Justiça concede nova liminar suspendendo a criação de três Unidades de Conservação no Paraná
2005-06-01
Uma decisão judicial, assinada na segunda-feira 30/05
pela desembargadora federal Sílvia Goraieb, concedeu
liminar para suspender, até o julgamento do recurso,
todo e qualquer procedimento de criação das Unidades
de Conservação da região dos Campos Gerais. São elas:
Parque Nacional dos Campos Gerais, Reserva Biológica
das Araucárias e Refúgio de Vida Silvestre do Rio
Tibagi. Somadas, as três abrangem uma área de 69.525
hectares.
No dia 19 passado, a Justiça Federal de Ponta Grossa
já havia determinado a suspensão da criação das mesmas
UCs, por supostas irregularidades no processo,
sobretudo no que se refere às consultas públicas, cuja
convocação não teria observado os trâmites legais. A
ação é de autoria de duas cooperativas de produtores -
Cooperagrícola e Cooperponta.
Desta vez, o pedido de liminar foi feito por 64
moradores da região, a maior parte dos quais
trabalhadores na agricultura e na pecuária – ou em
ambos -, representados pela advogada paranaense
Samanta Pineda.
Em sua argumentação, ela coloca que os autores da ação
não foram devidamente convocados para participar da
suposta consulta pública ocorrida no Município de
Ponta Grossa em 18 de abril, ocasião em que foi
comunicada a criação das citadas
UCs.
Aos autos, foram anexados documentos demonstrando que,
por ocasião da consulta, os limites das Unidades já
haviam sido estabelecidos. Outra razão alegada por
Samanta é que não teriam sido feitos os estudos
técnicos exigidos em lei, os quais deveriam estar
disponíveis à população antes da ocorrência da
consulta pública. — Vários foram os pedidos ao Ibama
para que disponibilizasse os aludidos estudos,
inclusive pedidos judiciais, todos sem sucesso -
argumenta.
Samanta Pineda alega ainda, na ação, que, diante da
falta de conhecimento dos órgãos competentes sobre os
locais, muitos fatores relevantes para a efetividade
da proteção ambiental e para o gasto coerente do
dinheiro público foram ignorados. — Pela simples
análise das fotos aéreas pode-se perceber, por
exemplo, no Parque Nacional dos Campos Gerais, que
importantes maciços florestais foram deixados de fora
dos limites do Parque, enquanto áreas completamente
antropizadas e cultivadas foram incluídas. As bacias
hidrográficas também não foram consideradas - diz um
trecho.
A falta da participação da população local na
delimitação das UCs, na Região Sul do país, vem
provocando revolta dos setores ligados ao agronegócio e acusações ao Ministério do Meio
Ambiente. No Paraná, representantes de mais de 25
municípios subscreveram um documento, enviado à
ministra Marina Silva, manifestando o desejo de que fossem abertos novos canais de diálogo no processo de
implantação das UCs. Entre os prefeitos que assinaram
a solicitação estão os de Ponta Grossa, Imbituva,
Teixeira Soares, Palmeira, Carambeí, Ipiranga e
Castro, além da Associação dos Municípios dos Campos
Gerais, que representa mais dezenove cidades da
região.
Enquanto isso, os ambientalistas lamentam o atraso na
implantação das UCs, temerosos de que ele possa
resultar em danos às áreas propostas. — Essa decisão
vai dar o tempo necessário para que tudo seja
aniquilado de forma irreversível - prevê Lídia
Lucaski, presidente da ONG Associação de Defesa do
Meio Ambiente de Araucária – AMAR. Para ela, a notícia
de mais uma decisão judicial favorável aos produtores
da região, é frustrante e grave.
Para a advogada Samanta Pineda, esse receio de que as
propriedades sejam destruídas ou desmatadas na
tentativa de descaracterizar as áreas passíveis de
proteção não se justifica. — A lei disponibiliza
instrumentos adequados para que tal conduta seja
evitada e, nos Campos Gerais, existem proprietários
que estão há sete gerações na terra - diz ela, para
quem aquela região é um exemplo de desenvolvimento
sustentável, por concentrar o maior índice de
reservas legais averbadas e as áreas de preservação
permanente mais íntegras do país.
Lídia Lucaski esteve presente na consulta pública
realizada em Ponta Grossa e discorda que os
esclarecimentos por parte do Ibama tenham sido
insuficientes – um dos argumentos da ação judicial.
— Havia só uma meia dúzia de proprietários indignados.
A maioria da população não tem ganância desmedida -
analisa a ambientalista, advertindo que o ser humano
está cavando a própria sepultura. — A cada bioma que é
aniquilado, nós morremos também.
— Só o que está se pleiteando é diálogo - alega Samanta
Pineda, lembrando que a liminar pede a suspensão do
processo até que sejam realizadas novas consultas
públicas e disponibilizados os estudos técnicos
pertinentes.
O biólogo Maurício Savi,
coordenador da força-tarefa criada pelo Ministério do
Meio Ambiente para definir onde deveriam ser
implantadas as UCs de proteção às araucárias, disse
que ainda não tinha conhecimento da decisão judicial.
— Quando as coisas forem esclarecidas, inclusive com
provas documentais, não tenho dúvidas de que essa
decisão será revertida - afirmou.
A procuradora do Ibama no Paraná, Andréa Vulcanis, não
havia sido notificada ainda e antecipou que estaria entrando com o recurso
contra a liminar anterior, também suspendendo a
criação das UCs da região dos Campos Gerais, concedida
pela Justiça Federal de Ponta Grossa no dia 19/05
passado. Segundo ela, toda a documentação referente
aos processos está sendo compilada, o que demanda
algum tempo, diante do volume de informações. — São
mais de 1500 páginas.
A reportagem tentou ouvir também o secretário de
Biodiversidade e Florestas do Ministério do Meio
Ambiente, João Paulo Capobianco, mas ele passou a
tarde em reuniões no Palácio do Planalto. No início
deste mês, ao ser indagado sobre a possibilidade de
que os setores produtivos das UCs e de seu entorno
apelassem para a Justiça, Capobianco não se abalou.
— Medida judicial é um direito de todos. Estamos
seguros do que estamos fazendo - disse então.
(Ambiente Brasil, 31/05/2005)