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2005-06-23
As ONGs, organizações não-governamentais sem fins lucrativos, desempenham importante papel na luta pela democratização e pelo desenvolvimento socioambiental e humano. Nos últimos dias, as ONGs ambientalistas tentam conscientizar a sociedade brasileira sobre os efeitos nefastos de uma nova resolução do Conama (Conselho Nacional do Meio Ambiente), previamente aprovada em maio de 2005, que ameaça as áreas de proteção permanente - APPs. Mais de 220 ONGs manifestaram sua inconformidade, por meio de uma moção de agravo ao Conama, quanto a esta regra que pretende autorizar a mineração e o desmatamento em APPs e regularizar as invasões e os loteamentos irregulares já existentes nesses locais.

A luta foi reforçada pelos representantes do Ministério Público de São Paulo, também avessos à nefasta resolução. Pretendem discutir o assunto com a ministra do Meio Ambiente e requerer o adiamento da próxima reunião do Conama, aprazada para julho de 2005. A Folha de São Paulo, em 11 de junho de 2005, traz a seguinte informação: -Segundo o Ministério Público Estadual, as APPs são essenciais à manutenção dos recursos hídricos e da biodiversidade. - Nossa intenção é suspender a edição dessa resolução e possibilitar uma discussão nacional sobre essas áreas - disse o promotor Filippe Augusto Vieira de Andrade. Para ele, é importante ouvir a comunidade científica. - As APPs são bens da humanidade e das gerações futuras (...).

O Conama, ao prestar esclarecimentos sobre o manifesto, recomendou leitura integral de todo o material afeto à proposta e entendeu como salutar a confecção do Manifesto de Agravo. Ou seja, em síntese, passou o seguinte recado: fizemos tudo às claras e com a participação de todos, inclusive de expertos em direito (citando nomes). E a resolução não vai ser modificada, porque temos poderes para colocá-la em vigor.

A comunidade planetária precisa saber que a autorização da degradação de APPs gerará impactos imensuráveis tanto quantitativa quanto qualitativamente porque atingirá todo o território nacional. Esta resolução - de cunho eminentemente econômico - irá liberar a devastação da Floresta Amazônica, já que as APPs dos grandes rios, com largura superior a 600 metros, possuem faixa de proteção correspondente a 500 metros para cada margem.

A atacada resolução pretende amparar tão-somente o interesse dos que já exploram ilegalmente as APPs e dos que pretendem consolidar a subtração de nossos recursos naturais. É sabido que o Brasil é rico em diamantes, alvo de cobiça de empresas estrangeiras, cuja extração até hoje foi impedida com base na legislação que criou as áreas de proteção permanente. Outro mineral em vista é o urânio. Portanto, todos os que se ocupam e se preocupam com a defesa do meio ambiente no Brasil e que o tratam como bem de uso comum do povo, indispensável à sobrevivência, precisam ingressar nesta luta, conhecer e compreender seus objetivos, discutir, apresentar sugestões, exigir transparência dos atos do Conama e, acima de tudo, fiscalizá-los.

A discussão nacional deve priorizar a constitucionalidade e a legalidade desta resolução. Ocorre, no caso em pauta, violação aos princípios constitucionais. Percebe-se, claramente, o conflito com a ordem social e com o ordenamento jurídico vigente. Comprova-se, com este caso, que o Estado reiteradamente se omite diante de sua responsabilidade de promover políticas públicas de caráter universal e de garantir o cumprimento da ordem jurídica. Estas tarefas estão sendo exercidas, de fato e de forma gratuita e voluntária, pelas ONGs. Infelizmente, o Sisnama - Sistema Nacional do Meio Ambiente - não está cumprindo sua função de garantir o direito difuso ao meio ambiente ecologicamente equilibrado e à sadia qualidade de vida. Ao contrário, vem tratando nosso meio ambiente como um bem negociável segundo os princípios mercadológicos, cuja gestão passou a ser submetida às regras da corrupção.

Impressiona-nos a facilidade com que se altera, nos dias de hoje, direitos resguardados e positivados em nosso ordenamento jurídico, em especial, as garantias constitucionais. Nossos direitos fundamentais são afastáveis para atender interesses de segmentos mercadológicos e/ou políticos. As mudanças na legislação vigente buscam reparar atos mal-geridos da Administração ou a conduta imperial dos mandatários da nação. Por isso, nossa Constituição Federal transformou-se em uma colcha de retalhos. Parabéns a todas as entidades que lutam pelo bom combate! A luta está apenas iniciando, mas há possibilidade de vitória. Os grupos organizados, detentores de informação e de conhecimento e com consciência de cidadania, estão aptos a exigir respeito aos seus direitos e a buscar a punição do agente público que comete crimes no exercício de sua atividade laboral, conduzindo mal a coisa pública.

*Ana Candida Echevenguá é advogada e articulista, especializada em Direito Ambiental e em Direito do Consumidor. Presidente da Academia Livre das Águas e da Ambiental Acqua Bios, nas quais desenvolve um trabalho diretamente ligado às questões socioambientais, difundindo e defendendo os direitos do cidadão à sadia qualidade de vida e ao meio ambiente ecologicamente equilibrado. A colunista escreve todas as quartas-feiras para a EcoAgência. (Eco Agência, 22/06)

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