Fraude no EIA garantiu licença para construção da hidrelétrica de Barra Grande
2004-10-05
Mais uma vez grandes empresas tentam impor a política do fato consumado para burlar a legislação e lucrar às custas da destruição do meio ambiente. É o que está ocorrendo na Usina Hidrelétrica de Barra Grande, em estágio final de construção no rio Pelotas, na divisa entre o Rio Grande do Sul e Santa Catarina. Para obter a licença prévia que permitiu o início da construção da barragem em 1999, a empresa construtora Baesa – Energética Barra Grande S.A. baseou-se num Estudo de Impacto Ambiental (EIA/Rima) fraudulento, elaborado pela empresa de consultoria Engevix. A existência de dois mil hectares de florestas virgens de araucária e mais outros quatro mil hectares de florestas em estágio avançado de regeneração, o que representa 2/3 da área total do reservatório, foi completamente ignorado pelo relatório.
No estudo, a área a ser alagada seria constituída por - pequenas culturas, capoeiras ciliares baixas e campos com arvoredos esparsos- O EIA/Rima afirmava, ainda, que a formação dominante na área a ser inundada pelo empreendimento é a de capoeirões que representam níveis iniciais e, ocasionalmente, intermediários de regeneração. E o que é pior, garantia que no local não é comum a ocorrência da Araucaria angustifolia, espécie ameaçada de extinção e protegida por lei. Baseado nestas informações, o Ibama considerou ambientalmente viável a construção da barragem de Barra Grande, alegando que a área que será inundada não tem grande significância quanto a sua cobertura vegetal e que a obra não traria graves prejuízos a bens ambientais importantes ou protegidos pela legislação.
A constatação da existência de uma das últimas áreas primárias de araucária no Brasil só foi feita com o murro da represa praticamente concluído, quando a Baesa, consórcio formado pelo grupo Votorantin, Bradesco, Camargo Corrêa, Alcoa e CPFL, pediu ao Ibama a emissão da Licença de Operação (LO), para o enchimento do reservatório. O Ibama solicitou então, a apresentação de um programa de remoção da vegetação da área a ser alagada. Uma equipe especializada foi contratada para realizar o trabalho, que de acordo com o EIA seria razoavelmente simples, por se tratar de área coberta por capoeirões. Em maio de 2003, após ir a campo, a equipe apresentou o planejamento da remoção, onde consta que 25% da área do futuro reservatório é composta de vegetação primária, ou seja, de Mata Atlântica, principalmente de florestas de araucárias em ótimo estado de preservação. Já 45% da área a ser inundada está composta por vegetação secundária em estágio avançado e médio de regeneração e riquíssima em biodiversidade. Apesar da fraude, o Ibama autorizou no último dia 17 de setembro, o desmatamento da floresta, alegando que não é de interesse público paralisar uma obra em estágio final de conclusão. Um Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) foi assinado com a Baesa e representantes do Ministério Público e dos ministérios do Meio Ambiente e das Minas e Energia. No termo, a empresa fica comprometida a comprar uma área de 5.700 hectares para constituição de uma reserva ambiental, além de formar um banco de germoplasma para a preservação dos recursos genéticos específicos da floresta nativa que será alagada.
André Sartori, da coordenação do Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB), ironizou a assinatura do Termo. - Um acordo entre a Baesa e o Ibama só pode ser brincadeira. A empresa não cumpre com suas obrigações sociais e frauda o estudo de impacto ambiental. E o Ibama, em cinco anos, não conseguiu ver que na região existe araucária ao invés de capoeira Sartori lembra ainda, que além dos graves danos ambientais, a construção da UHE de Barra Grande está expulsando centenas de agricultores de suas terras. — Mesmo com a barragem praticamente pronta, inúmeros problemas sociais ainda não foram resolvidos e muitas famílias esperam pelo reassentamento, afirmou. Segundo o advogado Alvenir de Almeida, do MAB, a situação em Barra Grande não é um caso isolado e reflete a pressão política que o Estado brasileiro tem recebido dos grandes grupos econômicos para flexibilizar a legislação ambiental e distribuir licenças sem critérios. — A preservação do meio ambiente é considerada pela área econômica do governo federal, um entrave para a expansão do capital. Essa mentalidade está trazendo graves prejuízos para o país, finaliza. (Artigo de Eduardo Luiz Zen, da Eco Agência, 04/10)