Caça extingüe 3 espécies na Serra dos Órgãos
2005-03-16
Os três maiores mamíferos da Mata Atlântica sucumbiram aos caçadores na Serra dos Órgãos. Estudo realizado no ano passado pelo biólogo André Cunha, pesquisador-associado do Laboratório de Vertebrados da UFRJ, revelou a extinção da anta, da onça-pintada e do queixada (também conhecido como porco-do-mato). O levantamento começou em 1998 e contou até com armadilhas fotográficas (equipamentos que registram imagens dos animais na floresta).
André comparou os resultados com estudos de historiadores naturais sobre mamíferos da região do início do século passado e com a coleção de animais da Mata Atlântica do Museu Nacional da UFRJ. Além da armadilha, ele utilizou como método de pesquisa os censos em importantes trilhas da mata, identificação sonora e de pegada das espécies, e informações sobre os animais tratados pelo centro de triagem da unidade de conservação do Parque Nacional da Serra dos Órgãos.
— Cientificamente, dizemos que a extinção é provável, porque apesar de todo o rigor na apuração da pesquisa, não há como ser categórico. O fato é que, durante os anos da pesquisa, não houve relato ou registro da presença desses três grandes mamíferos — explica o pesquisador.
Outras espécies também podem estar ameaçadas
Outras duas espécies, o jupará e o mão-pelada, também não foram encontrados no levantamento, mas o pesquisador acha prematuro sugerir a extinção naquela região porque esses mamíferos são menores, têm hábitos solitários e coloração que os oculta na mata. Há outros animais ameaçados. Todos os mamíferos carnívoros tiveram apenas um registro, com exceção do quati e da irara. André cita ainda o cateto (pequeno porco-do-mato) como espécie ameaçada pelos caçadores. O macaco-guigó e o mico-caveirinha também foram registrados apenas uma vez e correm risco de extinção. Das três espécies consideradas extintas na Serra dos Órgãos, o queixada e a anta, historicamente, foram caçados devido à carne comestível. A onça-pintada, pela pele — um estudo realizado no México estimou o preço da pele de onça em US$ 200. No entanto, a caça esportiva tem aumentado na região da Serra dos Órgãos: — Ainda há a caça comercial e de subsistência. Mas cresce o número de caçadores que, influenciados pela antiga cultura de caça na região, buscam hoje por esporte espécies como paca e gambá.
Protegem a região da Serra dos Órgãos as seguintes unidades: Parque Nacional da Serra dos Órgãos e Reserva Biológica do Tinguá (federais); Estação Ecológica Paraíso, Reserva Biológica de Araras, Parque Estadual dos Três Picos, APA da Bacia dos Frades e APA da Floresta do Jacarandá (estaduais); e outras quatro municipais. Destas, a mais antiga é o Parque Nacional da Serra dos Órgãos, que abrange os municípios de Guapimirim, Magé, Petrópolis e Teresópolis.
Nas matas da unidade, que foi criada em 1939, há relatos de caça desde os anos 30. O diretor do parque, Ernesto Viveiros de Castro, diz que a fiscalização coibiu um pouco a atividade, mas reconhece que não há estrutura para vigiar todas as trilhas.
— Fazemos um patrulhamento no entorno do parque e na entrada das trilhas. Mas não temos como dar conta de toda a área — diz o diretor, que administra uma região de 118 quilômetros quadrados.
Falta de predadores naturais causa desequilíbrio
A extinção dessas espécies pode comprometer a renovação da floresta. Segundo André, os animais herbívoros são responsáveis pela dispersão de sementes de inúmeras plantas. O desaparecimento de predadores como a onça-pintada causa outro problema: ocorre a explosão populacional de suas presas, causando um desequilíbrio na cadeia alimentar. Ernesto diz que muitas vezes os caçadores agem associados aos palmiteiros. O palmito-juçara, atualmente restrito a parques e reservas, também corre risco de desaparecer.
André aponta como solução a criação de instrumentos para transformar a cultura local que, há gerações, está voltada para o hábito da caça. Ele diz ainda que é preciso conectar, com reflorestamento, as áreas verdes isoladas da região. A administração do Parque da Serra dos Órgãos também está implantando a gestão participativa que reunirá entidades representativas da sociedade. (O Globo 15/03)