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2005-06-15
No rastro da Operação Curupira, que desmantelou uma quadrilha que agia há 14 anos no Mato Grosso falsificando Autorizações de Transporte de Produtos Florestais (ATPFs), que resultou na prisão de mais de 90 pessoas, inclusive dirigentes do alto escalão do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama), a Polícia Federal investiga os tentáculos do bando no Pará.

O diretor-geral da Polícia Federal, delegado Paulo Lacerda, revela que um esquema de fraude semelhante ao que foi detectado no Mato Grosso para esquentar madeira extraída ilegalmente da floresta amazônica pode estar operando nos Estados do Pará, Rondônia e Amazonas. A Polícia Federal vem monitorando há meses esquemas montados por madeireiras fantasmas, que atuam na intermediação de venda de madeira retirada ilegalmente de unidades de conservação federais, de reservas indígenas ou de terras griladas no Pará.

Na Operação Curupira, a Polícia Federal apurou que a quadrilha foi responsável pela extração ilegal de um milhão e 900 mil metros cúbicos de madeira e era integrada, entre outros, por 47 servidores do Ibama no Mato Grosso, dirigentes da Fundação Estadual do Meio Ambiente, além de 42 empresários. O maior foco dos tentáculos da quadrilha que agia no Mato Grosso encontra-se atualmente na chamada Terra do Meio, entre os vales dos rios Xingu e Tapajós, com atuação em municípios localizados na área de influência das rodovias Transamazônica, como Altamira e Anapu, e da Santarém-Cuiabá, como Novo Progresso, São Félix do Xingu e em Santarém, no oeste paraense.

Há quatro meses, a Polícia Federal e o Ministério Público desmontaram, na Operação Faroeste, um esquema de fraudes no Incra, com a concessão de terras para grileiros. Um dos principais envolvidos na maracutaia agrária era o superintendente regional do Incra, Roberto Faro, o Beto da Fetagri, flagrado num grampo telefônico montado pela PF com autorização judicial negociando uma propina que seria de R$ 300 mil em troca de legalização de terras para notórios grileiros da região e do Mato Grosso. - Há pouco mais de um ano a Polícia Federal também desmontou um esquema de fraudes com ATPFs casadas - recorda Guilherme Carvalho, diretor-técnico da Associação das Indústrias Exportadores de Madeira do Pará e Amapá (Aimex), garantindo que, atualmente, apenas 20% de toda a madeira retirada no Pará se destina às exportações. - Cerca de 80% da madeira cortada na Amazônia se destinam ao mercado interno, principalmente para as regiões sul e sudeste - revela Carvalho.

Em Brasília, o delegado Paulo Lacerda não antecipa o resultado das investigações da PF no Pará. - Resta saber se é um braço da quadrilha do Mato Grosso ou se o esquema é o mesmo - afirma. Paulo Lacerda lembra também que outras quadrilhas atuam no Pará, Amazonas e Rondônia e têm mecanismos distintos de ação. - Nós preferimos centrar nossas investigações na quadrilha especializada na falsificação de ATPFs - disse.

Relatório aponta fraude
Documentos do próprio Ibama revelam que houve pelo menos um problema grave na Safra Legal de 2004, onde foram centradas as acusações de corrupção publicadas pela revista Veja envolvendo políticos do PT do Pará. No memorando interno de número 002/05, o analista ambiental Carlos Bicelli informa que fez uma investigação por amostragem nos projetos de assentamento que tiveram autorizações de desmatamento liberadas pelo órgão no ano passado. Ao todo, foram dez autorizações investigadas, sendo seis em projetos de assentamento localizados em Anapú e quatro localizados em Pacajá.

- Em todas as amostras, constatou-se a inexistência de matéria-prima (madeira) autorizada para comercialização, em virtude de a mesma já ter sido extraída - disse o analista no relatório. Tudo leva a crer que o Ibama autorizou desmatamento de áreas já devastadas para que esses documentos fossem usados para esquentar madeira retirada de áreas irregulares. O pagamento dos madeireiros teria sido feito na forma de doações para as campanhas. Uma instrução normativa do Ibama permite que o órgão autorize o desmatamento nos projetos de assentamento do Incra. O desmatamento deve ser de no máximo três hectares por lote, até o limite máximo de 20% total da propriedade. Foi essa brecha que teria sido usada para o esquema denunciado pela revista. O Ibama expedia as autorizações para áreas regularizadas, mas sem madeiras, e os trabalhadores rurais indicados por Chiquinho retiravam madeira de terras não regularizadas. Funcionários do órgão faziam vistas grossas e deixavam passar a madeira dando a impressão de que a matéria-prima tinha origem nos lotes indicados nos documentos do Ibama.

De acordo com levantamento informal de funcionários do Ibama, o esquema teria permitido o desmatamento em 2,5 mil áreas, de onde forma retirados 180 mil metros cúbicos de madeira, que somam a fortuna de R$ 180 milhões. Desse total, pelo menos R$ 2 milhões, de acordo com informações divulgadas pela revista, teriam ido parar nos cofres de políticos do PT paraense.

As denúncias de corrupção no Ibama do Pará, publicadas na revista Veja, já eram de conhecimento da ministra do Meio Ambiente, Marina Silva. Os documentos reunidos pelo Sindicato dos Reflorestadores (Sindfloresta), com a ajuda de funcionários do próprio Ibama, foram enviados a Brasília há cerca de um mês e meio com pedido de investigação. O sindicato enviou também carta ao presidente do Ibama pedindo a suspensão dos recursos para a Safra Legal de 2005, até que os fatos ocorridos em 2004 fossem apurados. Informações extra-oficiais são de que a liberação do dinheiro foi suspensa, mas não há notícias sobre as investigações da suposta fraude.

Embora admita ter enviado os documentos para o Ministério do Meio Ambiente, Ibama e alguns deputados federais da oposição, o presidente Sindifloresta, Mário Rubens Rodrigues, nega ter pago à revista pela publicação das denúncias, como acusou o deputado José Geraldo, apontado como um dos beneficiários do esquema. - No material enviado ao ministério a gente nem citava deputado. O que mostrávamos é que havia envolvimento do Chiquinho - afirma Mário, referindo-se a Francisco de Assis de Souza, amigo pessoal da missionária Dorothy Stang e candidato à Prefeitura de Anapu pelo Partido dos Trabalhadores. Além do deputado José Geraldo e de Chiquinho, a matéria de Veja denuncia Paulo Medeiros, de Uruará; e Lenir Trevisan, de Medicilândia, que é mulher do deputado José Geraldo. O esquema, segundo um representante do Sindfloresta, era intermediado pelo deputado federal José Geraldo e pelo deputado estadual Airton Faleiro, ambos ligados ao Ibama.

Rodrigues contou ontem a O LIBERAL que decidiu denunciar o caso por pressões de trabalhadores rurais da área que não tinham afinidade política com Chiquinho e que, por isso, não conseguiram autorizações de desmatamento, que eram liberadas apenas para membros do sindicato dos Trabalhadores Rurais de Anapu, entidade presidida pelo candidato.(Amazônia.org.br, 14/06)

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