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2005-06-24
Aconteceu entre Brasília e Cuiabá um episódio que deve levar os procuradores do Ministério Público e a imprensa a refletirem sobre seus papéis na defesa da lei e dos direitos dos cidadãos.

Deu-se o seguinte:

No dia 2 de junho os esforços do procurador Mário Lúcio Avelar e da Polícia Federal resultaram no desencadeamento da Operação Curupira, destinada a capturar larápios que se haviam associado a quadrilhas de desmatadores de terras indígenas. Em poucos dias encarceraram-se 93 pessoas. O maior peixe da rede, preso a pedido do procurador, chamou-se Antônio Carlos Hummel, diretor de Florestas do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente, o Ibama. Depois de ser tratado como foragido, Hummel se apresentou à Policia Federal, em Brasília. Viajou algemado para Cuiabá. Aos 50 anos, esse engenheiro florestal com 23 de anos de serviço público, dois filhos, um apartamento de três quartos e dois carros Gol, foi transformado no seguinte:

Segundo o procurador, ele autorizou operações ilegais que levaram à comercialização de dez milhões de metros cúbicos de madeira. (Feitas as contas, noticiou-se que a quadrilha desmatou área equivalente a 52 mil campos de futebol, tirando madeira suficiente para encher 66 mil caminhões, ao valor de quase R$ 900 milhões.) Faz bem à saúde pública que o Ministério Público corra atrás da ladroeira florestal, mas havia uma questão pendente na cadeia de Cuiabá: e o que é que Hummel teve a ver com isto? A essa altura, guardado numa cela, o engenheiro chorava.

O presidente do Ibama defendeu-o e a ministra Marina Silva lembrou que não recebera o inquérito que o incriminava. — Se ela quiser eu envio para ela. Já mandei uma cópia para a PF, é só ela pedir que vai entender tudo - respondeu o doutor Avelar.

No dia 7, depois de passar quatro noites na cadeia, o engenheiro soube, pelo procurador, que seria solto. Só então iriam ouvi-lo. Com a palavra o delegado federal Tardelli Boaventura, responsável pelas investigações da Curupira: — O procurador acompanhou o interrogatório. A Polícia Federal não tinha nada contra ele. No final, o procurador concluiu que não deveria sequer ter indiciado ele.

Vai-se à internet e cadê a notícia de que Hummel foi desonerado e solto? Foi publicada aqui e ali, magra como um faquir. Jogou-se fora o trigo e mascou-se o joio. Um diretor de órgão público avançando no patrimônio da Viúva não chega a ser novidade. Sensacional é o servidor honesto ir para a cadeia e vir a saber, antes de ser ouvido, que será solto sem mais nem menos. Isso é que é notícia, como diz Hummel: — Ser direito dá cadeia.

O sujeito trabalha a vida toda naquilo que gosta, servindo ao Estado na defesa do meio ambiente. Constrói uma reputação internacional e, de uma hora para outra, está em cana, com a vida triturada. Desde a prisão de Edmond Dantés sabe-se que coisas desse tipo podem acontecer, até por acidente. Hummel não pretende ser um Conde de Monte Cristo, mas vai à Justiça para entender o que lhe aconteceu.

O engenheiro estava na cadeia enquanto a ECT do ministro Eunício Oliveira contratava como consultores diretores que demitira. Henrique Meirelles e Romero Jucá continuavam no Banco Central e no Ministério da Previdência. Ambos respondem a inquéritos no Supremo Tribunal Federal. Lula, que não sabia do men$alão, prefere mantê-los nos cargos. Já o pobre (pobre mesmo) Hummel foi preventivamente afastado da diretoria de Florestas do Ibama. (Élio Gaspari-O Globo, 22/06)

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