Congresso Nacional revoga o Código Florestal em áreas urbanas e
2004-07-22
Foi escamoteado no Projeto de Lei (PL) 2109 de 1999, que dispõe sobre o patrimônio de afetação de incorporações imobiliárias, letra de crédito imobiliário, cédula de crédito imobiliário, cédula de crédito bancário e dá outras providências, um artigo que representa um dos maiores retrocessos
para a gestão ambiental urbana do país. O artigo 64 do PL diz: Na produção imobiliária, seja por incorporação ou parcelamento do solo, em áreas urbanas e de expansão urbana, não se
aplicam os dispositivos da Lei 4771, de 15 de setembro de 1965 [Código Florestal], o que significa que locais como restingas, encostas,
brejos e falésias, lagunas, manguezais e margens de rios, relevantes para a integridade de processos ecológicos e para a manutenção do bem estar humano, poderão deixar de ser considerados Áreas de Preservação Permanente (APPs).
De acordo com o previsto no Projeto de Lei, com um simples decreto
municipal prefeitos poderão indicar uma região como área expansão
urbana, liberando desmatamentos em APPs e Reservas Legais - área localizada no
interior de uma propriedade necessária ao uso sustentável dos recursos naturais, à conservação e reabilitação dos processos ecológicos, à conservação da biodiversidade e ao abrigo e proteção da fauna e flora nativas. Dessa forma, o avanço da fronteira urbana é retirado do controle dos órgãos estaduais de meio ambiente e do Ibama. A extensão dessa regra para as áreas de expansão urbana sem condicioná-la a instrumentos de planejamento, como um Plano Diretor ou
um Zoneamento Ambiental, privilegia o crescimento desordenado que prevalece no
país, com impactos graves especialmente para a Mata Atlântica e Zona Costeira. Atualmente, o Código Florestal, ao lado do Estatuto das Cidades, é o principal instrumento de suporte ao processo de ocupação urbana.
Além disso, ao permitir que municípios incorporem APPs, hoje sem
valor econômico devido suas especificidades ambientais, como áreas urbanas ou
de expansão, o PL deverá encarecer as indenizações previstas em desapropriações
de áreas destinadas a Unidades de Conservação (UCs), com impactos incalculáveis para os cofres públicos estaduais e do Ibama. Exemplo disso são as indenizações milionárias já cobradas do Estado de São Paulo pelas Unidades de Conservação do litoral, considerado pelas legislações
municipais como área urbana ou de expansão urbana. Para piorar o quadro, o controle público e social da gestão ambiental dos municípios ainda é bastante frágil no país. Segundo a Associação
Nacional dos Municípios e Meio Ambiente (ANAMA), somente 10% dos municípios possuem órgão ambiental com alguma estrutura para proceder o controle, a fiscalização e o licenciamento ambiental. Além disso, a Pesquisa de Informações Básicas Municipais realizada em 2001 pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) aponta que apenas 22,2% dos 5.560
municípios brasileiros contam com Conselhos Municipais de Meio Ambiente.