Estudo do BIRD sugere adiamento da transposição do São Francisco
2005-02-04
Uma análise feita pelo Banco Mundial (BIRD) a pedido do governo brasileiro, e que foi apresentada ao vice-presidente José de Alencar em agosto de 2003, sugere que o projeto de transposição do rio São Francisco para o Nordeste Setentrional (Ceará, Rio Grande do Norte, Paraíba e Pernambuco) seja adiado e que, em curto prazo, os recursos orçamentários sejam investidos em sistemas de abastecimento locais, com a utilização da água já disponível, na construção de cisternas para captação de água das chuvas e na construção de mais adutoras, com o fortalecimento do Proágua Semi-Árido, além da revitalização do rio.
A existência do estudo do Banco Mundial foi revelada nesta quarta-feira pelo jornal Correio Braziliense. Segundo o jornal, o estudo do BIRD diz que o governo brasileiro deveria realizar obras mais baratas para resolver o problema da falta de água no semi-árido nordestino e, somente em médio e longo prazo, implantar grandes projetos, como o da transposição, assim mesmo de forma gradual. A primeira fase da transposição custará cerca de R$ 4,5 bilhões.
O governo procurou desqualificar o estudo. — Essa análise se refere ao projeto de transposição preparado pelo governo anterior — disse Pedro Brito, que é chefe de gabinete do ministro da Integração Nacional, Ciro Gomes. Ele também é coordenador geral do projeto. — Não pedimos dinheiro ao Banco Mundial para o projeto e não vamos pedir. Os recursos sairão do orçamento da União. A análise é, portanto, mais uma opinião, como outra qualquer. A integração das bacias é uma decisão do governo brasileiro — observou Brito.
A assessoria do Banco Mundial confirmou que realizou análises do projeto de transposição a pedido dos governos Fernando Henrique Cardoso e Luiz Inácio Lula da Silva. O BIRD não quis revelar o conteúdo dessas análises, com o argumento de que os estudos são confidenciais. Também não quis manifestar opinião oficial sobre o projeto. O chefe de gabinete do ministro Ciro Gomes disse desconhecer que o governo Lula tenha pedido análise do projeto ao Banco Mundial e reafirmou que a análise é do projeto do governo FHC.
Brito disse também que o governo Lula já está implementando as medidas de curto prazo sugeridas no estudo do BIRD. — O governo tem um grande programa de construção de cisternas, está apoiando a construção de adutoras e investindo fortemente na revitalização do rio São Francisco — afirmou. — Essas iniciativas não são incompatíveis com o projeto de integração das bacias — observou.
O governo só espera pela licença ambiental do Ibama para iniciar a obra de transposição do São Francisco. — Assim que sair a licença, o governo divulgará os editais de licitação — disse Brito. Ele acredita que as obras começarão em maio. A licença ainda depende da conclusão das audiências públicas que o Ibama está realizando em oito Estados, mas que vem enfrentando forte resistência dos opositores ao projeto.
Segundo publicou o Correio da Bahia, antes mesmo de o documento do Bird ser elaborado, o Banco emprestou U$ 198 milhões ao Brasil para o programa Proágua Semi-árido, do governo federal, que previa o transporte de água armazenada em grandes açudes nos estados, através de dutos que abasteceriam as cidades do semi-árido, em parceria com os governos estaduais. Sem conseguir concluir o projeto até o vencimento do contrato com o Banco Mundial, o governo brasileiro devolveu à entidade U$40 milhões que ainda não tinham sido empregados na obra para fugir dos juros, cobrados pela entidade, como uma penalidade ao dinheiro ainda não empregado.
Hoje, a conclusão das obras de abastecimento de água e irrigação a comunidades ribeirinhas é uma das grandes bandeiras da Frente Nacional em Defesa do São Francisco. São cidades que sofrem com a falta de água a poucos quilômetros do rio. De acordo com o deputado estadual, Francisco Tenório (PPS), a vinte quilômetros do rio, há famílias que dependem de carros-pipa em Alagoas. De acordo com informações do Comitê da Bacia do São Francisco, neste verão, trinta cidades do interior do estado, que sofrem com a seca, decretaram estado de calamidade pública.
Ainda de acordo com o documento do Bird, o abastecimento de água nas regiões atendidas pelo projeto de transposição atende a população local, no mínimo, até 2025, o que não justificaria a pressa para a realização da transposição. Além disso, o Banco Mundial avalia equívocos no processo de condução do projeto e sugere ampla discussão com a sociedade, principalmente com as comunidades afetadas. Além disso, o alcance social da obra foi contestado pelo documento. - O projeto possui um grande objetivo tecnológico e comercial. Experiências internacionais sugerem que a ligação com os pobres pode ser fraca - afirma o documento do Bird. (OESP 2/2, Correio da Bahia, 3/2)