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2005-05-27
A repórter Sue Branford, da BBC News, esteve na Amazônia na semana passada, após ter visitado a região há 30 anos. Ela fez um relato do desmatamento, que chamou de apetite pela destruição da floresta. Leia a reportagem.

No início deste mês, o governo brasileiro anunciou que quase um quinto de toda a Amazônia estavam devastados pelo desflorestamento. É uma estranha sensação voltar a um lugar que você não visita há 30 anos. E mais estranho ainda é quando tudo mudou e está fora de reconhecimento.

Eu estive pela primeira vez na Amazônia em 1974. Naquele tempo, era uma verdadeira floresta selvagem. Os generais que então dirigiam o Brasil haviam decidido, no que mais tarde se provou ser tão perigoso quanto simples, que a bacia da floresta amazônica era vazia. As árvores eram tão altas que, para abraçá-las, eram necessários uns dez homens com os braços esticados, em círculos ao redor de seus troncos. Eles então diziam que era tempo de ocupar a região. Assim, construíram uma rede de estradas que encorajaram os cortadores de árvores e criadores de gado a mudarem-se para lá. Assim era em 1974, em uma de minhas primeiras matérias jornalísticas.

Em 2004, 26 mil quilômetros quadrados de florestas foram destruídos na Amazônia. A beleza daquela floresta era de tirar o fôlego. Havia tartarugas ao sol e uma areia branca delineava os rios locais. Mas, ao longo dessa beleza natural, estava o conflito humano.

Quando os madeireiros e criadores de gado chegaram, encontraram famílias de camponeses vivendo em partes da floresta. Também havia pescadores, coletadores de castanha e caçadores. As empresas de exploração de madeira e de criação extensiva de gado, no entanto, enviaram homens armados para lidar com os nativos.

Dia após dia, eu encontrei camponeses traumatizados por terem sido ameaçados de expulsão. Durante dias, eu viajei em um caminhão ao longo de estradas em meia pista. Numa tarde, após horas de circulação pela densa floresta, paramos em uma pequena vila. Chamava-se Redenção. Lá, havia até um italiano excêntrico que trouxe uma máquina de fazer sorvetes para essa remota região. A máquina funcionava com diesel. Vimos seis ou sete homens com apareência rude e revólveres na cintura. Segundo o italiano, toda semana havia morte no local. Poucos minutos depois, ouviu-se um tiro. Vi um homem esticado a umas 20 jardas do bar. Eu tentei ir até ele, mas o motorista do caminhão me disse: –Não, vamos embora!

Destruição

Hoje, a demanda por alimentos está levando a uma destruição da floresta, que desaparece, exceto em poucos fragmentos. Em seu lugar existe gado e cada vez mais plantações de soja, que é exportada para a fabricação de ração. A cidade agora tem 80 mil habitantes. Conta com rodovias pavimentadas, eletricidade, cinemas, lojas, escolas e hospitais. O italiano fechou seu bar e foi embora há alguns anos.

Sonho brasileiro

Mais pessoas ainda estão chegando a Redentora. Estão guiadas pelo sonho brasileiro de construir uma nova vida em uma fronteira agrícola. Mas isto sempre acaba em desatre. Eu falei com Regivaldo, de 22 anos, que veio até a região guiado pela promessa de um alto salário para viajar pela floresta a fim de cultivar a terra para um fazendeiro. Mas ele e outros ficaram à deriva, sem alimentação nem acomodações adequadas por mais de seis meses.Eventualmente, ele conseguiu escapar para consertar uma canoa furada. E agora ele e outros estão processando o dono das terras por violarem a legislação trabalhista, algo que não acontecia há 30 anos. Pressão econômica

Pela destruição da floresta tropical, estamos acelerando o aquecimento global e desequilibrando o clima mundial. Como lidar com a transformação extraordinária dessa região? Eu tenho sentimentos mistos. Simpatizo com muitos brasileiros que buscam uma vida melhor, mas temo o desaparecimento da floresta. A cada ano, aprendemos mais sobre a importância da floresta amazônica. Sabemos que a sua destruição acelerará o aquecimento global. No entanto, no mundo desenvolvido, continua-se comendo mais e mais alimentos. E isto encoraja o Brasil a plantar mais soja e a criar mais gado. Não faz sentido deixar as forças de mercado destruírem esse precioso ecossistema de que todos precisamos para a nossa sobrevivência. (BBC, 26/5)

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