Até Marina Silva aceitou o acordo para a derrubada das araucárias
2005-01-19
O papel desenha um jeitinho dos clássicos. O Baesa se comprometeu a pagar pelo dano ambiental - no fim, tudo virou uma questão de money, dólar, plata, reais, bufunfa, grana, dim dim. Até a ministra Marina Silva, do Meio Ambiente, aquela que fez fama e carreira política defendendo a Amazônia ao lado do mártir Chico Mendes, concordou com a derrubada das inderrubáveis.
As autoridades defendem que agora é tarde para saber quem deu a mancada de projetar o lago no ninho das araucárias. Adotaram o discurso do fato consumado - e o discurso colou, tanto que até o Ministério Público, fiscal de todas as leis, também embarcou nele. Na lei ou na marra a mata tem que cair: para Barra Grande produzir seus quilovates, precisa do lago. E o lago precisa ocupar 92 quilômetros quadrados de mata das margens do rio Pelotas, ou não aciona as turbinas.
Jogo desigual
Como desmatamento é palavrão em tempos ambientalmente corretos, com acordo e tudo a coisa ainda está pegando fogo lá nas barrancas do rio, longe dos noticiários de televisão. A Baesa se diz uma vítima inocente na história: seus engenheiros alegam que não sabiam que a área onde formariam o lago tinha araucárias. Deram a clássica resposta do filho quando o pai pega ele fazendo alguma coisa errada: Não fui eu!
Ongs fustigam a Baesa no front verde. Os agricultores despejados das margens se organizaram no estilo MST e lutam por cada grão de terra. Os dois grupos usam táticas de confronto nos grotões, mas também apelaram à Justiça. Pressionada, a Baesa abriu seu porquinho inesgotável - um dos sócios do consórcio de construtores é o Bradesco - para acalmar a ira dos que a criticam.
Desde o início de janeiro, ela está conseguindo manter os ambientalistas fora de suas matas. E satisfez os atingidos com bufunfa, enquanto seu batalhão de advogados tenta limpar a área nos tribunais. A Baesa mantém ainda uma azeitada máquina de propaganda para deixar o verdadeiro problema fora do debate público, impedindo que se esclareça a dúvida essencial: de como uma obra pública tão importante recebeu sinal verde para ser erguida onde a lei defendia a floresta nativa.
Impunidade consumada
Mais: seus comunicadores jamais usam a palavra desmatamento. Nas mensagens no site www.baesa.com.br ela explica que tem que realizar uma tarefa de supressão vegetal.
Quando o caso chegou aos tribunais, o juridiquês tornou o debate definitivamente incompreensível para os leigos. É tratado de forma tão distante que o quentíssimo assunto parece mais frio do que rabo de pingüim. Até o Ministério Público já desistiu de tentar identificar os inidentificáveis autores da mancada, ou responsabilizar os responsáveis pelo erro ou sacanagem que ameaça derrubar as inderrubáveis.
Resumo da ópera: de outubro pra cá a ação de desmatamento avança aos trancos pelos barrancos, em meio a várias reviravoltas jurídicas, políticas e ambientais. As escaramuças no mato produziram até uma morte, ainda sendo investigada - cada lado acusa o outro pela vítima. O morto? Coisa insignificante: um peão baleado num piquete. (Renan Antunes de Oliveira)