Ecoturismo está deixando animais stressados
2004-11-22
Ursos com taquicardia, pingüins abaixo do peso normal e golfinhos de mau humor - há algo de errado no mundo animal, e a culpa não é da natureza. Alterações como essas têm sido observadas na fauna das regiões onde se pratica de maneira extensiva o ecoturismo. A proximidade cada vez maior do ser humano acaba por perturbar a rotina dos bichos, às vezes interferindo em seu metabolismo e modificando seu comportamento. Uma série de estudos publicados pela revista New Scientist relaciona vários casos desse tipo e conclui que, a longo prazo, os turistas podem colocar em risco a vida selvagem que tanto desejam ver. Um exemplo são os golfinhos da Nova Zelândia e da Escócia, que são assediados por turistas em barcos e até em jet ski. Pesquisadores que acompanham a rotina desses animais desde 1996 concluíram que, quando três ou mais barcos estão nas proximidades, seu tempo diário de descanso cai a 30% do normal. Por permanecerem muito tempo na superfície, sendo observados e estimulados, dormem demais à noite. — Essa é uma séria ameaça à espécie, pois a mudança de rotina faz com que eles não se socializem nem procurem alimentos como deveriam, disse o biólogo Gordon Hastie, da Universidade British Columbia.
A cada outono, mais de 20.000 pessoas costumam visitar Manitoba, no Canadá, para observar os ursos-polares. As viagens coincidem com o início do período de preparação para a hibernação dos animais. Resultado: em vez de descansar e engordar, os ursos ficam em estado de alerta, têm o metabolismo acelerado e gastam a energia que deveriam manter armazenada para o inverno. Os pingüins da Península de Otago, na Nova Zelândia, que vive repleta de turistas, pesam 10% menos do os que vivem em locais remotos. Na Amazônia, o impacto do homem foi aferido numa pesquisa da Sociedade Zoológica de Frankfurt com um pássaro chamado cigana. Aqueles que vivem em locais turísticos têm uma taxa de fertilidade 45% menor que os que vivem sem contato com o ser humano. — O turista é sempre bem-intencionado, o problema é que o ecoturismo cresce num ritmo muito intenso e faltam estudos sobre o impacto da presença humana em determinados ambientes, disse Martha Honey, diretora da ONG Sociedade Internacional de Ecoturismo, baseada em Washington. O ecoturismo responde por 20% de todo o turismo mundial e é o segmento que mais cresce no setor: até 30% ao ano. Só os passeios para observação de baleias já se tornaram uma indústria bilionária - e também uma ameaça. Todo ano mais de 9 milhões de pessoas participam de expedições desse tipo em 87 países. De vez em quando, os barcos acabam por se aproximar demais das baleias, machucando-as e até matando-as. Nos Estados Unidos, apenas os navios da Marinha e os petroleiros fazem mais vítimas entre esses animais do que os barcos de ecoturistas. (VEJA 17/11)