Os 12 erros da transposição
2005-04-08
O professor João Suassuna, da Fundação Joaquim Nabuco, especialista em Recursos Hídricos e Desenvolvimento do Semi-Árido/Recife, relacionou os 12 principais erros que o governo federal tem que reavaliar para o aperfeiçoamento do projeto da transposição:
1 - Priorizar a transposição e deixar a revitalização em segundo plano:
- Para a transposição foi alocado cerca de R$ 1 bilhão no orçamento da união, em 2005;
- Para a revitalização da bacia apenas R$ 100 milhões.
2 - Considerar o rio São Francisco como pertencente à bacia amazônica:
- O rio é hidrologicamente pobre;
- Vazão média de 2.800 m³/s;
- O Tocantins, com a mesma área de bacia, possui uma vazão média de 11.800 m³/s;
- 60% da bacia com clima semi-árido e geologia cristalina;
- No semi-árido seus afluentes são temporários.
3 - Considerar insignificante o volume a ser retirado do rio (cerca de 1% da água que joga no mar):
- O cálculo deve que ser feito levando-se em consideração a vazão alocável de 360 m³/s e não a vazão média do rio de 2.800 m³/s;
- Considerando a vazão alocável e os usos existentes, a retirada de 127m³/s pode significar 47% do saldo atual para consumo.
4 - Considerar como possível o uso das águas da represa de Sobradinho para satisfazer o volume máximo requerido no projeto, de 127 m³/s:
- Sobradinho atinge 94% de sua capacidade em 40% dos casos, ou seja, a cada 10 anos a represa fica cheia apenas quatro;
- A represa verteu em 1997 e voltou a verter em 2004.
5 - Não levar em consideração que é um rio de múltiplos usos:
- Aplicados cerca de US$ 13 bilhões no setor elétrico;
- Crescimento da área irrigada em cerca de 4% ao ano;
- Navegabilidade prejudicada em vários trechos pelos assoreamentos.
6 - Não-observância dos conflitos existentes nos usos das águas para irrigação e geração de energia:
- Necessidade de racionar energia em 2001;
- Alternativas energéticas ainda não muito convincentes (termelétricas).
7 - Ter permitido a participação do consórcio internacional Jaakko PÖyry-Tahal no estudo de impactos ambientais:
- Finlândia e Israel são países muito diferentes do Brasil;
- Dos 49 vetores de risco analisados, 38 apresentaram riscos importantes ao ambiente e, mesmo assim, o projeto foi considerado ambientalmente viável;
- Já foram aplicados nesse estudo cerca de R$ 70 milhões.
8 - O não atendimento do abastecimento difuso
- Importância das cisternas e demais fontes hídricas existentes (açudes, barragens subterrâneas e poços).
9 - As águas serão transportadas para regiões do Nordeste, onde já são abundantes
- Castanhão (CE) - 6,7 bilhões m³;
- Armando Ribeiro Gonçalves (RN) - 2,4 bilhões m³;
- As regiões do Seridó (RN) e Inhamuns (CE) não serão beneficiadas pelo projeto.
10 - Não se levou em consideração o custo elevado da água nos estados receptores
- Custo foi estimado em R$ 0,11 o m³ (sem contar com os custos dos bombeamentos até as propriedades);
- A Codevasf fornece água aos seus projetos a um custo de R$ 0,023 o m³.
11 - O desconhecimento do potencial hídrico existente na região
- Volume represado estimado em cerca de 37 bilhões de m³;
- Metade desse volume encontra-se no Ceará (18 bilhões de m³);
- As descargas dos rios nordestinos representam uma infiltração nos aquíferos (lençóis subterrâneos de água doce) de cerca de 58 bilhões de m³ por ano.
12 - O péssimo relacionamento entre o Governo Federal e o Comitê da Bacia Hidrográfica do Rio São Francisco
- A reunião de Juazeiro (BA) - O Plano Decenal da bacia;
- O pedido de vistas ao processo;
- A reunião de Salvador e suas conseqüências;
- Elaboração de Manifesto ao País.
Sugestão final:
A natureza complexa do ambiente nordestino sinaliza para a necessidade de estudos integrados e abrangentes que visem ao melhor aproveitamento de sua água para promoção do desenvolvimento regional. É importante, em primeiro lugar, a execução de projetos hidráulicos estruturadores, partindo-se das bacias receptoras de jusante (estados receptores) para a bacia exportadora de montante (bacia do São Francisco). Isto pode ser feito através do uso integrado do potencial hídrico existente em cada um dos estados da região, da otimização das disponibilidades de água e da confirmação de demandas. O objetivo é assegurar que a transposição do São Francisco constitua uma alternativa complementar e não implique no abandono ou mesmo na subutilização de fontes locais de água, garantindo intervenções capilares de ponta que propiciem a obtenção de efeitos benéficos nas bacias. (JB 07/04)