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2005-05-24
A maior empresa privada do setor elétrico brasileiro, a Tractebel Energia, subsidiária da Suez-Tractebel, com sede em Bruxelas, Bélgica, integrante do poderoso Grupo Suez, sediado na França, deu mais uma mostra da maneira como trata as populações atingidas pelas usinas hidrelétricas que constrói no Brasil. Na última semana, a Tractebel anunciou a captação de R$ 200 milhões de reais no mercado financeiro para pagar com antecipação um empréstimo tomado junto ao Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) em dezembro de 2000, para construir a Barragem de Cana Brava em Goiás.

Essa Usina, em operação há três anos, expulsou 986 famílias de suas terras. A maioria sem nenhuma reparação até hoje. Segundo informações do Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB), as poucas indenizações distribuídas giravam em torno de cinco mil reais, mas há casos de indenizações de 500 reais e até de 39 reais. Com o enchimento do lago, várias comunidades de agricultores ficaram isoladas, sem escola ou acesso a saúde. A alternativa oferecida pela Tractebel para algumas famílias foi relocamento para as casas da vila dos operários que haviam construído, anos antes, a barragem de Serra da Mesa, próximo a região de Cana Brava, sem que houvesse as mínimas condições de trabalho e sobrevivência para os agricultores nesse local. Inúmeras famílias de pescadores e mineradores que viviam do rio, também ficaram inviabilizados pela barragem, sem receber reparação alguma.

Diante da gravidade da situação e da pressão de diversos grupos da sociedade civil sobre o BID, este banco decidiu abrir um processo de verificação junto à obra de Cana Brava, para avaliar se suas diretrizes de responsabilidade social haviam sido cumpridas pela Tractebel. Três relatórios foram feitos por comissões independentes contratadas pelo BID, e um painel de inspeção está atuando no momento. Todas elas constataram as arbitrariedades da Tractebel no trato da população atingida. A última verificação concluída, uma auditoria social, verificou a situação de cada atingido e listou, nome por nome, todas as famílias que deveriam ter sido reassentadas e não o foram.

Esse processo de verificação do BID resultou num constrangimento à Tractebel, já que a obra foi construída com recursos do banco. No entanto, ao invés de resolver os problemas em Cana Brava, a Tractebel prefere fazer nova dívida com outras instituições financeiras e saldar a conta com o BID, para com isso, ao menos, desfazer-se de qualquer compromisso com o Banco nesse caso.

Segundo Agenor da Costa, integrante da coordenação do MAB em Cana Brava, essa prática revela a total irresponsabilidade e desrespeito da Tractebel com a população atingida. — Até o Banco que financiou a obra reconheceu os problemas causados pela Tractebel em Cana Brava, mesmo assim, a multinacional se recusa a resolver os problemas - denuncia o dirigente. Segundo Agenor, a situação em Cana Brava é de fome e desespero. — As famílias perderam tudo que tinham, não tem mais terras para plantar e não há trabalho na região - destaca.

Para o Movimento dos Atingidos por Barragens, o que ocorre em Cana Brava é uma queda-de-braço entre as populações atingidas e a multinacional que não quer abrir precedente para as barragens que pretende construir no futuro. — As empresas construtoras estão acostumadas a construir hidrelétricas e contabilizar apenas o custo para erguer o muro e instalar as turbinas. À população atingida resta a polícia para realizar os despejos. A Tractebel quer que continue assim, por isso não quer ter mais custos nos investimentos que pretende fazer no país - revela Gilberto Cervinski, da coordenação nacional do MAB em Brasília.

Para Cervinski, a situação em Cana Brava demonstra a falência do modelo energético brasileiro e a incapacidade do judiciário e dos órgãos públicos responsáveis pelo licenciamento em garantir os direitos mínimos do povo que está perdendo tudo por conta das barragens. — O MAB há dois anos pede a intervenção do Governo Federal e do Ministério das Minas e Energia para que este exija da Tractebel a solução dos problemas em Cana Brava. Mas o governo tem feito vista-grossa, com medo de afugentar investidores, finaliza Cervinski. (MAB - Movimento dos Atingidos por Barragens/Eco Finanças, 23/05/2005)

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