Perguntas amazônicas: Jorge Viana, Acre
2005-07-08
O senhor é a favor ou contra a internacionalização da Amazônia?
Primeiro, eu acho que nós devemos desmistificar esse debate sobre a internacionalização ou não da Amazônia. Acho absolutamente normal que a Amazônia, por ser o que é, por sua exuberância e imensidão verde, tenha que ser debatida no mundo inteiro. Mas eu acredito que esse mundo, que tem mudado, não vai viver essa disputa pela Amazônia. A Amazônia é brasileira e está cada vez mais sendo brasileira. A fase pior já passou, que era quando o Brasil tinha uma espécie de rejeição pela região. A Amazônia está sendo descoberta agora pelos brasileiros. Se ela já foi descoberta pelo resto do mundo, isso é coisa do passado. Nós, do Acre, nunca nos assustamos com essa tese de internacionalização, porque desde o início, com a exploração da borracha, há mais de 100 anos, nossos antepassados se relacionavam com o mercado internacional. Nós somos um estado e um povo que nascemos meio que internacionalizados. Em muitos momentos da história recente, o estrangeiro aqui na região era o capital nacional. Esse sim era ausente! E ainda hoje nós temos uma certa ausência. Note que agora, pela primeira vez, há um compromisso de um ministro da Fazenda vir ao Acre. O ministro Palocci assumiu esse compromisso comigo de visitar o Acre. Nunca, em 500 anos do Brasil, um ministro da Fazenda veio ao Acre. Mas aqui já veio o Al Gore (ex-senador e ex-vice-presidente dos EUA e candidato a presidente derrotado por George W. Bush), já veio a Danielle Miterrand e outras personalidades do mundo. Eu penso que os guardiões da Amazônia, durante muitos anos, foram os seringueiros, os índios, as populações locais. Agora, nós estamos vivenciando uma presença mais sólida do governo na região, com o Ministério do Meio Ambiente e a perspectiva de um plano de real desenvolvimento sustentável na Amazônia, como é o PAS (Programa Amazônia Sustentável). Com este plano implementado, mais as ações dos governos locais e uma ação determinada do governo federal, buscando o desenvolvimento sustentável para Amazônia, acho que acaba definitivamente com esse discurso da internacionalização. Tenho medo dele. Quanto mais a Amazônia se consolidar como uma região importante para o Brasil, mais ela fica livre desse tipo de especulação.
O que deve ser feito para salvá-la?
No fundo, nós temos que cuidar para que a Amazônia nos salve. Eu penso assim. Quem está em risco não é a Amazônia. Somos nós, o ser humano. Agora mesmo o debate no mundo é sobre água. A Amazônia é a maior fonte de água doce do planeta. Isso faz com que nós a estejamos descobrindo. Eu falo sempre que o debate está muito equivocado em relação à Amazônia. Normalmente, a discussão é sobre posses. Quem é o dono e quem deve ter ou qual o tamanho do lote na Amazônia. Se nós dividíssemos a Amazônia em lotes, fazendo uma cerca de arame farpado separando esses lotes, depois de fazer essa divisão, ainda que envolvendo milhões de pessoas, nós iríamos chegar à conclusão de que não havíamos feito nada de útil, porque o problema na Amazônia não é saber quem é o dono do pedaço - e eu não estou falando de países, posto que a Amazônia é brasileira, mas do o ponto de vista da propriedade da terra. Creio que na Amazônia o desafio é saber o que fazer com ela, como usar de forma sustentável o que está acima e abaixo da terra. É mais ou menos isso que a gente está tentando fazer no Acre, com o nosso plano de desenvolvimento sustentável, com o governo da floresta, com a idéia de não só construir a cidadania do ponto de vista da cidade, mas construir aqui a florestania.
Eu não tenho dúvidas de que a Amazônia é uma região fundamental para o Brasil e muito importante para o mundo. Penso que a Amazônia é uma vantagem comparativa para o Brasil que nenhum outro país tem, aquilo que pode fazer a diferenciação do Brasil em relação a outras nações. Agora, isso só vai acontecer quando as populações locais forem valorizadas, quando o governo brasileiro, o poder central no Brasil entender a Amazônia não como um problema, mas como a grande vantagem que nós temos. E o presidente Lula, que conhece tanto a Amazônia, é, para mim, a grande esperança de vivermos uma fase nova, deixando para trás o período em que vivemos o abandono e o esquecimento. Mas, pior do que viver abandonado, foram as políticas equivocadas implementadas pelo próprio governo no passado. Os grandes erros na Amazônia foram todos eles frutos de políticas oficiais e nós estamos pagando um preço caro pelos projetos de assentamento equivocados, pelos grandes que causaram destruição. E agora, com o presidente Lula, através do Programa Amazônia Sustentável, surge a esperança de associarmos o poder local com o poder central na defesa dos interesses da Amazônia, com a exploração do ponto de vista econômico e de soberania.
O JB Ecológico fez estas mesmas duas perguntas para governadores dos oito estados amazônicos. Infelizmente, apesar das inúmeras tentativas, não conseguimos obter resposta dos governadores de Roraima, Ottomar Pinto, de Rondônia, Ivo Narciso Cassol e de Tocantins, Marcelo Miranda. As respostas dos governadores do Amazonas, Eduardo Braga; do Maranhão, José Reinaldo Tavares; do Mato Grosso, Blairo Maggi; e do Pará, Simão Jatene também podem ser lidas nesta edição do Ambiente Já.
(JB Ecológico, 07/07)