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2004-07-26
A Floresta Amazônica é um retrato do Brasil: um grande mosaico em que cada um cuida de seus próprios interesses, com rara atenção para motivações coletivas. Boa parcela dos produtores de soja e pecuaristas defende o desenvolvimento a qualquer preço ao estender seus domínios pela mata. Os madeireiros derrubam árvores como se não houvesse amanhã. E os ambientalistas sonham em manter uma imensa reserva intocada. Enquanto isso, a população nativa sabe que seu sustento depende da exploração dos recursos cada vez mais exíguos da floresta. Ao longo da história, esse ciclo vicioso se traduziu em aumento progressivo das queimadas. Só em 2003, o fogo lambeu 23.750 quilômetros quadrados de verde, área maior do que o Estado de Sergipe. No total, 14% dos 5,5 milhões de quilômetros quadrados de área original já viraram fumaça.

O desafio de organizar tantos interesses conflitantes e divergentes dependia de um conhecimento científico até então inexistente. A partir de terça-feira 27, cerca de 800 cientistas brasileiros e estrangeiros se reúnem em Brasília para apresentar 700 trabalhos e descobertas com o que há de mais novo sobre o papel da floresta. O objetivo é dar um largo passo na direção de produzir uma forma racional – e realista –, de planejar o desenvolvimento de um dos mais ricos patrimônios naturais do mundo. Essa será a tônica da III Conferência Científica do LBA (sigla em inglês para Experimento de Grande Escala da Biosfera-Atmosfera na Amazônia). A constatação mais impressionante é que o desmatamento pode reduzir a quantidade de chuvas não só na Amazônia, mas em outras regiões do País. Outras pesquisas apontam para um nefasto cenário com mais estiagem e aumento nas emissões de dióxido de carbono (CO2), o grande vilão do efeito estufa e do aquecimento global.

Buscam-se ainda números precisos sobre emissão e absorção de CO2 na floresta, informação fundamental para as negociações do protocolo de Kyoto, tratado internacional de redução de poluentes. Um exemplo é a experiência que há três anos provoca o ressecamento da floresta de Tapajós, em Santarém, Pará, mostrando que o desmatamento reduz a transpiração das árvores e diminui a evaporação e a formação das nuvens. Desenvolvida pela Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa) e coordenada por Paulo Moutinho, ecólogo do Instituto de Pesquisas Amazônicas (Ipam), a técnica consiste em reduzir a precipitação com a instalação de seis mil painéis plásticos durante os períodos de estiagem. A chuva corre por calhas e é lançada longe da floresta. A idéia é prever como a vegetação reagirá se o processo de aquecimento global continuar. As conclusões são alarmantes: o crescimento das árvores foi reduzido, assim como a floração e os frutos, e a mortalidade das árvores triplicou. (Isto É, 26/07)

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