Desmatamento continua altíssimo em 2005 e acumulado histórico é ainda maior
2005-06-30
Com base na análise dos dados do desmatamento na Amazônia entre agosto de 2004 e maio de 2005, levantados pelo Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) por meio do sistema DETER, a taxa anual pode voltar a atingir os níveis recordes registrados no período 2003-04. A estimativa foi apresentada pelos técnicos do instituto de pesquisa não-governamental Imazon, que contabilizou em 9.197 km2 a devastação no período. A projeção resultante para o ano é da ordem de 26 mil km2, taxa equivalente àquela registrada no ano passado, a maior nos últimos dez anos. De acordo com Carlos Souza, secretário-executivo do Imazon, a validação da referida projeção depende da confirmação da tendência nos meses de junho e julho, período em que tradicionalmente se concentra o maior desmatamento.
Os dados foram apresentados no âmbito do seminário técnico-científico sobre monitoramento do desmatamento, promovido pelo Inpe em São José dos Campos, que reuniu ontem e hoje os principais especialistas na geração e análise de informações sobre a alteração da cobertura vegetal. Instituições de governo e não-governamentais apresentaram estudos e avaliações de tendência, com diferentes metodologias. A ministra Marina Silva participou de toda a reunião e se declarou satisfeita pelo esforço do conjunto, alertando que agora temos de contar com a colaboração da sociedade toda para diminuir efetivamente as taxas.
O Inpe revelou no evento uma informação inédita: ao analisar os dados do desmatamento de 2003-04 pelo sistema Prodes, seus técnicos detectaram uma área de 4 mil km2 de desmatamento adicional (não contabilizado) ao longo dos últimos anos. A atribuição espaço-temporal deste desmatamento será realizada pelo Inpe até o final deste ano - de acordo com o diretor das atividades de monitoramento Gilberto Câmara - portanto, não é possível ainda saber onde e quando aconteceu.
A equipe do Sistema de Vigilância da Amazônia - vinculado à Casa Civil - trouxe alguns dados de outro sistema - o SIAD - que apresentariam algumas diferenças com os levantamentos divulgados pelo Inpe. Seus representantes mostraram apenas alguns estudos de casos específicos - ainda de forma preliminar e não oficial - como, por exemplo, sobre a região sul do Amazonas, onde o desmatamento teria atingido proporções superiores em função da inclusão de regiões de cerrado não monitoradas pelo INPE.
O Inpe também esclareceu que, a partir deste ano, o Prodes vai aumentar o número de imagens analisadas, permitindo assim a inserção de dados sobre regiões, como a maioria dos estados de Roraima e Amapá, que hoje são objeto de monitoramento de forma parcial, ou até mesmo não são monitoradas. André Lima, do Instituto Socioambiental, apresentou um estudo sobre Mato Grosso, a partir do qual foi demonstrado que o passivo de reserva legal desmatada, inclusive nas propriedades objeto de licenciamento oficial por parte do governo do Estado, aumentou expressivamente ao longo dos últimos anos, especialmente a partir do início do governo Blairo Maggi. O ICV complementou a informação descrevendo as dinâmicas do norte do estado, definido como Portal da Amazônia, uma das regiões mais críticas para desmatamento.
Ane Alencar, do Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia, caracterizou detalhadamente os diversos tipos de fronteira que contribuíram para o aumento do desmatamento nos últimos anos. A Conservação Internacional avaliou os impactos do desmatamento em flora e fauna, estimando o número de árvores cortadas apenas no ano de 2004 (com diâmetro superior a 10 cm) em um número entre 1,1 e 1,4 bilhão. Já a WWF apresentou uma avaliação alarmante sobre o desmatamento em áreas em estudo para a criação de unidades de conservação, apontando para o fato que boa parte do patrimônio que se visa proteger já foi afetado seriamente.
Roberto Smeraldi, de Amigos da Terra, solicitou a disponibilização urgente pela internet, por parte do Ibama, de todas as autorizações de desmatamento concedidas. Trata-se de uma exigência legal já existente, que o órgão não executa. - Dessa forma, a sociedade poderá monitorar e controlar, inclusive ajudando a prevenir a corrupção e cruzando os dados com aqueles do sensoriamento remoto - afirma. O secretário de Biodiversidade e Florestas do MMA, João Paulo Capobianco, prometeu que a partir do segundo semestre deste ano o governo tornará públicas as informações, alegando que até hoje falta um sistema operacional para tanto.
Capobianco também solicitou ao Inpe alterações na metodologia de levantamento, incluindo o período da estimativa (que deveria coincidir com o ano solar) e a eliminação das projeções para as áreas cobertas por nuvens, pleitos que foram questionados tecnicamente pelos técnicos envolvidos no levantamento. Para a secretária de coordenação da Amazônia, Muriel Saragoussi, é essencial a responsabilização criminal e outras formas de penalização dos autores do desmatamento ilegal, tais como o acesso a crédito, áreas nas quais avalia que o governo está avançando concretamente.
O grupo das ONGs presentes solicitou que, com base na discussão técnica a respeito do monitoramento, realizada no evento técnico-científico desta semana, o governo promova uma segunda etapa de discussão, de cunho político-econômico, focada no combate às causas principais do desmatamento e na implementação do plano de prevenção e controle. De acordo com as ONGs, - que escolheram Ane Alencar, do Instituto de Pesquisas da Amazônia, e Paulo Adário, do Greenpeace para participar de uma reunião sobre encaminhamentos na parte da tarde - é necessário evitar focar a discussão sobre prevenção nas ações do Ministério de Meio Ambiente, dando prioridade às reais causas do desmatamento, ou seja, a especulação fundiária, as atividades agropecuárias e as obras de infraestrutura geradoras de expectativas de ocupação. (Eco Agência, 29/06)