Amazônia 1: Para ONG, soja provoca devastação
2005-01-24
A grande expansão, desde 2001, do cultivo da soja na região amazônica tornou-se a principal preocupação de organizações ambientalistas com o desmatamento da floresta e do cerrado.
Em estudo realizado com a ONG Amigos da Terra, o ISA (Instituto Socioambiental) sobrevoou e fotografou, em novembro de 2004, 31 pontos de desmatamentos de 2003, no Mato Grosso, verificando que as áreas estavam, em 2004, ocupadas com soja.
Os locais foram escolhidos a partir de uma lista dos 65 maiores desmatamentos de MT, repassada pela Fema (Fundação Estadual do Meio Ambiente) ao Ministério Público estadual. Segundo dados da Fema, cada área escolhida possui cerca de 1.300 hectares. Na década de 90, a taxa de desmatamento da Amazônia foi de quase dois milhões de hectares por ano -quase o tamanho de Sergipe, que é de 2,2 milhões de hectares.
Segundo André Lima, advogado do ISA e um dos autores do estudo, 70% dos locais estão ocupados com agricultura, sendo 55% com soja e 35% com arroz.
Em pesquisa do Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada), divulgada na semana passada, o cultivo da soja teve explosão de crescimento por área plantada nos anos agrícolas de 2001-2002, 2002-2003 e 2003-2004: no Sul e Sudeste foi de 39,8%; apenas no Centro-Oeste, 66,1%.
Neste período, houve aumento de 51,9% de desmatamentos em MT. Segundo a Fema, em 2000-2001, 1,22 milhão de hectares foram desmatados no Estado (destes, 40 mil eram legais); em 2002-2003, 1,85 milhão (800 mil legais).
O presidente da Fema, Moacir Pires, assessor especial do Meio Ambiente de MT, faz relação entre o aumento de desmatamentos e a expansão da soja, citando que a explosão nos últimos três anos se deu quando a soja estava com alta cotação. — Soja é igual a garimpo. Conforme sobe o preço do ouro, o pessoal vai pro garimpo.
A pesquisa do Ipea mostra que, após a mudança cambial de 1999, com o alto preço do grão e a defasagem que beneficiou a exportação, a soja teve expansão anual média de 13,8% nos últimos três anos agrícolas. Nos dez anos anteriores a média foi de 3,6%.
Pesquisadores do Ipea, no entanto, não fazem relação entre desmatamento e expansão da soja. O argumento é que, para ter havido uma expansão tão rápida em um prazo curto, isso nunca poderia ter se baseado em abertura de área virgem. O mais provável é que tenha se dado na ocupação de pastagens degradadas.
— Após derrubar a vegetação, não se consegue produzir nada. Pode-se levar até dois anos para o cerrado se tornar produtivo. Imagina só com a floresta amazônica, diz o pesquisador do Ipea Gervásio Castro de Rezende, professor de economia da Uerj (Universidade Estadual do RJ).
André Lima, do ISA, retruca: Sobrevoamos áreas que foram desmatadas em 2003 e, em 2004, já havia soja plantada. Agrônomos, não economistas, sobrevoaram e identificaram a mudança.
O professor Edgar Beauclair, da área de produção vegetal da Esalq (Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz), da USP, diz que não é impossível o cultivo de soja em menos de dois anos em área desmatada de floresta. No entanto, é difícil e requer investimento.
Beauclair diz que o trabalho é demorado, pois, quando se desmata, as plantas deixam sementes que germinam novamente. — Há possibilidade de retorno, sim, em dois anos, mas é difícil conhecer um ambiente novo nesse período, diz Beauclair.
O pesquisador Paulo Galerani, da Embrapa, acrescenta que o natural é primeiro a ocupação com pastagem e depois o cultivo de grão, mas diz que há tecnologia para ir do desmatamento ao cultivo de soja em menos de dois anos. (FSP/23/1)