Para urbanistas, Plano Diretor de São Paulo não tem foco
2004-07-21
Falta de foco e texto confuso. Essas foram as principais críticas feitas por seis urbanistas convidados pela Folha para avaliar a lei que define o novo zoneamento de São Paulo e os 31 planos diretores regionais, aprovados na Câmara Municipal no início deste mês.
Juntos, a lei de uso e ocupação de solo e os planos regionais complementam o Plano Diretor Estratégico, aprovado em 2002, e determinam o que pode ou não ser feito em cada região da cidade.
— Esse é o plano diretor mais sem foco que eu vi em minha vida profissional. A ausência de foco pode ser traduzida por ambigüidade e um planejamento ambíguo e complicado. Ele tem de ser claro, límpido, simplificado, passível de ser compreendido por todos que não são especialistas —, afirmou a urbanista Regina Meyer, professora da FAU (Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo).
Segundo Meyer, essa objetividade é fundamental para controlar de que forma o dinheiro público será investido. O urbanista Cândido Malta critica o mesmo aspecto. — Quando tudo é prioritário, não há foco —, disse ele, na mesa-redonda realizada na última quarta-feira no jornal.
— Precisamos que o plano seja uma direção, não um menu —, afirmou Luiz Carlos Costa, professor da FAU, referindo-se à entrevista que o atual secretário do Planejamento, Jorge Wilheim, concedeu à Folha na semana passada.
Na ocasião, questionado sobre quais seriam as primeiras propostas do plano a sair do papel, Wilheim respondeu que os planos são — um cardápio, não o que você vai comer —.
— Dizer que o plano é um cardápio enfatiza a idéia de que podemos fazer todas aquelas escolhas. Mas na vida em sociedade não existe essa possibilidade. Temos de trabalhar dentro de um leque restrito —, afirma Meyer.
Apesar de também apontarem problemas no plano, os pesquisadores Kazuo Nakano, do Instituto Pólis, e João Whitaker, do LabHab (Laboratório de Habitação e Assentamentos Urbanos), identificaram avanços na nova lei.
Dois aspectos da legislação foram destacados, como a implementação das zeis (zonas especiais de interesse social) e a identificação de terrenos vazios no centro -incluindo estacionamentos- que poderão ser desapropriados pela prefeitura se não forem ocupados. — O centro tem um número de imóveis vazios que precisa ser revertido para conter o processo de — periferização —, disse Whitaker.
Nakano ressaltou, porém, que a concentração das zeis é maior nas periferias que no centro, reiterando o modelo que empurra as classes baixas à periferia da cidade.
Para a presidente do movimento Defenda São Paulo, Regina Monteiro, a única vantagem do plano é chamar a atenção para a importância do planejamento urbanístico na cidade.
Contraponto
O vereador Nabil Bonduki (PT), relator do projeto da nova lei de zoneamento e dos 31 planos diretores regionais, contestou ontem a tese de que o Plano Diretor Estratégico não tenha foco. O plano, segundo ele, possui sete prioridades e define como viabilizá-las.
A primeira é repovoar o centro da cidade, mediante a criação de cerca de cem zeis (zonas especiais de interesse social) e a identificação dos terrenos vazios que serão desapropriados caso os donos não implementem um plano de ocupação no local.
Outra meta é requalificar a área periférica da cidade. Segundo Bonduki, cerca de 600 zeis foram criadas nas periferias para regularizar favelas. — Além disso, estimulamos o emprego, ao dar desconto na outorga onerosa para usos não-residenciais, e criamos centros regionais —.
Esses centros locais também ajudarão, de acordo com Bonduki, a diminuir a necessidade de deslocamento viário, já que aproximarão a classe baixa de seu local de emprego. O combate aos congestionamentos inclui a priorização do transporte coletivo, com faixas exclusivas para ônibus.
Para evitar a ocupação nas áreas de proteção ambiental, o plano estimula a habitação em áreas consolidadas, segundo o vereador, e cria a zona especial de proteção ambiental.
A quinta prioridade é aumentar a permeabilidade do solo, mediante a criação dos parques lineares e da definição de pelo menos 15% de área permeável em todas as zonas.
As duas metas restantes são a preservação das áreas exclusivamente residenciais e a proteção do patrimônio cultural e ambiental da cidade. Segundo Bonduki, as áreas destinadas exclusivamente ao uso residencial foram ampliadas nos planos regionais e, entre elas e as zonas mistas, foi criada uma zona de transição. E em relação ao patrimônio, foram criadas as zepecs (zona especial de preservação cultural).
Questionado sobre as metas da prefeitura quanto à redução de viagens de trânsito e ampliação no número de zeis nos próximos anos, Bonduki disse que isso poderá ser abordado na revisão do plano diretor, em 2006.
O secretário do Planejamento, Jorge Wilheim, informou que não responderia às críticas.