Reciclagem de latas conquista classe média
2004-07-19
Algumas colheres de consciência ambiental, uma pitada de vontade de ajudar
os menos favorecidos e expectativa de ganhar dinheiro a gosto. Essa parece
ser a receita que fez os condomínios chegarem ao segundo lugar no ranking de
coleta de latinhas de alumínio para a reciclagem, superando os depósitos de
sucata, que ficaram com a terceira posição.
No pódio, casas e prédios residenciais e comerciais de classe média, média
alta e até de alto padrão estão agora abaixo apenas das cooperativas e
centrais de triagem de lixo operadas por catadores de rua, em geral pessoas
que foram empurradas para esse tipo de atividade pela crise econômica e pelo
desemprego.
O quadro é traçado por pesquisa da Tomra Latasa, empresa responsável por 36%
do reaproveitamento de alumínio no país.
Para chegar a ele, foram confrontados os cadastros dos mais de 12 mil
clientes que venderam latinhas para as 14 filiais da empresa em 22 Estados
no país, em 2000 e 2002. Os percentuais foram, então, extrapolados
estatisticamente para o Brasil, a partir de informações mais gerais de
reciclagem, reunidas pela Abal (Associação Brasileira do Alumínio).
O resultado da comparação mostra que, se em 2000 os condomínios respondiam
pela origem de 10% das latas que eram recicladas, o percentual subiu para
16% dois anos depois --um aumento de 60% na participação no bolo do
reaproveitamento.
Enquanto isso, os sucateiros (que compram o material de terceiros para
depois revendê-lo) reduziram sua contribuição de 19% em 2000 para 13% em
2002 -uma queda de 31,5%. Os catadores, por sua vez, mantiveram a —medalha
de ouro—, aumentando o envio de latinhas para a reciclagem de 43% para 48%
do total. A consolidação da liderança e a perda de espaço dos sucateiros é
atribuída pela Tomra Latasa à maior organização dos catadores.
Consciência e lucro
Ao avaliar as possíveis causas da ascensão dos condomínios no comércio de
latinhas de alumínio, o diretor-presidente da empresa de reciclagem, José
Roberto Giosa, afirma que, por um lado, —a venda do material reciclado é
alternativa de receita para redução das taxas e ampliação de benefícios para
os funcionários— dos prédios.
Isso reflete, em parte, o empobrecimento da classe média brasileira e a
busca por fontes extras de dinheiro ou formas de cortar custos, além de
consolidar o potencial de bom negócio por trás da venda das latinhas,
avalia.
O valor médio pago por 1 kg, ou 75 latas, varia de R$ 2,4 a R$ 3,2.
Giosa defende, no entanto, que, além do pragmatismo econômico, existe uma
crescente consciência ambiental por trás da maior participação de setores
mais ricos da sociedade no mercado da reciclagem. —As pessoas começam a se
sentir incomodadas de jogar algumas coisas fora. É uma revolução silenciosa
que poucos estão percebendo—.
—A verdade é que o que começa muitas vezes por uma vontade de lucrar acaba
virando um hábito e cria a consciência—, sustenta a gerente do Departamento
de Meio Ambiente da administradora de condomínios Hubert, Nathalie
Gretillat. Ela ajudou a implantar a coleta seletiva em 65 dos 300 edifícios
gerenciados pela empresa.
Supermercados
Além da perspectiva de ganhar algo com a venda das latinhas, outro elemento
que ajuda a reforçar a consciência ambiental é a facilidade na hora de
entregar o material para a reciclagem.
À união dos dois fatores Giosa atribui o crescimento da contribuição dos
supermercados na coleta do material -que passou de 7% em 2000 para 10% em
2002.
Muitos deles, a exemplo da rede Extra, do Grupo Pão de Açúcar, trocam
latinhas de alumínio e garrafas plásticas por vales que podem ser usados nas
compras. A R$ 0,03 por lata e R$ 0,02 por garrafa, é preciso trocar 43
latinhas, por exemplo, para comprar 1 kg de arroz. Por outro lado, as lojas
são locais que ficam abertos muitas vezes 24 horas por dia, e dispõem de
acesso fácil e seguro. (Folha de São Paulo)