Representantes do setor produtivo e de entidades de defesa do consumidor começam a travar uma batalha em torno do comércio de sementes transgênicas de soja antes mesmo da sanção presidencial ao projeto de Lei de Biossegurança, aprovada na Câmara dos Deputados no último dia 2 e que deve ser promulgada ou vetada até o fim desta semana.

A Confederação da Agricultura e da Pecuária do Brasil (CNA) adiantou-se à sanção e pediu ontem ao Ministério da Agricultura a anistia aos produtores que plantaram soja transgênica e não assinaram o Termo de Ajustamento de Conduta e estão sujeitos a multas a partir de R$ 16,1 mil. Carlos Sperotto, vice-presidente da CNA e presidente da Federação da Agricultura do Estado do Rio Grande do Sul (Farsul), disse que o termo perde o sentido com a liberação do grão pela lei.

Os produtores representados pela gaúcha Farsul, pela Federação dos Trabalhadores na Agricultura do Estado (Fetag-RS) e pela Federação das Cooperativas Agropecuárias (Fecoagro-RS) também discutem nesta semana a definição, com a americana Monsanto, do valor cobrado pelo uso de sua tecnologia. A múlti queria cobrar R$ 1,20 por saca de 60 quilos da soja transgênica colhida, mas as entidades propuseram cobrança de 1% sobre o valor da saca colhida neste ano e 1,5% sobre a saca vendida em 2006 (hoje o valor seria de R$ 0,28/saca).

Na ala contrária, Roberto Requião (PMDB), governador do Paraná, enviou ontem carta ao presidente Lula pedindo o veto à Lei de Biossegurança. O Instituto de Defesa do Consumidor (Idec) e a ONG Greenpeace informaram que vão exigir mais rigor na fiscalização de transgênicos. As entidades estudam, ainda, uma reação para evitar que a lei entre em vigor. Antônio José Monteiro, sócio da área de direito ambiental do Pinheiro Neto Advogados, e Patrícia Fukuma, sócia da Fukuma Advogados, observam que a entrada em vigor da lei dependerá de regulamentação complementar para nomear o Conselho Nacional de Biossegurança e definir as regras de segregação de grãos e de fiscalização, principalmente na área de importação e exportação. Taís Tesser, advogada do escritório Barretto Ferreira, Kujawski, Brancher e Gonçalves Sociedade de Advogados, disse que a nova lei pode exigir inclusive mudanças na lei de rotulagem.

Sobre as ações que tramitam na Justiça - como a movida pelo Idec desde 1998 para impedir a venda da soja transgênica da Monsanto -, Celso Luchesi, sócio do Zaclis e Luchesi Advogados, diz que as ações têm de ser julgadas, mas é possível que sejam extintas com a existência de lei regulamentando o comércio dos transgênicos.

Iwao Miyamoto, presidente da Associação Brasileira de Sementes e Mudas (Abrasem), disse que a produção de sementes na safra 2005/06, estimada em 4,5 milhões de sacas, será suficiente para cobrir 30% da área plantada no Brasil com soja. Hoje, segundo a Céleres, a soja transgênica ocupa de 21,5% a 26% da área. Miyamoto acredita que esse índice chegará a 50% nos próximos anos, mas não atingirá os níveis da Argentina (95%) e Paraguai (85%). Entre os motivos, ele aponta falta de oferta no curto prazo, falta de sementes adaptadas às condições do Centro-Oeste e pequena diferença no custo de produção sobre a soja convencional (de 8% a 9%, segundo a Céleres). (Valor, 08/03)