Atuação do Poder Legal piora situação do lixão da Caturrita
2005-06-03
Se é possível imaginar um lugar da cidade em que condições subumanas de sobrevivência pioraram a cada dia, este lugar é o lixão da Caturrita. O desenrolar da novela que envolve catadores, prefeitura, Justiça e Brigada Militar está fora de controle. Há alguns anos, os trabalhadores, apesar da precariedade total, tinham liberdade para escolher os materiais recicláveis que iriam vender. Alguns, por falta de opção, até moravam em barracos dentro do lixão.
Hoje, o que se vê é a briga por meia dúzia de garrafas de plástico e o medo de uma ação da Brigada Militar. Os obstáculos e a ordem da Justiça - que mandou, no 16 de maio, retirar os catadores do local -, não impedem que a cena se repita inúmeras vezes por dia. Quando chega um caminhão, os catadores nem esperam o lixo ser descarregado. As sacolas são retiradas do caminhão, às vezes, em movimento. Há desespero para pegar a maior quantidade possível de materiais. Ontem, até um caminhão da prefeitura de Itaara descarregou lixo no local. Os trabalhadores têm de correr porque as patrolas logo passam para tapar o lixo com terra. O acesso, antes liberado, agora ocorre por meio das cercas arrebentadas. A estrada que passa ao lado do depósito virou uma filial do lixão. Sacos, plásticos e resíduos se espalham. Animais entram e saem livremente do lixão. - Pelo menos, do lado de fora não podem tirar a gente - diz o catador Adelino Pinto. Em reunião entre catadores e Brigada Militar, ontem à tarde, ficou definido que, por enquanto, a polícia não usará da força para retirá-los do lixão.
O horto municipal, que era uma das saídas apresentadas pela prefeitura para os catadores, não reunia mais de 10 pessoas na tarde de ontem. No horário do almoço, houve briga pela comida recebida do Conselho de Segurança Alimentar (Consea) e que foi comprada com verba do programa Fome Zero. O almoço teve de ser feito com a água escura de um buraco em que bebem animais. - Mesmo sem um real no bolso, optei por ficar no horto. Só de noite, quando o bebê pede leite, tenho de dar um jeito e, então, volto para o lixão - confessa um catador. De acordo com um dos membros do Consea, Alexander Cenci, os catadores vão continuar recebendo comida todas as terças-feiras, embora em quantidade insuficiente para alimentar a todos. (Diário de Santa Maria, 02/06)