Aspectos tributários do petróleo e gás natural
2004-07-27
Um dos fatores que mais desafiam as empresas que pretendem participar da 6ª Rodada de Licitações da Agência Nacional do Petróleo (ANP) é o nosso complexo sistema tributário. Ao contrário do que ocorre em outros países, não há no Brasil um regime tributário específico para as atividades de exploração e produção de petróleo e de gás natural. A competência tributária nas atividades de upstream (exploração e produção) não está concentrada em apenas um ente da federação, mas, ao contrário, repartida entre a União, Estados e municípios.
Nos últimos anos, o governo federal adotou algumas medidas para mitigar os riscos dos investidores. Uma das primeiras iniciativas foi a criação do Repetro, regime especial cujos objetivos são fomentar a importação de determinados equipamentos para as atividades de exploração e produção ingressados no país até 2020, e desonerar de tributos federais o fornecimento de bens de produção nacional para o upstream.
Os Estados também criaram incentivos fiscais que beneficiam as importações de equipamentos destinados às atividades de exploração e produção, quando, em 1999, editaram o Convênio ICMS n° 58, que permitiu a isenção ou a redução da base de cálculo do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) na importação de bens sob o regime de admissão temporária.
O Estado do Rio de Janeiro, contudo, editou, em 2002, a Lei n° 3.851 (Lei Valentim), que passou a considerar tributáveis as importações ocorridas no seu território, mesmo que sob o regime de admissão temporária. Buscando amenizar esse impacto tributário e sensível às expectativas do mercado, o governo fluminense baixou o Decreto n° 34.811, de 16 de fevereiro de 2004, determinando que o ICMS não incidirá na importação de bens utilizados na fase exploratória.
Relativamente à indústria naval, há benefícios fiscais concretos previstos na legislação do Estado do Rio de Janeiro que propiciam a retomada do seu crescimento. É o caso do Decreto n° 33.975, de 29 de setembro de 2003, que determina ser isenta do ICMS a aquisição de máquinas, equipamentos, peças, partes e acessórios destinados ao ativo das empresas de construção, reparo naval e náutico instaladas ou que venham a se instalar no Estado do Rio de Janeiro.
Qualquer alteração significativa das regras tributárias pode afetar a rentabilidade dos investimentos
O Estado de São Paulo, por sua vez, isentou do ICMS a importação e as operações internas e interestaduais com bens amparados pelo Repetro (Decreto n° 48.115/03). Há, também, benefícios semelhantes em outros Estados da federação para o setor de exploração e produção.
Na percepção das empresas de petróleo, todavia, esses benefícios fiscais são assistemáticos e insuficientes para aumentar a atratividade do setor; poder-se-ia até cogitar de retrocesso no tratamento de algumas questões nas três órbitas de governo (como por exemplo o mecanismo imperfeito de apropriação na fase de desenvolvimento/produção de créditos de PIS/Cofins gerados na fase exploratória, o ICMS na extração do óleo bruto, bem como o ISS na importação de serviços).
Os investimentos nas atividades de exploração e produção caracterizam-se por sua longa maturação. A definição de regras claras e duradouras é de fundamental importância para mitigar os riscos inerentes aos projetos de upstream. Qualquer alteração significativa das regras tributárias pode afetar a rentabilidade dos investimentos.
Algumas opções têm sido sugeridas por empresas do setor para neutralizar eventuais majorações da carga tributária, entre as quais, a inserção da -tax stability clause- no contrato de concessão para exploração, desenvolvimento e produção de petróleo e gás natural, cláusula que, todavia, não pode alterar a definição do responsável pelo pagamento do tributo perante o Fisco, nos termos do artigo 123 do Código Tributário Nacional.
O país tem excelente oportunidade para atrair investimentos para as atividades de exploração e produção, o que justifica que seja posta na ordem do dia a formulação de uma política tributária específica para o setor.
(Valor on line, 27/07)