Demarcação tira terra de gaúchos
2005-04-27
Agricultores gaúchos que desbravaram o extremo norte do país duas décadas atrás estão no centro da conturbada demarcação da reserva indígena Raposa/Serra do Sol, em Roraima. Com 1,7 milhão de hectares contínuos, a área foi homologada na semana passada pelo governo federal, convulsionando o Estado nortista. Entre os maiores prejudicados estão os arrozeiros com lavouras no interior da reserva. Cerca de 90% deles são do Rio Grande do Sul.
Produtores como Ivalcir Centenaro, 50 anos, estão dispostos a resistir à determinação de deixar as terras no prazo de um ano. Natural de Frederico Westphalen, onde possuía uma pequena propriedade, ele se transferiu para Roraima em 1980, incentivado pelo governo local. Seus 1,6 mil hectares, que com os investimentos realizados avalia em R$ 15 milhões, estão integralmente na área demarcada para os índios.
– O clima aqui está muito perigoso. Saímos do Rio Grande, fizemos o nome dos gaúchos aqui e agora querem nos tirar tudo. Não vamos recomeçar a vida aos 50 anos. Vamos morrer dentro de nossas terras, resistindo até a última gota de sangue - desafia.
Presidente da Associação dos Arrozeiros de Roraima, o gaúcho de Erechim Luiz Afonso Faccio, 62 anos, argumenta que 70% dos 20 mil hectares com lavouras de arroz no Estado situam-se dentro da área demarcada.
– Não existem áreas próximas para onde possamos ir. A demarcação foi um ato covarde e traiçoeiro, que colocou o Estado em pé de guerra - afirma o gaúcho, que não acredita nas indenizações prometidas.
Os arrozeiros argumentam que a homologação da área indígena produzirá um baque na economia de Roraima. Essa visão é compartilhada por integrantes do governo e da sociedade local, que têm se unido aos protestos. A produção de arroz corresponderia hoje a 11% do PIB do Estado. Além disso, a rizicultura geraria mil empregos diretos e 6 mil indiretos. Os fazendeiros querem que as áreas em que há lavouras - cerca de 100 mil hectares - sejam excluídas da reserva indígena.
Exército coloca mil homens de prontidão
A pedido do Ministério da Justiça, o Exército colocou mil homens de prontidão para uma eventual ação de emergência em Roraima. O Estado é palco de tensões causadas entre índios, arrozeiros e políticos em decorrência da homologação da terra indígena Raposa Serra do Sol em 15 de abril.
O prefeito de Pacaraima (RR), o gaúcho Paulo César Quartiero, pediu audiência com o presidente da Venezuela, Hugo Chávez, para tratar da demarcação das terras indígenas no Brasil.
Um dos maiores produtores de Roraima, Quartiero comanda um município que perderá parte de sua área para a reserva. Ele recorreu ao alcaide da vizinha Santa Elena de Uiarén, do outro lado da fronteira, para marcar o encontro.
Na segunda-feira, o gaúcho reuniu-se com o cônsul da Venezuela em Boa Vista. O objetivo de Quartiero é internacionalizar a questão. Na visita que Chávez fará Santa Elena de Uiarén no dia 30, pretende convencê-lo de que o despovoamento da fronteira no lado brasileiro aumenta a vulnerabilidade venezuelana. (ZH 27/04)