Por Mariano Senna
Difícil juntar o quebra-cabeça nuclear brasileiro. A começar que ele é conectado com o quadro mundial, que por si só já é confuso. Acrescenta-se a maneira sigilosa com que o governo brasileiro e as instituições interessadas tratam o tema, e mais a complexidade da questão. Dessa forma, torna-se quase impossível achar o caminho das pedras. Mas o público leigo realmente não está a par do debate.
Na semana passada, o Greenpeace chegou a anunciar o fim do programa nuclear brasileiro, pegando carona no cancelamento do contrato de cooperação com a Alemanha, que completaria 30 anos em 2005. Logo depois os ambientalistas corrigiram a informação. Na verdade a cooperação entre Brasília e Berlin, apenas deixaria de considerar a geração atômica, passando a se concentrar em fontes renováveis, principalmente a eólica, além de usos da radiação na área médica e alimentícia.
Assim, o governo do chanceler Gerhard Schroeder se livrou de um incômodo político, que vinha rendendo polêmicas pela contradição que representava frente ao plano do país de abandonar a geração nuclear até 2025. Já o governo brasileiro ficou livre para consolidar a costura legal de um novo acordo nuclear. A bola já havia sido passada há pelo menos três anos, quando por conseqüência do plano alemão de desligamento das centrais nucleares, a Siemens, detentora da tecnologia repassada aos brasileiros, vendeu o controle das suas operações na área atômica para a francesa Framatome. Isso explica a tramitação no Congresso de um acordo de cooperação entre Brasil e França para o desenvolvimento pacífico da energia nuclear. Este novo acordo seria o sinal verde para a construção de Angra 3, viabilizando inclusive o financiamento internacional de US$ 1,8 bilhão para o empreendimento.
O jornal Correio Braziliense na última sexta-feira (19/11) eliminou as últimas dúvidas sobre a intenção do governo Lula de construir Angra III. — Angra 3 vai pra frente. A posição ainda não é oficial, mas a decisão está tomada e tudo caminha nesse sentido, informou o ministro da Ciência e Tecnologia, Eduardo Campos, em entrevista ao jornal. Segundo o ministro a decisão constará do relatório que o governo está elaborando sobre o futuro do programa nuclear brasileiro. Ele ainda acrescentou que a construção da terceira usina foi uma solução mediada entre setores do governo que defendem a ampliação do parque industrial nuclear e os que se inclinam por soluções mais conservadoras, como a construção de mais hidrelétricas. Após essas negociações faltaria só a assinatura da ministra Dilma Roussef, no relatório do grupo interministerial, traçando novas linhas de aplicação da tecnologia atômica. Dilma é do grupo que defende a construção de novas usinas hidrelétricas.
Uma pesquisa de opinião realizada pelo ISER (Instituto de Estudos da Religião) este ano, apurou que mais de 82% da população brasileira é contrária à construção de Angra 3; não gostaria de morar perto de usinas nucleares; e não votaria em políticos que propusessem a sua construção. Mas pelos trâmites sobre o assunto, o Brasil construirá sua terceira usina nuclear em um dos lugares mais bonitos do planeta e ninguém saberá o porquê.