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2005-03-24
O governo voltou atrás na decisão de licitar as obras de transposição do rio São Francisco antes mesmo de obter autorização ambiental para o projeto. Agora, decidiu que os editais para a contratação dos serviços das construtoras só serão lançados após a concessão de licenciamento pelo Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama).

A estratégia de fazer a licitação antes de obter a licença tinha como objetivo acelerar o cronograma de implantação do projeto e havia sido anunciada em janeiro. A previsão era começar as obras em abril. Com a mudança de planos, o principal projeto de infra-estrutura do presidente Luiz Inácio Lula da Silva terá que ser novamente adiado. Previsto originalmente para começar a sair do papel no início deste ano, o governo só dará largada às obras, na melhor das hipóteses, no terceiro trimestre. Isso se não houver contestações jurídicas, conforme prometem muitos dos opositores do projeto de transposição.

O maior defensor do lançamento dos editais antes da divulgação do licenciamento era o coordenador do projeto de interligação do rio São Francisco com as bacias hidrográficas do Nordeste, Pedro Brito, também chefe de gabinete do ministro Ciro Gomes, da Integração Nacional.Brito, ex-secretário de Fazenda do Ceará e um dos técnicos mais respeitados da Esplanada dos Ministérios, defendia que os editais tivessem sido lançados em meados de fevereiro, com uma cláusula: uma vez apontados os vencedores, os contratos seriam efetivamente assinados somente após a concessão do licenciamento ambiental. Ele acreditava que isso daria mais agilidade a um processo que, por causa da controvérsia política e das críticas dos ambientalistas, já estava demorando demais para vingar.

Os pré-editais chegaram a ser discutidos com empresários interessados em participar da licitação, mas o governo mudou de idéia ao perceber a reação negativa dos opositores do projeto de transposição. O ministro Ciro Gomes avaliou que fazer a licitação antes do licenciamento, prática contrária ao que tem acontecido no setor de energia após a aprovação do novo modelo do setor elétrico, por exemplo, era dar munição aos adversários políticos do projeto e aos ambientalistas mais radicais.

Dentro do governo, a atitude de Ciro agradou principalmente à ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, que havia ficado um pouco ressabiada com a perspectiva de lançamento dos editais antes do licenciamento. Ontem, ao participar de evento em comemoração ao Dia da Água, a ministra expressou satisfação com a mudança de estratégia. – A orientação do presidente Lula é de que não haja nenhum tipo de atropelo nos processos ambientais. Eu me pauto pelo que ele diz, afirmou Marina.

De qualquer forma, os técnicos da Integração Nacional mantêm o formato imaginado para os editais. Em princípio, deverá haver duas licitações: uma para contratar as empresas de construção e outra para a contratação de equipamentos. Para forçar a competição entre concorrentes, as obras serão divididas em 14 lotes, distribuídos pelos eixos Norte e Leste, que sairão do traçado original do rio São Francisco e terão 622 quilômetros de extensão. Cada empreiteira poderá abocanhar não mais do que dois lotes, aumentando a disputa. Os contratos devem somar R$ 4 bilhões.

O Ibama ainda trabalha na análise dos impactos ambientais da transposição. Os técnicos da autarquia foram a campo durante duas semanas e concluíram suas vistorias há dez dias. O órgão avalia agora os pareceres das secretarias estaduais de meio ambiente, que não têm caráter decisório. Servem como contribuição à análise.

De acordo com o diretor de licenciamento do Ibama, Nilvo Luiz Alves da Silva, a autarquia vem trabalhando com autonomia e sem receber pressão. Concluída a análise técnica, a área jurídica do Ibama dará parecer final sobre a validade das audiências públicas impedidas de acontecer por causa de manifestações públicas. O plano é lançar os editais 24 horas após a concessão da licença ambiental. (Valor 23/03)

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