Índios começam construção de aldeias em área retomada da Aracruz
2005-06-01
A comunidade indígena de Aracruz começou a ocupar nesta terça-feira (31/05) parte da área demarcada na semana passada, que havia sido tomada pela Aracruz Celulose, durante a ditadura militar. Os índios estão onde antes existiam as aldeias Olho Dágua e Araribá, localizadas entre os rios Sahy e Guaxandiba, no norte do Estado.
No local vai ser construído um opu - lugar dos cultos religiosos dos índios - onde no entorno serão levantadas as casas das famílias que viverão nas novas aldeias. A intenção é levar para o local todas as famílias que ali viviam antes da chegada da multinacional no Espírito Santo.
As novas aldeias serão ocupadas por famílias Tupinikim e guarani, e serão comandadas inicialmente por todos os caciques. A área onde as duas aldeias serão reconstruídas tem 2,5 hectares. Os índios acreditam que esse é o momento de união e de concretização do sonho de retorno às suas terras.
Para o cacique da aldeia tupinikim Caieiras Velha, Jaguareté, além de trazer as famílias, a intenção é iniciar as plantações de mandioca e banana. — Também já comunicamos à Visel que está proibida a sua entrada na área. Vamos providenciar os acessos que levam à região - disse. A Visel é a milícia armada da Aracruz, acusada por cometer abusos nas localidades onde atua, principalmente entre índios e quilombolas.
Os índios passaram o dia cortando eucalipto e limpando a área. Enquanto isso, as mulheres e os mais velhos abriam a palha, que mais tarde servirá para cobrir o opu e as casas.
A expectativa é de que até o fim da semana os índios já estejam passando a noite nas aldeias. Eles vão realizar rezas e danças aos seus deuses pedindo benções para a terra e uma visão de como será o futuro das aldeias.
Essa são as primeiras aldeias decididas pelos chefes Tupinikim e Guarani, sobre um território recentemente recuperado, da ordem de 11 mil hectares, todo ele coberto de eucaliptos.
A idéia dos índios é reflorestar toda a área destruída pelo uso intenso de eucalipto, unificando a área para que o povo indígena esteja, finalmente, protegido em suas terras.
O processo de autodemarcação da aldeias indígenas no Estado começou no último dia 17, e prosseguiu por cinco dias consecutivos. Os trabalhos foram intensos, feitos por 400 índios capixabas. Mas a declaração de guerra à empresa foi divulgada cerca de um mês antes, após assembléia geral do povo indígena, cuja decisão já havia sido comunicada ao ministro da Justiça, Márcio Thomaz Bastos e ao presidente da Funai, Mércio Pereira Gomes.
Os índios esperam do ministro que ele revogue as portarias assinadas pelo ex-ministro Íris Rezende (PMDB/GO), em 1998, permitindo à Aracruz o uso das terras indígenas. Íris cometeu ato arbitrário, pois contrariou estudo da Fundação Nacional do Índio (Funai). Este reconhecia com terra indígena 18.070 hectares no Estado, mas foram demarcados apenas 7.061 hectares.
Na última sexta (27/05), os índios conseguiram mais uma vitória: a justiça derrubou liminar de reintegração de posse concedida em favor da multinacional. A decisão foi do desembargador Paulo Espírito Santo, do Tribunal Superior Federal (TSF).
Esta é a terceira vez na história do Espírito Santo que os índios têm que retomar suas terras com as próprias mãos. Na sete aldeias capixabas, existem 2.466 índios, dados de 2004. (Século Diário, 31/05)