãos Ronaldo e Rômulo Maiorana, empresários do ramo da comunicação no Estado do Amazonas.
O MPF também investiga o desvio de outros R$ 2,5 milhões - também desviados da Sudam - para financiamento de um hotel turístico-ecológico no Amazonas e que até hoje não foi erguido. O projeto do hotel, como o da Tropical, não cumpriu o objetivo especificado para a aquisição de incentivos fiscais, constituindo-se num fabuloso esquema de desvio do dinheiro público. Juntando-se os desvios nos dois projetos, os irmãos Maiorana terão que responder na Justiça pelo sumiço de cerca de R$ 6,6 milhões em recursos federais. Em dezembro de 2004, Ubiratan Cazetta, procurador responsável pelo caso, informou que o processo estava em fase de reunião de provas e que, caso comprovadas as irregularidades, o MPF ajuizaria ação judicial, pedindo o ressarcimento, em favor da União, dos valores desviados e a punição dos responsáveis. A Tropical é investigada também por desvio de finalidade do projeto.
Consultado pela reportagem, Ubiratan Cazetta mandou informar, através da Assessoria de Imprensa do MPF, que o processo ainda se encontra em fase de procedimento administrativo interno, e que ainda não havia se transformado num procedimento judicial. A RF também foi contatada pela reportagem, ontem, mas não retornou o contato feito. Em 6/7/2000, o procurador requisitou da Sudam cópia integral do processo que instruiu o pedido de implantação da empresa Tropical Indústria Alimentícia S/A, bem como informações sobre a situação do empreendimento e providências eventualmente adotadas em caso de inadimplemento. No mesmo despacho, o procurador determinava a instauração de procedimento administrativo, determinando relatório de pesquisa da Sudam à Tropical, visando apurar ocorrência de possíveis irregularidades na aplicação de recursos públicos.
Ainda em 6/7/00, Cazetta solicitou à Sudam, cópia integral do processo que instruiu o pedido de implantação do referido projeto, bem como informações sobre a situação atual do empreendimento e providências eventualmente adotadas em caso de inadimplemento. Em 14/7/00, o procurador recebeu todas as informações relativas à Tropical. Com as informações em mãos, Cazetta expede ofício a José Tostes Neto, superintendente regional da Receita Federal, toda a documentação recebida da ex-Sudam para que o órgão ficasse ciente a todos os meandros do projeto, financiado com recursos do Finam.
Notas frias e recibos falsos
No período de 1/10/1999 a 29/2/2000, a equipe de fiscalização do Departamento de Acompanhamento de Projetos da ex-Sudam informa que as obras de construção do prédio industrial da Tropical ruíram em função de um forte vendaval. O custo dessa construção, de acordo com os fiscais, alcançava R$ 3.343.185,66. Já havia sido liberado pelo Finam, na época, R$ 3.348.463, restando um saldo a liberar de R$ 6.672.537. A última parcela liberada, de R$ 1.352.735, ocorreu em 28/8/2000.
Rodrigo Chaves, engenheiro responsável pela empresa de engenharia Plangec, emitiu nove notas fiscais frias e dois recibos falsos em favor da Tropical Alimentos, no valor de R$ 4.100.000, para que fraudulentamente os irmãos Rômulo e Ronaldo Maiorana pudessem receber recursos dos cofres da ex-Sudam. Chaves acabou servindo de laranja, apesar de não ter construído nenhuma obra para o projeto da Tropical. Mesmo assim, teria sido autuado pela RF em cerca de R$ 1,5 milhão.
Chama atenção o fato de que, por muito menos, vários empresários foram denunciados pelo MPF, auditados por grupos especiais da RF e ainda responderam a inquérito na Polícia Federal, além de terem prisões decretadas, projetos cancelados, bens colocados como indisponíveis e toda a sorte de constrangimentos. Enquanto isso, a acusação contra os irmãos Ronaldo e Ronaldo Maiorana do desvio de milhões de reais da Sudam, caminha a passos largos para o esquecimento, dada a demora na apuração e elucidação dos fatos.
Sabor artificial - O desvio de finalidade do projeto foi apenas um dos artifícios utilizados pelos irmãos Maiorana para fraudar os cofres públicos. Em vez de um concentrado de frutas regionais, o produto da empresa é uma mistura gasosa de sabor artificial, tipo pet (tubaína), comercializado inicialmente como refrigerantes Bis, atualmente Fly. Na carta-consulta apresentada a Sudam em 15 de março de 1994, assinada por Ronaldo Maiorana, os sócios da Tropical pediam incentivos fiscais para um projeto de produção de alimentos oriundos do beneficiamento de frutas regionais.
Lenda amazônica no igarapé Marajá
Além de irregularidades no ramo de sucos concentrados, o empresário Rômulo Maiorana também utilizou milhões em recursos públicos da extinta Sudam para financiar um hotel turístico-ecológico-fantasma no Amazonas. Na verdade, o projeto, como o da Tropical no Pará, também não cumpriu o objetivo especificado para a aquisição de incentivos fiscais, constituindo-se na verdade em nova manobra para ter acesso ao dinheiro público. O dossiê relatando todas as irregularidades do projeto já foi encaminhado ao MPF. Ubiratan Cazetta informou ontem que o caso está sendo apurado pela Procuradoria da República do Amazonas.
Tendo como sócio Geraldo de Arruda Penteado Júnior, Rômulo Jr. pleiteou incentivos da Sudam para construir um hotel no município de Novo Airão (AM), com a razão social Parque Rio Negro Internacional Amazonas Turismo S/A. O trâmite do pedido de incentivos foi marcado por diversas irregularidades. De acordo com o projeto apresentado, o hotel seria construído a 65 km de Manaus, à margem do Rio Negro, confluência com o igarapé Marajá, e a 1.500 km de Belém. Na análise das declarações de renda de Rômulo Maiorana Jr., aparecem apenas 45% do total dos recursos que seriam necessários para o projeto. A de Geraldo Penteado não demonstrava capacidade financeira, sendo que o sócio de Rômulo, inclusive, apresentou declaração de isento.
Demonstrando habilidade e capacidade de ludibriar o poder público, Rômulo e seu sócio conseguiram que o projeto fosse aprovado em 12/3/97. Em seguida, constituíram a empresa Parque Rio Negro Internacional, com sede em Rondônia, e apresentaram como sócia majoritária a firma pertencente a eles mesmos: a Maiorana & Penteado Ltda., sediada em São Félix do Xingu (PA), da qual ambos possuíam 50%. A empresa foi dada como garantia ao projeto.
FANTASMA - Fiscalização feita por técnicos da Sudam ainda em 1999 detectou que apenas 5,5% do projeto de construção do hotel haviam sido realizados, quando o valor liberado requeria, ao menos, 30% das obras. Dos R$ 9,2 milhões dos incentivos fiscais, mais de R$ 2,5 milhões foram liberados, mas não aplicados. Nada saiu do papel. O hotel é fantasma. O turismo ecológico anunciado e as instalações do hotel se transformaram em mais uma das centenas de lendas amazônicas. A paisagem atual é de água, céu e vegetação. (Amazônia.org.br,05/08)