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2005-02-03
A balança enferrujada de Sérgio Ferreira dá o peso da redução do pescado na Baía de Guanabara. Hoje, marca 50 quilos após um dia de trabalho na Ilha do Governador, mas dez anos atrás, antes da obra de despoluição, diz o pescador, atingia mais que o dobro. A medida de Sérgio está calibrada com a do Departamento de Biologia Marinha da UFRJ, que estima uma redução de cerca 20% por ano no estoque de camarão na baía. Os números afogam as previsões de que o pescado dobraria até o fim da primeira fase da despoluição, feitas pelo estado na década passada.

O camarão é, historicamente, uma das espécies mais importantes da baía. Num levantamento de 2002, especialistas da Uerj apuraram o total de 88 toneladas de camarão pescadas no ano. Em 2003, em estudo realizado pela UFRJ, o volume caiu para 69 toneladas — uma queda de 21,5%. O chefe do Departamento de Biologia Marinha da UFRJ, Marcelo Vianna, diz que faltam dados sobre a pesca: — Com dados isolados, é difícil estudar o problema. O Rio precisa urgentemente de uma série histórica sobre a pesca. Mas sabemos que o volume de pescado na região continua caindo. O camarão da baía, antes vendido a quilo, tornou-se tão raro que passou a ser oferecido como isca, a R$ 0,20, para pesca esportiva.

A escassez da espécie é atribuída à degradação ambiental e à sobrepesca. Marcelo explica que os problemas da baía afetam a abundância de camarão até em regiões oceânicas. E, nesse caso, há dados científicos: — Na costa da Região Sudeste, há 15 anos, a captura por hora de arrasto era de 20 quilos. Em 2004, o número caiu para 1,5 quilo. Como a baía é um grande criadouro, sua degradação ambiental reduz a abundância do camarão — diz Marcelo.

O crustáceo rareou entre a década de 60 e 2003, quando foi registrada uma diminuição de 83%. A abundância do passado é divulgada num dos parcos dados disponíveis na Feema, que estimou em 400 toneladas de camarão o volume pescado por ano durante a década de 60.

A Federação de Pescadores do Estado do Rio de Janeiro também tenta estimar o prejuízo, diante da inexistência de uma série histórica nos órgãos responsáveis. Faltam estudos ininterruptos no Ibama, na Secretaria Especial de Aqüicultura e Pesca do governo federal e na Federação das Indústrias de Pesca do Estado do Rio. O presidente da Federação dos Pescadores, José Maria Pugas, baseou-se na experiência dos colegas:

— Estimamos a queda de todo o pescado em 40% nos últimos dez anos. Infelizmente não existem estatísticas oficiais sobre a produção. A federação insiste mas o governo não faz, ninguém faz — diz ele. Segundo Pugas, existem 21.800 pescadores cadastrados nas cinco colônias da Baía de Guanabara. Mas ele calcula que só 14.000 estejam na ativa. A maioria é de pescadores artesanais, que utilizam em geral canoas ou caíques e usam redes, linhas ou pequenos arrastos.

Nos dados divulgados pelo Ibama, a colônia de Ramos aparece com dez toneladas em 1995 e 121 toneladas em 2002, num aumento de 1.100%. Em Mauá, dez anos atrás o levantamento era de 143 toneladas e, em 2002, de 757 toneladas — 430% a mais. Não é história de pescador, mas os dados são questionados por quem vive do mar.

Enquanto os órgãos públicos estão amarrados no cais, os homens do mar sofrem para encontrar pescado. Luiz Carlos Almeida, de 48 anos, desdobra-se para ganhar a vida nos currais, armadilhas inventadas pelos índios tupis, feitas com 120 pedaços de bambu e 16 esteiras. Em frente à Ilha de Itaoca, em São Gonçalo, ele pega 70 quilos de peixe e outros tantos de lixo.

— Chega a 40 quilos só de garrafa PET, balde, saco plástico, essas coisas. Estou pensando em ganhar dinheiro com o negócio de reciclagem. O curral é um catador de lixo do mar — diz Luiz Carlos, de Magé. No manguezal de Itambi, em Itaboraí, a natureza prova a capacidade de regeneração. O problema é a fama. A área, afetada pelo vazamento de 1,3 milhão de litros de óleo de um duto da Petrobras em 2000, mostra recuperação no balaio de catadores como José Maria da Silva, de 61 anos: — Não será mais como nos bons tempos, mas ainda encontro caranguejo. O problema é a clientela, que sumiu desde o acidente. (O Globo 2/2)

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