Índios com medo de grampo param de falar no celular
2005-07-04
Os caciques tupiniquim e guarani, certos de que os seus telefones celulares estão sendo grampeados, deixaram de dar informações a respeito de suas manobras nos terrenos que retomaram da Aracruz Celulose, no norte do Estado. Dos sete caciques, cinco têm aparelhos de celular e muito das medidas tomadas e repassadas para execução foram atropeladas.
Isto levou os índios a abandonarem o telefone como instrumento de ação. Eles estão convencidos que há escutas telefônicas clandestinas para orientar a Aracruz nesse confronto.
De qualquer maneira esse receio dos caciques acabou beneficiando a empresa, já que a mídia que freqüentemente se informa sobre as atividades através dos celulares dos caciques, agora tem que se deslocar para Aracruz para obter as informações.
A comunidade indígena é apenas uma das facções que se sentem ameaçadas ao falar ao telefone. Na semana passada o desembargador Pedro Valls Feu Rosa disse que haviam escutas telefônicas no Tribunal de Justiça. Na próxima segunda-feira (4), o pleno do TJ vai escolher uma comissão para investigar o fato. As denúncias são tão sérias que foi cogitada a criação de uma CPI para investigar o caso na Assembléia Legislativa, mas depois de um acordo com o governo do Estado, o caso foi abafado.
O Espírito Santo tem 2.466 índios tupiniquins e guaranis, dados de 2004, distribuídos em sete aldeias. Eles enfrentam dificuldades, pois suas terras estão cercadas pelos eucaliptais da Aracruz Celulose. Para plantar os eucaliptos a empresa destruiu a Mata Atlântica, acabando com a vegetação e os animais que garantiam a subsistência dos índios.
As terras indígenas estão agora exauridas pela intensa exploração: o eucalipto, planta exótica, é grande consumidora de água, e acabou secando as águas dos córregos. Os índios ainda são vítimas dos agrotóxicos aplicados pela empresa nos eucaliptais.
Cansados de esperar por providências, os índios autodemarcaram no último mês de maio 11.009 hectares de terras ocupadas pela multinacional, e iniciaram a construção das aldeias - Olho DÁgua - que já tem famílias morando - e Córrego de Ouro, ainda em fase de implantação. A intenção é reflorestar o local com mudas nativas e frutíferas e contribuir para a recuperação do solo exaurido pelos eucaliptos, para que os índios finalmente fiquem protegidos em suas terras.
Ao todo, a Fundação Nacional do Índio (Funai) reconhece que os índios capixabas têm 18.070 hectares no Espírito Santo. Destes, foram demarcados apenas 7.061 hectares, por ato arbitrário do ex-ministro da Justiça, Íris Rezende (PMDB-GO), no governo Fernando Henrique Cardoso. Os índios agora esperam que o atual ministro da Justiça, Márcio Thomaz Bastos, revogue as portarias que dão direito à Aracruz ao uso das terras. Uma audiência neste sentido será realizada nos próximos dias, em Brasília. (Século Diário, 1/7)