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2005-07-26
O Coletivo de Entidades ambientalistas do Estado de São Paulo divulgou esta semana para todo Brasil uma moção contra a impunidade dos responsáveis pela aprovação da Usina Hidrelétrica de Barra Grande, localizada na divisa do Rio Grande de Sul com Santa Catarina. O documento, que já conta com mais de 100 assinaturas de entidades ambientalistas, foi elaborado em reunião ordinária realizada no último dia 19, na sede do Sindicato dos Advogados de São Paulo, em São Paulo. O documento será encaminhado, na semana que vem, à ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, ao Ministério do Meio Ambiente e ao Departamento de Polícia Federal.

A iniciativa tem objetivo de encaminhar representação à Polícia Federal, ao solicitar investigação do caso - instaurar inquérito para apuração dos indícios de irregularidades e facilidades que viabilizaram o processo de degradação ambiental -, além de solicitar a cassação das licenças profissionais dos técnicos que elaboraram o EIA-Rima (Estudo de Impacto Ambiental/ Relatório de Impactos Ambientais), o afastamento de técnicos do Ibama (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais), responsáveis pela vistoria de campo que deveria comprovar as verdadeiras condições ambientais do local, e levantamento de todos os processos de licenciamento ambiental já aprovados e em andamento, sob responsabilidade da empresa Engevix Engenharia S/A.

Segundo o presidente do Proam - Instituto Brasileiro de Proteção Ambiental -, Carlos Bocuhy, as decisões da administração pública sobre o caso são tímidas. - É inadimissível que mais de 4 mil hectares do patrimônio nacional Mata Atlântica sejam exterminados para encher o lago da represa de uma empresa privada. A falta de coerência na aprovação da Usina Hidrelétrica de Barra Grande viabiliza crime ambiental e leva à obrigatoriedade da investigação do comportamento das pessoas nele envolvidas -, explica.

De acordo com o documento, o EIA/Rima apresentado em 2001 pelo consórcio Baesa (Energética Barra Grande S/A) - formado pelas empresas Camargo Corrêa, Votorantim, Bradesco, Alcoa e CPFL, sucessor do Geab - Grupo de Empresas Associadas de Barra Grande - mostrou falsas informações ao afirmar que a cobertura vegetal da área que ficaria embaixo dágua seria ambientalmente insignificante.A moção mostra que, baseado no documento que apresentava fraude, o Ibama, sem cumprir com exigências legais que eram de sua incumbência, emitiu a Licença Prévia (LAP) e a Licença de Instalação (LAI). Além disto, quando foi construída a barragem, o Ibama exigiu, para emitir a Licença de Operação (LAO), o Projeto de Supressão de Vegetação, no qual apurou que mais da 50% da área a ser inundada - 4.236 hectares – é composta por Mata Atlântica primária e secundária. Dados mostram que a Usina Hidrelétrica de Barra Grande formará um lago de 93,4 Km2, que inundará terras de cinco municípios de Santa Catarina (Anita Garibaldi, Cerro Negro, Campo Belo do Sul, Capão Alto e Lages) e de quatro do Rio Grande do Sul (Pinhal da Serra, Esmeralda, Vacaria e Bom Jesus).

Histórico da causa, segundo a moção
• Foi iniciada ação judicial em setembro de 2004. Na ocasião, as informações do Ibama nos autos dos processos ratificaram dano ambiental e caracterizaram falsidade no EIA/Rima, o que levou a uma decisão liminar proferida pelo magistrado da 3ª Vara Federal de Florianópolis e determinou suspensão do desmatamento.
• Em 14 de setembro de 2004, foi firmado um Termo de Compromisso (TC) entre Ibama, Baesa, Ministério de Minas e Energia, Ministério do Meio Ambiente, Advocacia-Geral da União e Ministério Público Federal, para tentar sanar as ilegalidades admitidas no próprio documento. Depois de firmado o acordo, a presidência do Ibama concedeu a Autorização de Supressão de Vegetação.
• Em novembro de 2004, os réus utilizaram argumentos legais junto à Advocacia-Geral da União, perante o TRF4, e conseguiram uma liminar para anular a decisão de suspensão de desmatamento que continua surtindo efeitos jurídicos enquanto não acontece o julgamento definitivo.
• A UFRGS – Universidade Federal do Rio Grande do Sul - emitiu laudos que revelam que a área a ser suprimida possui biodiversidade irreproduzível, que as medidas compensatórias do TC não mitigam a extinção das florestas na área a ser inundada, que no local existem 13 espécies de extinção, o que atestou a impossibilidade de representar a biodiversidade da área e compensar os impactos da supressão de uma floresta com tais características. Além disso, o TC não contempla a flora da Floresta Decidual Estacional.
Ações judiciais sobre o caso

Três ações civis públicas ajuizadas em Florianópolis requerem paralisação das atividades e do corte da Mata Atlântica. Uma ação civil pública ajuizada em Caxias do Sul-RS e remetida para Florianópolis requer suspensão dos efeitos do Termo de Compromisso, a produção antecipada de prova com vistoria da área atingida e a punição dos signatários deste TC. Em abril de 2005, uma ação cautelar de produção antecipada de provas solicitou a vistoria imparcial do local do dano e que, embora tenha sido deferida em primeiro grau, o TRF4 suspendeu a decisão. Em julho de 2005 foi ajuizado mandado de segurança para conter os efeitos da Licença de Operação que autorizou o enchimento do lago da UHE. Pelo mesmo motivo, e na mesma data, foi ajuizada outra ação cautelar na qual o juiz considerou prejudicado o pedido liminar, mas determinou que a Baesa junte aos autos, em 10 dias, relatório das providências referentes ao resgate de plantas e animais da área a ser inundada, bem como a indicação de equipe técnica para fiscalizar os trabalhos de resgate.

Abaixo, a íntegra do documento:

Moção contra a Impunidade dos responsáveis pela aprovação da Usina Hidrelétrica de Barra Grande – Divisa do Rio Grande de Sul com Santa Catarina

Considerando que a Usina Hidrelétrica de Barra Grande, situada no Rio Pelotas, formará um lago de 93,4 Km2, que inundará terras de cinco municípios de Santa Catarina (Anita Garibaldi, Cerro Negro, Campo Belo do Sul, Capão Alto e Lages) e de quatro do Rio Grande do Sul (Pinhal da Serra, Esmeralda, Vacaria e Bom Jesus);

Considerando que o EIA/RIMA apresentado pelo empreendedor, em 2001, apresentava falsas informações, afirmando que a cobertura vegetal da área que ficará embaixo dágua é ambientalmente insignificante;

Considerando que, baseado neste documento fraudulento, e sem cumprir com as exigências legais que lhe incumbiam, o IBAMA emitiu a Licença Prévia (LAP) e a Licença de Instalação (LAI) e que construída a barragem, o IBAMA exigiu, para emitir a Licença de Operação (LAO), o Projeto de Supressão de Vegetação, no qual se apurou que mais da 50% da área a ser inundada - 4.236 hectares - é composta por Mata Atlântica primária e secundária;

Considerando que o processo de licenciamento amparou-se em um EIA/RIMA fraudulento tornando nulas as licenças expedidas e que em setembro de 2004 teve início o litígio judicial, onde as informações do IBAMA nos autos dos processos ratificaram o dano ambiental e caracterizaram a falsidade do EIA/RIMA, o que levou a uma decisão liminar proferida pelo magistrado da 3a. Vara Federal de Florianópolis determinando liminarmente a suspensão do desmatamento;

Considerando que os réus, utilizando-se de argumentos legais junto à Advocacia Geral da União, em novembro de 2004, perante o TRF4, conseguiram liminarmente a suspensão da decisão supra citada que continua - até hoje - surtindo efeitos jurídicos enquanto não acontece o julgamento definitivo, o que levou a uma situação de indefinição sobre qual o foro competente para decidir sobre o caso;

Considerando que em 14 de setembro de 2004, IBAMA, BAESA, Ministério de Minas e Energia, Ministério do Meio Ambiente, Advocacia-Geral da União e Ministério Público Federal firmaram um Termo de Compromisso tentando sanar as ilegalidades admitidas no próprio documento;

Considerando que tal Termo de Compromisso apenas viabilizou um crime ambiental de impacto imprevisível amparado na irreversibilidade do investimento da BAESA – Energética Barra Grande S/A (consórcio formado pelas empresas Camargo Corrêa, Votorantim, Bradesco, Alcoa e CPFL; sucessor do GEAB - Grupo de Empresas Associadas de Barra Grande), e que após sua celebração a Presidência do IBAMA concedeu a Autorização de Supressão de Vegetação;

Considerando a adoção no TC de medidas compensatórias aleatórias para a supressão da Mata Atlântica, sem nenhuma validação científica em pareceres de técnicos das áreas de biologia, zoologia, botânica e ecologia, enquanto a UFRGS - Universidade Federal do Rio Grande do Sul emitiu laudos que revelam que a área ser suprimida possui biodiversidade irreproduzível, que as medidas compensatórias do TC não mitigam a extinção das Florestas na área a ser inundada, que no local existem 13 espécies de extinção, atestando a impossibilidade de representar a biodiversidade de uma área tão singular e compensar os impactos da supressão de uma floresta com tais características, onde o TC não contempla a flora da Floresta Decidual Estacional;

Considerando que três ações civis públicas ajuizadas em Florianópolis requerem, entre outros, a paralisação das atividades e a cessação imediata do corte da Mata Atlântica e que uma ação civil pública ajuizada em Caxias do Sul-RS foi remetida para Florianópolis porque o magistrado de lá entendeu ser o de cá o competente para decidir o caso, que uma ação civil pública ajuizada em Lages-SC só será apreciada após a manifestação do TRF 4; que uma ação civil pública requer a suspensão dos efeitos do Termo de Compromisso, a produção antecipada de prova com a vistoria da área atingida e a punição dos signatários deste TC; que em abril de 2005, uma ação cautelar de produção antecipada de provas, requereu a vistoria imparcial do local do dano e que embora tenha sido deferida em primeiro grau, o TRF4 suspendeu a decisão, que em julho de 2005 foi ajuizado mandado de segurança para conter os efeitos da Licença de Operação que autorizou o enchimento do lago da UHE, que pelo mesmo motivo - e na mesma data - foi ajuizada outra ação cautelar na qual o juiz considerou prejudicado o pedido liminar, mas determinou que a BAESA junte aos autos, em 10 dias, relatório das providências referentes ao resgate de plantas e animais da área a ser inundada; bem como a indicação de equipe técnica para fiscalizar os trabalhos de resgate;

Considerando que com as decisões omissivas da administração pública da justiça, mais de 4 mil hectares do patrimônio nacional Mata Atlântica estão sendo exterminados para encher o lago da represa de uma empresa privada, em nome do ajustamento de uma conduta já reconhecido como ineficaz, que apenas acomodou a situação de um EIA-RIMA forjado para justificar a construção da barragem, viabilizando um crime ambiental sem precedentes na atualidade, como caracterizado nos autos de todos os processos judiciais em curso; Considerando ainda a ineficácia do Poder Judiciário diante desse episódio que constitui preocupante precedente negativo contra o sistema de licenciamento ambiental brasileiro, eivada de falta de vontade de política para decidir a favor do meio ambiente, em detrimento dos interesses difusos e privilegiando uma vez mais os interesses econômicos predatórios; Considerando a estranheza do fato dos recursos interpostos pelos réus contarem com análise imediata do TRF4, com expedição de decisões liminares, enquanto os recursos das ONGs estão engavetados assim como as decisões definitivas de todos os recursos que lá tramitam;

Considerando que o caso de Barra Grande extrapola as questões técnicas levando-nos à obrigatoriedade da investigação do comportamento das pessoas nele envolvidas, da morosidade, da falta de coerência nas decisões, dos privilégios constantes em um Termo de Compromisso que permitiu a extinção do Patrimônio Nacional Mata Atlântica;

Diante desses fatos decidiu o Coletivo de Entidades Ambientalistas do Estado de São Paulo:

1 - Solicitar A CASSAÇÃO DAS LICENÇAS profissionais dos técnicos que elaboraram o EIA-RIMA, responsáveis pela afirmativa da inexistência de precioso patrimônio natural público na área do empreendimento.
2 - Solicitar O AFASTAMENTO DE TÉCNICOS DO IBAMA, À BEM DO SERVIÇO PÚBLICO, responsáveis pela vistoria de campo que deveria comprovar as verdadeiras condições ambientais e não as descritas no EIA-RIMA.
3 - Solicitar o levantamento de todos os processos de licenciamento ambiental já aprovados e em andamento em território brasileiro, sob a responsabilidade da empresa ENGEVIX Engenharia S/A.
4 - Encaminhar representação à Polícia Federal do Brasil, solicitando uma investigação exemplar do presente caso, no sentido de instauração de inquérito para apuração dos indícios de irregularidades e facilidades que viabilizaram o processo de degradação ambiental, ouvindo-se as ONGs demandantes das Ações Civis Públicas dos estados do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina.
São Paulo, 19 de julho de 2005 (Eco Agência, 25/07)

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