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2005-06-20
O espaço físico onde se reuniram os participantes do evento sobre inclusão indígena – realizado pela Fundação Gaia entre 11 e 14 de junho - é um cenário parecido com o que descrevia José de Alencar em seus romances indigenistas. O Rincão Gaia consiste em um terreno de 30 hectares desapropriados para extração de basalto durante a construção da Br290. Depois disso, as prefeituras de Rio Pardo e Pântano Grande queriam transformar o local em um lixão. A propriedade caiu nas mãos do ambientalista José Lutzenberger e acabou virando um cenário mítico da sustentabilidade. Em outras palavras: ele deixou a natureza tomar conta, e com algumas técnicas paisagísticas transformou o cenário em um paraíso ecológico perdido no meio de lavouras de arroz e soja transgênica.

Construído em 1987, sua arquitetura foi baseada no protótipo de lar ideal que Lutz tinha em mente - uma aldeia indígena. O lugar tem o estilo rústico expressado nas cabanas de eucaliptos – árvore comum na região - e telhados de Santa Fé. Por lá, a cada ano passam em média dois mil visitantes, que vão em busca de aulas de educação ambiental, contato com a mãe-terra ou naturalmente, descanso. Dentre estes, a maioria são estudantes de escolas particulares que pagam uma quantia de R$ 75 por final se semana. Para a visita de escolas públicas, foram conseguidos em 2004 alguns patrocínios com o estado. O local também abriga oficinas de diversos temas programadas pela Fundação Gaia.

É de praxe para quem visita o local ver aviões descarregando soja roundoup sobre os solos vizinhos. A propriedade que fica justo em frente, que antigamente era do ecologista Arnaldo Geler, amigo de Lutzemberger, foi vendida para um latifundiário, plantador de sementes geneticamente modificadas. – É uma pena, antes a gente via o gado sendo tocado, era tão bonito, lamenta Christian Lavich Goldschimidt, funcionário da ONG.

Voltando ao cenário de Gaia: lá há viveiros com mudas para todos os gostos. Cactus, plantas carnívoras, flores-de-lótus, orquídeas, capins de citronela. Há também plantação de frutas e hortaliças, criação de gado, e touro mugindo. Boa parte dos alimentos consumidos pelos hóspedes do são todos orgânicos, colhidos na hora, fresquinhos e preparado pelas cozinheiras Liliane, Diva e Mira.

Dois grandes buracos conseqüentes das antigas escavações resultaram em lagos (um com 1 hectare e outro com 2), que além de abrigarem peixes e plantas ornamentais, suprem o consumo de água do sítio. A água de lá, segundo diagnosticaram pesquisadores da UFRGS, é mais potável que a existente no próprio lençol freático.

Os quartos dos hóspedes ficam na Casa Comunal e são comunitários. Distribuídos pelos três andares do ambiente rústico-indígenista, eles propiciam maior interação para os visitantes, que ao acordar, dão de cara com o vizinho. - Essa era a meta de Lutz, que quem passasse por aqui experimentasse um pouco do que é viver em comunidade – explica Christian. Os quartos privados são sete . De casal, há somente um. Todas as camas tem mosqueteiros no teto, daqueles feitos em tule muito comuns nas casas de campo.

Um pouco afastado da casa principal, próximo a um dos lagos, estão localizadas duas cabanas coladas uma na outra, cada uma com uma plaquinha ao lado da porta. Na da direita: Lutzenberger. Na outra, Bete, sua esposa. - Como assim? Eles dormiam separados? - pergunta a repórter. - Eles gostavam de manter a individualidade, explica Christian. Um jardim cheio de flores e um pé carregado de laranjas era a ponte física entre as moradas do casal.

Enquanto os hóspedes aproveitaram a paz e o oxigênio puro do Rincão para discutirem alternativas sócio-ambientais para salvar o planeta e os indígenas das garras do capitalismo selvagem, os únicos seres que desfrutaram impunemente as delícias proporcionadas pela natureza do local foram os cachorros Bela, Laila e Silva, um labrador, um ovelheiro e o outro cruza dos dois primeiros, que eram onipresentes na programação do evento. (Lara Ely)

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