Comportas da UHE Barra Grande podem ser fechadas nos próximos dias
2005-04-13
As comportas da Usina Hidrelétrica de Barra Grande, localizada entre os
municípios de Anita Garibaldi (SC) e Pinhal da Serra (RS), podem ser
fechadas nos próximos dias. Na sexta-feira (8 de abril), os
representantes da Energética Barra Grande S.A. (Baesa), empresa responsável
pela obra, estiveram reunidos, em Brasília, com a presidência do Instituto
Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) e
devem pedir a Licença de Operação (LO) para o empreendimento. Caso a
autorização seja concedida, o reservatório da barragem começará a encher e
vários hectares de floresta primária (ainda intocada) com araucárias,
espécie ameaçada de extinção e protegida por lei, podem ficar debaixo
dágua.
O caso Barra Grande é o maior escândalo ambiental dos últimos anos. A
construção da usina foi autorizada como base num Estudo de Impacto Ambiental
(EIA-Rima) fraudulento, que omitiu a existência de mais de 4 mil hectares de
Mata Atlântica íntegra ou em avançado processo de recuperação, bioma que
praticamente não existe mais no País. A firma responsável e o próprio
governo admitem a fraude. Há pouco mais de uma semana, foi anunciada a
aplicação de uma multa ambiental de R$ 10 milhões à Engevix, responsável técnica
pela elaboração do EIA-Rima. Vale lembrar que a Baesa é um consórcio formado
por algumas das maiores corporações do Brasil: a Alcoa, a CPFL Energia, a
Votorantim e a Camargo Corrêa, entre outras – muitas delas respeitadas não
só por seu patrimônio ou volume de investimentos, mas também por projetos e
iniciativas na área da responsabilidade social.
Mesmo sabendo da fraude e da possibilidade de destruição definitiva de áreas
extremamente importantes para a conservação, o Ibama e a Advocacia Geral da
União (AGU) assinaram com a Baesa um Termo de Compromisso para, mediante
algumas medidas compensatórias, autorizar o início do desmatamento. Aí
teve início a batalha judicial envolvendo o caso.
Em outubro de 2004, a Justiça Federal de Santa Catarina concedeu uma liminar
em Ação Civil Pública movida pela Rede de ONGs da Mata Atlântica (RMA) e
pela Federação das Entidades Ecologistas Catarinenses (FEEC), com apoio de
advogados do ISA e da organização Ações para Preservação dos Recursos
Naturais e Desenvolvimento Econômico Racional (Aprender), o que suspendeu o
início do corte das árvores. Posteriormente, o Tribunal Regional Federal (TRF) da 4ª Região voltou atrás
e suspendeu a liminar, abrindo caminho para que a Baesa desse início ao
desmatamento, que vem ocorrendo, desde janeiro, dia e noite, enquanto a
sociedade aguarda uma decisão de mérito da Justiça Federal de Santa
Catarina, a última esperança de que o Judiciário evite a concretização desse
crime ambiental.
A Baesa alega que o desmate foi concluído, mas a coordenadora-geral da RMA e
presidente da Associação de Preservação do Meio Ambiente do Vale do Rio
Itajaí (Apremavi), de Santa Catarina, Miriam Prochnow, afirma que existem
relatos confirmando que principalmente as florestas primárias ainda estão de
pé e que a empresa não iria mais desmatá-las. Miriam alerta para o fato de
que, caso a informação seja confirmada, além da perda da floresta, haverá
impactos para a qualidade da água do lago com o apodrecimento da matéria
orgânica que ficar submersa.
Mas o desmate é apenas uma de muitas obrigações que podem não estar sendo
cumpridas pela Baesa.
Pelo Termo de Compromisso assinado, a empresa ficou obrigada a criar um
banco de sementes de araucárias e de outras árvores raras que seriam
derrubadas, para que pudessem ser eventualmente aproveitadas no futuro.
Comprometeu-se também, antes de fechar as comportas, a comprar uma área de
tamanho equivalente a que será desmatada e inundada, para destinar à
conservação. Todas são condições estabelecidas no acordo para que a Licença
de Operação possa ser emitida.
— Nada foi feito em relação às áreas que deveriam ser disponibilizadas para conservação e nem em relação ao banco de germoplasma, afirma Míriam. Ela
lembra ainda que o Planejamento para o Aproveitamento Hidrelétrico e
Ambiental da Bacia do Rio Pelotas, estudo que deveria prever outros impactos
provocados por mais obras na região, também não foi elaborado pela Baesa.
No dia 7 de abril, a agência de notícias Canal Energia publicou uma nota
que afirma que o diretor-presidente da Baesa, Carlos Miranda — espera
receber a LO nos próximos dias. Segue o texto: — O último obstáculo para a
obtenção da licença era a supressão de vegetação, que foi concluída no
último sábado, dia 2. Segundo Miranda, — o enchimento de até 95% da capacidade
de armazenamento deve durar 11 meses, embora os testes de produção estejam
previstos para começar em agosto. Com isso, a geração comercial começaria em
1° de novembro, com a entrada em operação da primeira unidade. As outras
duas máquinas entrarão em funcionamento em 1° de fevereiro e 1° de maio de
2006.
Enquanto a Baesa corre contra o tempo, o Judiciário se delonga em análises
contraditórias. Espera-se que faça valer a lei antes que tudo seja
derrubado, porque, depois, a natureza é morta. (ISA/Envolverde, 08/04)