Exército teme cobiça de forças estrangeira na Amazônia
2005-04-11
Narcotraficantes, madeireiros, garimpeiros, grileiros e
guerrilheiros. O Exército brasileiro tem muito trabalho na Amazônia, uma região maior do que a Europa Ocidental, com 11 mil quilômetros de fronteiras
porosas com sete países.
Mas a principal preocupação dos estrategistas brasileiros é de que um dia
eles tenham de enfrentar uma potência estrangeira pelo controle da Amazônia.
— As ameaças hoje são diversas. Não existe uma ameaça como no passado, quando
existia a Guerra Fria. Antigamente existia a ameaça do comunismo, disse o
general Cláudio Barbosa de Figueiredo, comandante do Exército para a
Amazônia.
Segundo o general, para o estudo da defesa da Amazônia, considera-se: — um
poder militar superior ao nosso, e nós já temos a estratégia para resolver. Além disso, afirmou, — outra grande ameaça que nós consideramos é o vazio de
poder.
Desde o fim do regime militar (1964-85), a defesa da Amazônia se tornou
prioridade para o Exército brasileiro. Nos últimos anos, o país reforçou seu
contingente na região para 22 mil soldados e planeja ter 26 mil até o final
de 2006, segundo Figueiredo.
Cerca de 25 pelotões especiais de fronteira, com cerca de 70 homens cada,
estão em posições remotas da região. A área é coberta pelo Sivam (Sistema
Integrado de Vigilância da Amazônia), uma rede de radares, computadores e
aviões que observa pistas de pouso clandestinas, incursões e danos
ambientais.
A ameaça que passa pela cabeça de muitos brasileiros é de que estrangeiros
cobicem a Amazônia, um temor que se agrava sempre que um político de fora
fala sobre a floresta e suas águas como um recurso internacional. O
ex-comissário do Comércio da União Européia Pascal Lamy, atualmente
candidato a chefia a Organização Mundial do Comércio (OMC), chegou a propor
em fevereiro que a Amazônia deveria ser administrada pela comunidade
internacional, uma proposta que provocou reação do governo brasileiro.
Em novembro, o Brasil montou um grande exercício militar na Amazônia, a
Operação Ajuricaba, da qual participaram 3.000 homens, 35 aviões e 170
barcos. O inimigo era uma força estrangeira.
— As Forças Armadas brasileiras, que fazem planos para uma hipotética guerra
na Amazônia, prevêem que a região se transforme em um novo Vietnã, escreveu
o jornal Correio Braziliense. Diplomatas também citaram com interesse o fato
de que o Vietnã acaba de nomear um adido militar para sua embaixada em
Brasília.
Preocupação com potências estrangeiras
A guerra entre a guerrilha comunista Farc (Forças Armadas Revolucionárias da
Colômbia) e o governo da Colômbia, que se agravou devido ao Plano Colômbia,
patrocinado pelos EUA, sempre pode se espalhar para o Brasil.
Traficantes da Colômbia, do Peru e da Bolívia exportam sua mercadoria para
os consumidores das cidades brasileiras e como escala na venda para a
Europa. Imigrantes cruzam clandestinamente a fronteira com a Bolívia, e
madeireiros peruanos devastam a selva.
No interior da região, a extração ilegal de madeira e a exploração das
terras leva a uma destruição alarmante - uma área do tamanho de Sergipe foi
devastada no ano passado. As disputas fundiárias levam a frequentes
derramamentos de sangue.
Figueiredo, um homem educado, de cabelos grisalhos, disse que não houve
confrontos recentes na fronteira com a Colômbia e acredita que a situação
está controlada. — Logicamente estamos atentos para a divisa colombiana, mas
nós entendemos que elas (as Farc) não querem abrir mais uma frente de
combate.
Ele disse que, em algumas esferas, o principal papel do Exército é apoiar as
autoridades civis. — Na questão das drogas, que é missão da Polícia Federal,
apuramos junto com eles dentro da nossa margem. A mesma coisa fazemos com o
Ibama para que eles possam deter essas madeireiras ilegais. Fornecemos apoio
logístico, alimentação e segurança.
Os Estados Unidos querem que os Exércitos latino-americanos se envolvam mais
na guerra às drogas. Mas na América Latina, que passou por tantos regimes
militares, é delicado discutir até que ponto militares podem substituir a
polícia.
Da mesma forma, Washington quer que os soldados se empenhem mais no combate
ao terrorismo. Mas, em um encontro de ministros da Defesa das Américas,
ocorrido em novembro em Manaus, o vice-presidente e ministro da Defesa do
Brasil, José Alencar, disse ao norte-americano Donald Rumsfeld que combater
a pobreza é uma prioridade mais importante.
— Não temos terrorismo aqui e nem na nossa fronteira. Os norte-americanos
consideram tráfico como terrorismo, mas eles fazem o terrorismo deles lá
dentro da Colômbia, afirmou Figueiredo à Reuters.
Questionado sobre a internacionalização da Amazônia, Figueiredo disse: — Isso
pode ser uma preocupação que nos leva a estratégias de defesa, não só dos
Estados Unidos, mas também da Europa. Devemos estar precavidos.
Um porta-voz do Comando Sul dos EUA, que abrange a América Latina, disse que
o Brasil tem todo direito de planejar a defesa do seu território, mas que os
Estados Unidos não representam uma ameaça.
— Acho seguro dizer no Comando Sul que não mantemos planos de contingência
para nada que tenha a ver com o Brasil, disse o tenente-coronel David
McWilliams, por telefone, de Miami. A relação entre os militares dos dois
países é excelente, segundo ele.
Eduardo Gamarra, diretor de Estudos Latino-Americanos na Universidade
Internacional da Flórida, disse também que a cooperação militar entre os
dois países é provavelmente a maior em vários anos. Mas admite que — estamos
ouvindo rumores de que os EUA vão ocupar a Amazônia por causa da água, para
conter as drogas.
David Cleary, da entidade ambientalista Nature Conservancy, em Belém,
afirmou que os militares acreditam genuinamente que há uma ameaça e que ela
é principalmente norte-americana. — A ameaça do dia-a-dia vem da Colômbia e
do Peru, não dos EUA, afirmou.(Reuters, 10/04)