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2004-12-17
O projeto Brasil das Águas terminou com sucesso a fase de coleta de amostras de água que formam a base de um abrangente levantamento da qualidade das águas doces do Brasil. Desde seu início, em outubro de 2003, o projeto passou por 1.170 pontos de amostragem em rios, represas e lagos espalhados por todo o território nacional, trazendo para análise mais de 5.900 amostras de água. Todas as regiões hidrográficas foram amostradas, utilizando-se pela primeira vez a mesma metodologia em todo o país. Concluídas as análises de laboratório, teremos em mãos um estudo inédito e atualizado da situação dos recursos hídricos da nação.

O grande diferencial deste trabalho, que tornou possível a coleta das amostras em escala nacional em pouco mais de um ano, é o método inovador de captação da água. Idealizado pelo aviador Gérard Moss, o projeto utilizou um avião anfíbio equipado com um laboratório aéreo, pioneiro no mundo, desenhado e montado pela própria equipe do projeto. Somente um avião tem a capacidade de alcançar os cantos mais distantes de um país como o nosso que, além das proporções continentais, possui 12% de toda a água doce acessível do planeta. No decorrer dos últimos 14 meses, o avião, pilotado por Moss, voou aproximadamente 120.000 km em busca das amostras, uma distância superior a duas voltas no nosso planeta pela Linha do Equador. O reconhecimento da essência do projeto, que combina pesquisa cientifica, tecnologia inovadora e ação social, veio em novembro passado, quando o projeto Brasil das Águas venceu o prêmio von Martius edição 2004, o mais prestigiado e concorrido prêmio ambiental do Brasil, na categoria Natureza. O sistema de captação foi desenhado pela própria equipe do projeto, e os dados são processados pelo computador de bordo de fabricação da empresa Atos, 100% brasileira. O avião capta água em vôos rasantes sobre a superfície do corpo d água, quando determinadas características físico-químicas (como pH, temperatura, condutividade, turbidez etc.) são registradas por uma sonda multiparamétrica, fornecida pela Hexis, instalada a bordo. Uma amostra de 160 ml da água recolhida em cada ponto é separada em cinco amostras menores, posteriormente levadas para serem analisadas por pesquisadores no Instituto Internacional de Ecologia (IIE) em São Carlos (SP), a UFRJ, UFV, USP, UFF e UFBA.

Resultados Preliminares (aferidos até agora pelos pesquisadores envolvidos no projeto)

Análise de Nutrientes na Água (Estado Trófico das Águas):
1) Nas regiões Norte e Centro-oeste, principalmente no que diz respeito aos grandes rios Tapajós, Araguaia e Xingu, com algumas exceções pontuais (como nas proximidades das cidades de Caseara, Pontal do Araguaia, Aragarças e Barra do Garças), foram encontrados níveis baixos de nutrientes, indicando que esses sistemas se encontram, ainda, em bom estado de conservação.
2) Na região Nordeste, foi encontrado um elevado número de pontos com altas quantidades de nutrientes, acima da média nacional. Mais especificamente no Rio Paraíba e em alguns segmentos do São Francisco. Neste último, averiguou-se que todos os seus reservatórios (entre eles as represas do Sobradinho, Itaparica, Paulo Afonso e Xingó) apresentaram, em algum ponto, concentrações elevadas de nutrientes – tipicamente devido à descarga de esgotos domésticos não tratados ou impactos da irrigação. Acreditamos que esses resultados acima da média tenham sido provocados devido à relação entre a densidade demográfica e um menor volume de água presente na região. Por outro lado, o Rio Parnaíba se destacou na região pelos baixos índices de nutrientes e pela boa qualidade.
3) No Rio Amazonas foi encontrado um nível surpreendentemente alto de nutrientes, que poderiam estar indicando descarga de esgoto doméstico ou impactos das atividades de irrigação – o que é muito improvável nessa região. Uma quantidade elevada de nutrientes nem sempre significa água de má qualidade. Mas qual seria a explicação? Infelizmente, será necessária uma maior investigação para se descobrir isso, podendo ter a ver com as raízes da água saindo dos Andes.
4) Pantanal – acreditamos que o elevado uso de fertilizantes nas lavouras de soja nas terras mais altas, os dejetos resultantes da pecuária e o lançamento de esgoto sem tratamento em rios como Miranda, Aquidauana e Paraguai tenham causado os tristes resultados para essa região.
5) Na Região Sudeste e bacia do Paraná, as coletas sucessivas ao longo do Rio Tietê, que na Grande São Paulo é praticamente um esgoto a céu aberto, revelam a grande capacidade de recuperação do rio. Em certos municípios, como Araçatuba, que fica mais abaixo no curso do rio e onde há um louvável esforço no tratamento de esgoto, os níveis de nutrientes são significativamente mais reduzidos. Efeito semelhante foi visto no Rio Iguaçu. Saindo de Curitiba, os níveis de nutrientes estão muito elevados, e caem consideravelmente na parte mais baixa do rio, próximo ao Parque Nacional.
6) Na Região Sul, testemunhamos também a agonia de alguns corpos hídricos brasileiros como o Mãe Luiza, em Santa Catarina. Poluído pelos resíduos de carvão, o rio muda de cor diversas vezes em seu percurso. Rios como o Itajaí e o Rio do Peixe também apresentaram índices relativamente elevados. No Rio Grande do Sul uma boa surpresa. Em Porto Alegre, onde 77% do esgoto é tratado (bem acima da média nacional de 20%), o Rio Guaíba demonstrou qualidade da água moderada, não evidenciando um aporte significativo de esgoto pela cidade. O Rio Uruguai apresentou estado moderado de conservação. Infelizmente, outros como a Lagoa do Casamento, Rio Caí, Rio dos Sinos, entre outros, apresentaram níveis relativamente elevados de contaminação.

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